O “tarifaço” do presidente dos EUA, Donald Trump, foi seguido da reação de representantes de diversos países e autoridades monetárias. O presidente do Fed (Federal Reserve), Jerome Powell, chegou a alertar sobre a possibilidade de uma inflação mais alta e um fraco crescimento econômico.
As chamadas “tarifas recíprocas” foram anunciadas na última quarta-feira (2). Já na sexta-feira (4), Powell participou de uma conferência na Virgínia, nos EUA, onde manifestou suas preocupações. Ele foi enfático ao dizer que o “tarifaço” poderia ser uma combinação perigosa.
Antes das falas de Powell, Trump chegou a comentar que esse seria o momento ideal para o Fed, Banco Central dos EUA, “cortar as taxas de juros”.
Na prática, políticas fiscais e comerciais tão agressivas mudam o cenário bruscamente e forçam a entidade a mudar sua rota.
“A necessidade de responder a pressões inflacionárias ou recessivas geradas por essas decisões políticas acaba restringindo as opções do Fed”, explicou ao BP Money Bruna Allemann, head da mesa internacional da Nomos. Ela afirmou que isso acaba interferindo, indiretamente, nas decisões da autoridade monetária.
Assim, os EUA levam investidores e operadores de mercado a adotarem uma postura mais cautelosa. Isso porque, agora, será preciso esperar os próximos indicadores econômicos para se ter sinais do real impacto das medidas de Trump.
“Alguns dados do primeiro trimestre de 2025, muitos dos quais ainda não foram divulgados, podem ter um caráter meramente estatístico, deixando de ser úteis devido à mudança abrupta de rota proporcionada pelas tarifas”, comentou Leandro Manzoni, analista de economia do Investing.
‘Sorte do Fed’ é que próximo relatório do Fomc sairá somente em junho, diz analista
O analista Manzoni destacou que a relevância dos indicadores antecedentes aos recentes eventos passa a ser ainda maior. De acordo com ele, esses dados vão metrificar os cenários e as expectativas de consumidores e empresários de diferentes segmentos em relação à economia.
“A sorte do Fed é que o próximo relatório de Projeções Econômicas do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) não será na próxima reunião, em 7 de maio, mas apenas no encontro de 18 de junho, quando uma perspectiva mais clara provavelmente esteja no horizonte”, declarou o analista.
A expectativa é que, no próximo relatório, as projeções de crescimento econômico e do índice PCE (Índice de Preços para Despesas com Consumo Pessoal) piorem. Além disso, também há projeções de desaceleração do mercado de trabalho norte-americano, com possível elevação da taxa de desemprego.
“Esse cenário é perigoso. Uma perspectiva de inflação maior, com crescimento em baixa, flertando com a recessão e aumento da taxa de desemprego, pode levar a um cenário de estagflação — o que dificulta o Fed de focalizar a política monetária em um de seus mandatos oficiais: a estabilidade de preços e o mercado de trabalho em pleno emprego”, explicou Manzoni.
Fed precisa escolher remédio ‘menos amargo’ para tarifaço e possível recessão
Com a autoridade monetária sendo relativamente questionada, agora o Fed precisará calibrar a política monetária. A autarquia terá de reagir à inflação sem sufocar ainda mais o crescimento.
“Em um cenário como esse, o banco central pode adotar uma postura mais flexível e tolerar uma inflação temporariamente acima da meta, priorizando a retomada do crescimento”, esclareceu Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos.
Além disso, a inflação repentina ocorre pela forma e rapidez com que as medidas foram tomadas. Para o CEO da Boost Research, André Franco, diante do cenário, o natural é que haja um “salto da inflação e, depois, uma estabilização”. Segundo ele, é uma “taxa artificial” imposta “de uma vez só”.
A grande preocupação é que produtos mais caros podem gerar uma menor demanda, o que, consequentemente, pode levar o país à recessão.
“Os cenários poderiam trazer um corte de juros muito difícil de ser feito, o que naturalmente aumentaria o perigo de recessão. Então, essa é uma situação muito delicada, causada pela política do Donald Trump”, acrescentou Franco.
“O Fed fica com essa possibilidade na mesa, de tentar entender qual é o remédio menos amargo, ou qual o remédio que resolveria a situação. Se é cortar os juros e, eventualmente, até aumentar a inflação, ou se, de fato, é melhor manter os juros em patamar elevado”, concluiu o CEO da Boost Research.