Brasil entrou em processo deflacionário? Analistas explicam

O IPCA registrou deflação em julho e agosto, derrubando a inflação para o patamar de um dígito nos últimos doze meses, de 8,73%

O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) registrou deflação em julho e agosto, derrubando a inflação para o patamar de um dígito nos últimos doze meses, de 8,73%. Mas esses dois meses consecutivos já são suficientes para o País entrar em processo deflacionário? Para Carla Beni, economista e professora de MBAs da FGV, não. 

“É importante salientar que deflação é um processo constante e consecutivo das quedas dos preços por um período muito maior do que um, dois meses. Eu não considero que tenhamos um processo deflacionário no país, até porque temos quedas específicas em grupos específicos que são combustíveis e energias, forçados por uma redução tributária”, analisou Beni em entrevista ao BP Money. 

“A deflação é um processo muito mais complexo, eu vejo o momento atual mais como uma redução do processo inflacionário”, completou a especialista.

Já para o economista Ricardo Macedo, algumas demandas de final de ano podem compensar essa queda por conta dessa atual retomada econômica. 

“A tendência é de que a queda da inflação tende a ser cada vez menor, principalmente que agora estamos chegando ao final do ano, a economia cresceu e pode ser que algumas demandas façam com que essa queda seja compensada por essa retomada econômica além do esperado e também do efeito demorado da elevação da taxa de juros”, afirmou Macedo.

O Copom se reúne nos dias 20 e 21 deste mês para definir a nova taxa Selic, que está em 13,75% ao ano atualmente. Presidente do Banco Central, Campos Neto apresentou uma mensagem mais hawkish neste momento, onde não vê queda de juros neste momento, mas sim em convergir a inflação para a meta.

De acordo com ele, o Brasil terá três meses consecutivos de deflação, mas a batalha não está ganha. Questionados pelo BP Money, os analistas divergem quanto ao próximo passo da autoridade monetária em relação a taxa Selic. 

“Ele deu uma puxada de freio na expectativa do mercado em relação a uma redução na taxa de juros e há uma sinalização de que até poderia subir mais 0,25 p.p. Na minha ótica, a taxa precisa começar a cair, pois a diferença entre a inflação projetada para o final do ano e a Selic está muito elevada, o que afeta seriamente o setor produtivo, o financiamento e o próprio crescimento do país”, afirmou Carla Beni. 

Já para Ricardo Macedo, uma nova subida pode representar uma gordura para o próximo ano. “É possível que ele venha subir a taxa em 0,25 p.p. ou até mesmo 0,5 p.p. para criar uma gordura para que, no próximo ano, consiga observar os efeitos da política monetária feita anteriormente”, disse. 

“Se a tendência é de deflação, os juros reais tendem a aumentar. Com isso, o BC não vai ficar gastando munição aumentando mais e mais a curva de juros. Com essa perspectiva de queda, ele criará um espaço para poder trabalhar melhor e conseguir segurar a inflação por muito tempo”, completou Macedo. 

Queda do IPCA mexe com a eleição presidencial?

Restando menos de um mês para o primeiro turno das eleições, marcado para o próximo dia 2 de outubro, a queda da inflação pelo segundo mês consecutivo pode ser uma arma para o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) na reta final de campanha eleitoral, como avalia o cientista político José Niemeyer. 

“Isso [queda da inflação] tem um efeito eleitoral muito grande por dois motivos. Primeiro, quando se mostra esse combate e que está tentando controlar a inflação, tem um impacto na decisão de todos os eleitores, principalmente nas famílias da classe C, D e E no Nordeste, que fazem parte do eleitorado que será decisivo para compreendermos os resultados das urnas”, analisou Niemeyer. 

“O segundo ponto é com relação as mulheres. Geralmente nas famílias, são elas que determinam a agenda de compras no mercado, principalmente nas cidades menores. Controlando a inflação, isso poderá ter um impacto nesse eleitorado, lembrando que esse eleitorado feminino, atualmente, se mostra contrário ao presidente Bolsonaro”, completou o coordenador Técnico da Pós-Graduação em Negócios Internacionais do Ibmec-RJ.

Projetando o cenário macroeconômico para 2023, quando o Brasil terá um novo Governo – mesmo que seja com Bolsonaro reeleito, Niemeyer salienta que o próximo governante terá que enfrentar um problema na dívida pública e no controle da inflação. 

“Tanto o Auxílio Emergencial, quanto uma medida mais assertiva para controle de preço do combustível e da inflação, causarão um problema na dívida pública. Esse dinheiro vem do Tesouro, ou pelo menos vem da emissão de novas dívidas, então terá um impacto macroeconômico na dívida pública sim, e tudo isso terá que ser administrado pelo novo governo”, ressaltou. 

“Teremos quatro anos de crescimento econômico em função da atividade privada no Brasil, que a gente já percebe que está retomando. E teremos o desafio de manutenção das taxas de inflação em um patamar que as famílias, principalmente as mais humildes, consigam suportar”, completou o cientista político. 

Para Ricardo Macedo, o IPCA em 2023 dependerá muito de qual governo teremos no País. “Não sabemos se terá um tratamento de choque ou algo mais gradual para que a economia consiga rodar e as pessoas tenham dinheiro”, afirmou.