Reforma tributária

Isenção das carnes: especialistas avaliam impactos da decisão

As carnes foram incluídas na cesta básica isentos 100% de impostos; projeto inicial previa redução de 60% da líquota e cashback

Isenção das carnes
Foto: Unsplash

A inclusão das carnes na cesta básica desonerada – ou seja, isenta de impostos – aconteceu no apagar das luzes da regulamentação da Reforma Tributária. O relatório inicial previa a incorporação na ‘cesta básica estendida”, com redução de 60% das alíquotas sobre os alimentos.

Agora, as carnes, junto ao arroz, feijão, farinha de mandioca, farinha de trigo, açucar, macarrão, pão comum e outros itens, por 447 votos contra 3, estão isentas totalmente de IBS (Imposto sob Bens e Serviços) e CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços).

A decisão gerou boas expectativas nos consumidores, que anseiam por pagar menos nas proteínas animais, mas também levou a críticas de setores da política e da economia.

Especialistas ouvidos pelo BP Money avaliaram que, embora possa gerar impactos positivos na inflação, a decisão de isentar 100% as carnes não foi a mais acertada.

Na avaliação de Jefferson Laatus, estrategista-chefe da Laatus, com impostos zero sobre a carne, espera-se que os preços diminuam.

“Isso é relevante pois trata-se de um item de consumo frequente e significa boa parte do orçamento das famílias. Além disso, pode ter impacto indireto em outros setores da economia”, disse Laatus, destacando que o impacto dependerá de como a desoneração será implementada e, principalmente, fiscalizada.

Para o especialista, porém, há outro lado da moeda. A diminuição da arrecadação de impostos pelo governo trata-se de “mais uma renúncia da qual o fiscal precisará resolver”, afirmou Jefferson.

Isenção das carnes versus cashback

Para Jeferson Bittencourt, head de macroeconomia do ASA, enquanto política pública, o cashback – retorno para as famílias com renda mensal de até meio salário por pessoa – é uma “solução superior” à desoneração geral.

“Seja qual for o objetivo da política – incentivar a produção, proteger contra a concorrência de outros países, beneficiar grupos de interesse – não há razão para que o instrumento passe pelo barateamento de produtos para as classes mais ricas. O cashback é capaz de atingir estes objetivos concentrando a aplicação do recurso público na população mais carente”, destacou Bittncourt.

Segundo ele, a isenção gera um um ganho financeiro “imperceptível para as classes mais altas” em produto que as classes mais baixas consomem muito pouco. “Podemos estar encarecendo outros produtos necessários para os mais pobres, como roupas e calçados, através de uma alíquota padrão mais alta”, pontuou.

Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike, chamou atenção para este impacto na alíquota geral, argumento fortemente utilizado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) contra a inclusão das carnes da cesta básica.

Além disso, Eyng também defende a política de cashbacks como a melhor opção para o benefício às pessoas menos favorecidas.

“Embora a aplicação do IVA (Imposto sobre Valor Agregado) sobre as carnes possam tornar esses produtos mais caros, o cashback proporcionaria um alívio financeiro direto, permitindo que famílias de baixa renda continuem comprando proteínas essenciais sem sentirem tanto o impacto no orçamento”, disse Volnei.

Inflação e peso no bolso dos consumidores

Na avaliação de Volnei Eyng, a desoneração das carnes resultará em um impacto de 0,25% a 0,30% na inflação brasileira, considerando o atual peso das proteínas animais no IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo).

O CEO da Multiplike chama atenção, porém, para o fato de que a transição dos tributos atuais para a nova reforma tributária sob o consumo da carne deve iniciar apenas em 2026.

Já para Jeferson Bittencourt, se a isenção fosse repassada totalmente ao consumidor, o impacto seria de 0,30%. Contudo, destacou o especialista, caso repassado, seriam distribuídos ao longo de 2029 a 2032.

“Neste meio tempo, pode haver mudanças de hábitos na população e o peso deste corte de impostos na inflação pode ficar ainda menor. Em suma, o mais provável é que não seja perceptível esta redução de inflação. Além de diluída no tempo, será diluída por um não repasse integral”, disse o head de macroeconomia do ASA.

Em relação ao tempo para que os consumidores sintam a diferença no bolso, os especialistas concordam que não será tão cedo.

“Com certeza o consumidor não vai sentir tão logo a queda nos preços, assim que aplicada a reforma tributária. Precisamos lembrar que as regras da reforma tributária vão ser aplicadas nos próximos anos de forma escalonada, então, os efeitos dessas mudanças serão sentidos ao longo do tempo”, garantiu Eyng.