BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) – Os líderes dos 27 países da União Europeia adotaram na noite desta quinta (21) uma posição sobre comércio exterior que deixa em situação ainda mais delicada o acordo comercial com o Mercosul, congelado pelo bloco europeu desde que as negociações foram concluídas, em meados de 2019.
Em discussão estratégica sobre a área, houve consenso de que o comércio exterior da UE deve “promover os princípios fundamentais e os valores ambientais e sociais”, e não apenas apoiar a prosperidade econômica.
De acordo com oficiais que participaram da reunião, os líderes afirmaram que os governos deveriam “aprender com as negociações passadas sobre as dificuldades de ratificar certos acordos”.
Segundo os chefes de governo, é necessário garantir “transparência no processo de negociação, do mandato até a ratificação, para assegurar apoio público e parlamentar”.
No ano passado, a negociação do acordo levou a uma investigação pela ombudsman da União Europeia, após entidades ambientais afirmarem que as negociações foram encerradas sem que houvesse um estudo de impacto definitivo.
A ombudsman concluiu que houve erro da Comissão no caso e pediu reformulações em negociações futuras.
O aumento do desmatamento no Brasil e políticas do governo Bolsonaro vistas pelos europeus como tentativas de desmontar a proteção ambiental no país elevaram também a oposição ao acordo, tanto de políticos quanto da sociedade civil.
Os ânimos azedaram ainda mais com o avanço no Congresso brasileiro de projetos de lei considerados prejudiciais ao ambiente e a populações indígenas, como os PLs 490 e 191 –que afetam terras indígenas–, os PLs 2.633 e 510, que regularizam ocupações fundiárias, e o PL 3729, que altera licenciamento ambiental.
Citando a possível mudanças na lei, eurodeputados e grandes fundos investidores protestaram a autoridades brasileiras.
Sob reações cada vez mais negativas, os trabalhos na Comissão pararam.
No começo de 2020, a expectativa dos negociadores era que em cerca de três meses os textos estivessem traduzidos em todas as línguas dos países dos blocos e prontos para análise no Conselho, no Parlamento Europeu e nos Legislativos nacionais (e regionais, nos casos em que isso é obrigatório, como a Bélgica).
Dois anos depois do fim das negociações, porém, o acordo ainda está em “revisão legal” –supostamente, estão sendo acertados detalhes que não estavam totalmente definidos em 2019–, uma etapa anterior à tradução.
Nesse meio tempo, governos e parlamentares de países como França, Holanda, Bélgica e Áustria afirmaram que não ratificariam o texto “como está”, exigindo cláusulas que permitissem impor sanções se os países do Mercosul descumprissem os compromissos ambientais.
A Comissão passou a estudar alternativas para resolver o impasse, entre elas dividir o documento em duas partes –uma comercial, que não precisaria ser aprovada por todos os países, e outra política– ou acrescentar ao acordo um texto extra que reforçasse os compromissos das duas partes com questões ambientais e de direitos humanos.
Mas negociações dos dois lados do Atlântico afirmam que nada deve avançar antes da eleição presidencial na França, que acontece no próximo semestre.
A julgar pela posição dos líderes nesta quinta, mesmo depois do pleito francês o caminho será pedregoso. Embora a conclusão não tenha implicação prática, ela mostra um consenso político cada vez mais sintonizado com a preocupação da opinião pública europeia com questões ambientais
Mesmo sem fazer menção ao Mercosul, os líderes afirmaram que pretendem “manter uma lógica de cooperação” com seus principais parceiros, entre os quais mencionaram os Estados Unidos e América Latina.