Livro traça o pensamento econômico de 17 ministros da Fazenda de 1889 a 1985

FOLHAPRESS – De Rui Barbosa a Ernane Galvêas, o livro “Os Homens do Cofre” discorre sobre o pensamento econômico de 17 ministros da Fazenda que comandaram a economia do país da Proclamação da República (1889) até o fim da Ditadura Militar, em 1985.
Os nomes selecionados, entre os quase cem titulares da pasta nesse período, incluem dois presidentes da República, Rodrigues Alves e Getúlio Vargas, além de figuras históricas como José Maria Whitaker, Oswaldo Aranha, Horácio Lafer e Eugênio Gudin.
Como destacam os autores, nenhum desses era economista de formação, embora tivessem vasto conhecimento sobre as teorias do liberalismo clássico e os debates econômicos da época nas economias mais avançadas.
Só a partir de 1964 o ministério passaria a ser comandado predominantemente por economistas, classe que assumiria ascendência sobre a administração do país com status que não haviam ostentado até então, segundo o organizador da obra, o professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná Ivan Colangelo Salomão.
Desse período mais recente, foram selecionados Octávio Gouveia de Bulhões, Antonio Delfim Netto (que assina o prefácio do livro), Mario Henrique Simonsen e Ernane Galvêas.
Segundo o organizador, foram escolhidos os 17 ministros com maior destaque no cenário público brasileiro desse período, independentemente do tempo em que atuaram. Rui Barbosa, Getulio e Moreira Salles, por exemplo, ficaram pouco mais de um ano no cargo.
Também foram considerados nomes a respeito dos quais houvesse documentação disponível. Buscou-se ainda distribuir os nomes de forma uniforme por esse período.
A admiração pelas ideias liberais é ponto comum a quase todos os biografados, assim como é constante a dificuldades em colocá-las em prática diante de interesses políticos e econômicos –e da realidade de uma economia periférica e ainda em processo de industrialização.
Também não são poucos os que, tendo criticado a leniência dos antecessores com a inflação e os déficits públicos crônicos, acabam por ver frustradas suas tentativas de mudar os rumos da economia brasileira.
Uma economia ainda dependente do setor primário e do crédito internacional, com um sistema cambial instável e uma dívida externa sendo constantemente renegociada também compõe o cenário da maior parte desses quase cem anos iniciais da República.
O livro também mapeia o surgimento do pensamento desenvolvimentista. Primeiro ministro da Fazenda da República, Rui Barbosa é apresentado como um intelectual de formação ortodoxa que acaba por adotar políticas econômicas classificadas pelos autores como um ensaio do desenvolvimentismo que surgiria quatro décadas depois, a partir da Era Vargas.
Um exemplo da aplicação desse pensamento é o capítulo dedicado ao mais longevo ministro da Fazenda da história brasileira, Artur de Souza Costa, que ocupou a cadeira por 11 anos e três meses (de julho de 1934 a outubro de 1945).
No prefácio, o ex-ministro Delfim Netto afirma que o Brasil não se saiu tão mal, a despeito de tantas e tão variadas experiências no comando da economia desses anos: no período, o PIB real do país cresceu aproximadamente 5% ao ano, mais do que a média mundial. Situação que, aliás, não voltaria a se repetir nos 35 anos seguintes.
Escrito por diversos autores, alguns capítulos apresentam uma linguagem mais atrativa e uma narrativa mais dinâmica que outros.
Destinado ao público mais especializado em temas econômicos, o livro alcança os objetivos propostos, se dividindo entre o aspecto biográfico e a história do pensamento de cada personagem, usando como referência ampla bibliografia sobre o período.
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Os Homens do Cofre – O que Pensavam os Ministros da Fazenda do Brasil Republicano (1889-1985)
Avaliação Bom
Ivan Colangelo Salomão (Org.), editora Unesp (520 págs.) R$ 67
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OS 17 MINISTROS SELECIONADOS

REPÚBLICA VELHA

Rui Barbosa (nov.1889 a jan.1891)
Primeiro ministro da Fazenda da República

Rodrigues Alves (nov.1891 a ago.1892 e nov.1894 a nov.1896)
Condenou o excesso de emissão monetária que levou ao Encilhamento e planejou uma política de enxugamento de recursos e aumento de receitas

Joaquim Murtinho (nov.1898 a set.1902)
De viés ortodoxo, acreditava que o governo deveria buscar estabilidade de preços e cambial. Promoveu resgate de papel-moeda e instituiu tributação sobre o consumo

João Pandiá Calógeras (mai.1915 a set.1917)
Os problemas da Primeira Guerra impediram o ministro de manter uma política mais ortodoxa e levaram o país ao risco de insolvência

Antônio Carlos de Andrada (set.1917 a nov.1918)
Tentou seguir a política ortodoxa de Calógeras, com cortes orçamentários, mas com necessidade de emissões para financiar a política de valorização do café

Getulio Vargas (nov.1926 a dez.1927)
O período favorável para a economia mundial permitiu reverter medidas recessivas e manter o equilíbrio monetário e fiscal

ERA VARGAS

José Maria Whitaker (nov.1930 a nov.1931 e abr.1955 a out.1955)
Adepto das teorias liberais ortodoxas, viu-se obrigado a adotar políticas pragmáticas e heterodoxas em suas duas curtas passagens pelo cargo

Oswaldo Aranha (nov.1931 a jul.1934 e jun.1953 a ago.1954)
Apesar das ideias liberais, encampou políticas intervencionistas nas duas passagens pelo cargo, em momentos de instabilidade política e econômica

Parceiros

Arthur de Souza Costa (jul.1934 a out.1945)
Mais longevo ministro da Fazenda do país, adotou uma política de intervenção do Estado para promover o desenvolvimento, mas com ação comedida nas áreas fiscal e monetária

PERÍODO DEMOCRÁTICO

Horácio Lafer (fev.1951 a jun.1953)
Tentou manter o controle da inflação e das contas públicas, ao mesmo tempo em que buscava financiar o projeto desenvolvimentista de Vargas. Participou da criação do BNDE.

Eugênio Gudin (ago.1954 a abr.1955)
Promoveu um dos programas mais ortodoxos de ajuste, com cortes de subsídios, aumento de juros e compulsórios e abertura comercial

Lucas Lopes (jun.1958 a jun.1959)

Walther Moreira Salles (set.1961 a set.1962)

DITADURA MILITAR

Octávio Gouveia de Bulhões (abr.1964 a mar.1967)
Responsável por reformas estruturais de viés liberal, como a criação do FGTS, do BC, da correção monetária e de novos impostos sobre consumo (ISS e ICM)

Antonio Delfim Netto (mar.1967 a mar.1974)
Ministro durante o chamado “Milagre Econômico”. Com menos restrições econômicas, praticou políticas voltadas ao crescimento e à inserção internacional do país

Mario Henrique Simonsen (mar.1974 a mar.1979)

Ernane Galvêas (jan.1980 a mar.1985)
Último ministro da ditadura, lidou com recessão mundial, crise do petróleo, escalada de juros, crise no balanço de pagamentos e hiperinflação