BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Ministro das Comunicações, Fábio Faria (PSD-RN), afirmou nesta quarta-feira (11) que não é seu papel interferir nas questões geopolíticas em curso no mundo capazes de impor restrições à atuação da chinesa Huawei na construção de redes 5G no país.
A declaração foi dada em resposta à deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) durante audiência da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados.
A parlamentar, que preside o grupo de trabalho do 5G na Câmara, quis saber se o governo brasileiro aceitará banir a Huawei do 5G caso prospere a oferta de apoio dos EUA ao ingresso do Brasil na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
Como revelou o jornal Folha de S.Paulo, o Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan, ofereceu ao governo Jair Bolsonaro apoio para que o Brasil se torne um sócio global da Otan. Em troca, o Brasil teria de vetar a participação da Huawei no futuro mercado de 5G nacional.
A política oficial de Washington é que a presença de fornecedores considerados não confiáveis -como a Huawei e outras empresas chinesas- em redes de comunicação de quinta geração impedem o aprofundamento na cooperação de defesa e segurança. Por isso, o acesso do Brasil ao programa da Otan só seria possível sem a participação dos chineses no 5G brasileiro.
“Se os governos quiserem fazer essa guerra, vai ser bom para as teles. Se os EUA oferecerem funding [linhas de crédito] paras as teles comprarem os equipamentos [dos EUA ou de fabricantes europeus], vai ter queda de preço. A gente não pode se meter para uma tele oferecer um benefício para A, B ou C. Agora, esse jogo vai ser jogado. Essa guerra [geopolítica] está acontecendo no mundo inteiro.”
Segundo o ministro, sua equipe está monitorando a fabricação de chips para celulares e antenas. Faria mencionou ainda uma crise de fornecimento na maior fabricante de insumos em Taiwan, que vive um embate político com a China.
O resultado seria uma restrição de fornecimento de chips para a chinesa Huawei, algo que preocupa pela possibilidade de falhas de abastecimento no Brasil, comprometendo a expansão das redes 5G.
“No sul da China tem uma guerra. Os EUA se uniram com os europeus. A SMIC [empresa de Taiwan] detém 70% do mercado e não está fornecendo mais para a Huawei”, disse Faria. “Quem vai conversar com as operadoras para mostrar se haverá supply chain [cadeia de fornecimento] não é o Ministério das Comunicações e o presidente Jair Bolsonaro. Estamos acompanhando o que está acontecendo, mas o cenário está definido há um ano, quando o edital [do 5G] estava pronto.”
O edital do 5G não trata de equipamentos que deverão ser usados na construção das novas redes. Ele só trata das regras para a compra das frequências -avenidas no ar por onde as operadoras fazem trafegar seus dados.
Pelo edital, cada frequência traz metas de investimentos obrigatórios na massificação da infraestrutura e do acesso à internet em troca de que esses valores sejam abatidos do preço das frequências.
Durante o debate em torno do edital, houve forte pressão do governo dos EUA para que o próprio edital trouxesse algum tipo de restrição aos fabricantes da China.
Isso porque o país vive uma disputa geopolítica com os EUA que se arrasta desde o governo do ex-presidente Donald Trump até hoje, com o presidente Joe Biden.
As teles reagiram à pressão porque hoje quase 85% das redes em funcionamento são equipadas pela Huawei. No 5G, há o risco de que esse parque instalado precise ser totalmente trocado caso haja o banimento. Isso porque, hoje, os equipamentos da Huawei não conversam com os aparelhos 5G de outros fabricantes.
Para evitar essa situação, Faria teve a ideia de criar uma rede privativa para a administração pública federal como forma de arrefecer a resistência dos militares do Palácio do Planalto contra a China tendo a Huawei como alvo.
No entanto, o TCU apontou irregularidades no edital. A construção desse rede, por exemplo, seria ilegal porque essa rede não atenderia o interesse coletivo, algo que contraria os princípios da LGT (Lei Geral das Telecomunicações) segundo os auditores.
O ministro não quis comentar os questionamentos feitos pela área técnica do TCU e se restringiu a afirmar aos parlamentares que “tem plena confiança na aprovação do edital na reunião do plenário na próxima quarta-feira (18)”.
Durante a audiência, Faria causou controvérsia ao explicar os motivos que levaram o Ministério das Comunicações e a Anatel a retirar a cobertura das escolas urbanas e rurais das obrigações de investimentos atrelados ao edital.
A presidente da Comissão de Educação, deputada Dorinha Rezende (DEM-TO), questionou o ministro sobre a ausência de uma obrigação explícita para que as teles levassem a conexão às escolas.
O ministro disse que as escolas estão cobertas pelo edital porque o “5G vai passar por todos os lugares”. O ministro disse que as obrigações preveem a passagem de fibras ópticas por todos os locais com mais de 600 habitantes, seguindo um cronograma que avançará de acordo com a população de cada localidade.
“Quando chega na cidade [a infraestrutura], não tem como excluir nada. Qualquer escola, restaurante, qualquer casa, praça, bar, tudo aqui está dentro da obrigação do 5G.”
As obrigações de cobertura, no entanto, não se referem a metas de conectividade (número de domicílios ou estabelecimentos com fibra óptica passando na porta). Elas se referem à instalação da fibra em cada localidade. O acesso depende da venda de pacotes pelas operadoras.
A deputada Dorinha reagiu e disse que não há como cobrar compromisso se ele não está explícito.
“Compromisso precisa estar explícito, senão não é compromisso”, disse Dorinha. “Obrigação pra ser cobrada precisa estar registrada.”
Nos leilões anteriores (3G e 4G), as teles foram obrigadas a conectar as escolas. Essas metas foram estabelecidas nos editais.
Faria disse ainda que as escolas estão contempladas no leilão 5G e que o próprio ministério está conduzindo um programa para levar a conectividade às escolas que, por ventura, não forem assistidas pelas operadoras.