Depois de décadas de espera, a reforma tributária pode finalmente começar a sair do papel e ser apreciada nesta quinta-feira (6), conforme projetou o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).Tratado como assunto de urgência, Lira organizou um esforço concentrado com os colegas de Casa para que o projeto seja votado ainda nesta semana.
Apesar da iminente importância, a proposta ainda gera muita polêmica e dúvidas na população brasileira. Para tentar descomplicar um assunto tão complexo, o BP Money ouviu especialistas no assunto que elencaram os temas centrais da reforma.
O principal ponto elencado pelos entrevistados é que a proposta busca simplificar a forma de arrecadação e tornar o sistema mais prático, como explica o advogado tributarista do escritório Zilveti Advogados, Lucas Roberto Trilha.
“A mais importante mudança proposta pela reforma tributária é a extinção de uma série de impostos como o ICMS, IPI e ISS, substituindo-os por dois novos tributos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo (IS). Além disso, discute-se a possibilidade de devolução de parte da carga tributária incidente sobre o consumo. Este benefício fiscal, de acordo com as ideias até então expostas, atingiria as pessoas com menor capacidade econômica”.
“Trata-se de mudança de grande importância para a economia brasileira de uma forma geral, na medida em que simplificará a burocracia envolvendo a tributação sobre o consumo, diminuindo os custos vinculados ao atendimento da complexa legislação tributária que atualmente disciplina esse tema”, acrescenta o tributarista de Almeida Prado & Hoffmann advogados, Carlos Marcelo Gouveia.
Os impactos positivos previstos na reforma também podem influenciar o desempenho da bolsa de valores brasileira. Na opinião do advogado tributarista e sócio no escritório Daniel & Diniz Advocacia Tributária, Diego Diniz, com a simplificação do sistema tributário, vai tornar o ambiente de negócio brasileiro mais simples e previsível e mais atrativo para investimentos.
“A unificação da tributação de bens e serviços tende a simplificar essa incidência tributária e, com isso, diminuir o custo de conformidade fiscal. Haveria, portanto, maior previsibilidade e segurança fiscal. Caso efetivamente não haja aumento de carga tributária, a reforma seria benéfica para os diferentes setores da economia, inclusive o financeiro”, projeto.
Pontos de atenção
Apesar da importância da matéria, ainda não há entendimento para a aprovação da pauta. Prefeitos e governadores temem que as mudanças resultem em perdas de arrecadação para estados e municípios e pedem alterações no texto que está sendo analisado na Câmara.
Devido a pressão, o relator do projeto na Casa, o deputado federal Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que já estava no processo de finalização do texto, teve que recuar e admitiu rever alguns pontos.
“Agora vamos buscar no consenso do parlamento a melhor proposta, a mais justa com o olhar do desenvolvimento regional”, afirmou o deputado.
Para Diego Diniz, é necessário observar de perto as discussões para que o projeto não seja desvirtuado do seu propósito. “É importante acompanhar muito proximamente os debates no Congresso Nacional, pois eventuais pressões de segmentos econômicos e entes públicos, em especial os grandes municípios, podem desnaturar os objetivos pretendidos. Sempre se sabe como uma reforma legislativa começa, mas nunca se sabe como ela termina, pois isso sempre depende de como vai caminhar o debate legislativo e as propostas de emendas”, pontuou.
Nova tentativa
As tentativas de aprovar a reforma tributária brasileira não são de agora. Pelo menos, desde o final da década de 80, Parlamento e governos apresentaram propostas, que não conseguiram êxito.
Em entrevista ao “Valor Econômico”, a diretora de cursos da York University e coordenadora executiva do projeto IVA do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getulio Vargas (NEF/FGV), Melina Rocha, autora do livro “Reforma Tributária no Brasil – Ideias, Interesses e Instituições”, diz que o Brasil passou por três grandes tentativas de mudar o sistema tributário desde a Assembleia Nacional Constituinte de 1988.
Ela lembra que há historicamente no Brasil um conflito de interesses entre União, Estados e municípios para manter ou aumentar o poder de tributar e as receitas com recolhimento de impostos.
Porém, agora, existem chances reais de que a reforma seja feita. “Pela primeira vez na história foi atingido no ano passado consenso entre os Estados para a tributação do imposto no destino [das mercadorias e serviços], inclusive por Estados mais desenvolvidos, como São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro”, destacou.