RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A seca sobre a bacia do rio Paraná já afeta as operações em uma das principais hidrovias do país, que tem papel importante no escoamento de grãos do Centro-Oeste até o porto de Santos. Operadores logísticos temem que o tráfego seja interrompido ainda neste mês.
Com águas mais baixas, as barcaças que trafegam na hidrovia Tietê-Paraná já não conseguem operar com plena capacidade, sob o risco de não conseguir passar pelo pedral de Nova Avanhandava, no rio Tietê, hoje o principal gargalo da rota.
O Departamento Hidroviário do Estado de São Paulo vem reduzindo gradativamente o calado máximo das embarcações, o que afetou também o número de comboios em operação. Entre janeiro e maio, foram 24. Atualmente, apenas dez estão trafegando na hidrovia.
“O problema afeta diretamente o transporte da produção agrícola do Brasil”, disse, em nota, o departamento. Segundo estatísticas do governo paulista, em 2020 passaram pela hidrovia 6,16 toneladas de carga.
“A hidrovia não está inoperante. As empresas operam abaixo do limite da carga nas barcaças”, diz a Prefeitura de Pederneiras (SP), a 320 quilômetros da capital, cidade que sedia um terminal de transbordo de grãos entre barcaças e a ferrovia da MRS, que vai ao porto de Santos.
A prefeitura afirma, porém, que os operadores instalados no município já falam em paralisação no próximo dia 20, caso o cenário hidrológico não apresente sinais de melhora.
A Louis Dreyfus, que é uma delas, disse que “considera fundamental que os órgãos responsáveis encontrem soluções que possam garantir as condições de operação ininterrupta e uso compartilhado da água, inclusive a navegação, mesmo em períodos de volumes de água mais baixos”.
O governo federal já trabalha com a possibilidade de interrupção do fluxo. Para gerenciar as vazões no rio Paraná, a Creg (Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética) autorizou a redução da cota mínima do reservatório de Ilha Solteira, que é parte da hidrovia, para 324,80 metros.
O patamar está abaixo dos 325,40 metros considerados como cota mínima para operação da rota, que liga produtores de Goiás e do oeste de Minas Gerais a São Paulo pelos rios Paranaíba, Paraná e Tietê. Em setembro, a cota será reduzida a 323 metros.
A região, que passa pela pior seca desde que os registros começaram a ser feitos, é também de fundamental importância para o setor elétrico, já que os reservatórios de suas hidrelétricas concentram dois terços da capacidade de armazenamento de energia do subsistema elétrico Sudeste/Centro-Oeste.
Na segunda-feira (9), de acordo com o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), o nível médio dos reservatórios desse subsistema chegou a 28,87%, e a expectativa é que o valor fique abaixo dos 10% no fim do ano.
A hidrovia foi totalmente paralisada na última grande crise hídrica do país, entre 2014 e 2015, com prejuízo estimado pelo Departamento Hidroviário em pelo menos R$ 700 milhões, considerando aumento no custo do frete, demissões, suspensão de investimentos e custos portuários.
“É por isso que a Secretaria de Logística e Transportes entende que é importantíssimo mudar a matriz energética do país para diminuir a dependência das hidrelétricas”, disse, em nota, o órgão estadual.
“A secretaria acredita que tem faltado uma ação mais firme de planejamento para atenuar o problema, que é recorrente e vem se agravando em períodos mais recentes.”
A crítica encontra eco entre especialistas do setor elétrico, que classificam como negacionista a hesitação do governo em adotar medidas de redução do consumo de energia. Um programa de economia voluntária por indústrias foi anunciado só no início de agosto, mas ainda não está operacional.
Para residências e comércio de pequeno porte, o incentivo à economia ainda está sendo estudado pelos órgãos do setor elétrico.
Considerado o principal gargalo da hidrovia atualmente, o pedral de Nova Avanhandava começou a ser implodido no início do ano, mas a obra ainda não foi concluída. Quando chegar ao fim, o investimento vai permitir a operação das barcaças em cotas menores do que a atual.
Em janeiro, o governo de São Paulo lançou um plano diretor para a hidrovia, com propostas de investimentos para permitir o tráfego de comboios de até 9.000 toneladas pela hidrovia, que hoje comporta apenas 6.000 toneladas. Comboios maiores, afirma, poderiam reduzir o custo de transporte em até 20% por tonelada.