De olho nos juros

Serviços pressionam IPCA e adiam alívio na taxa Selic, dizem analistas

Inflação controlada na superfície, mas núcleos preocupam

Foto: Canva
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O IPCA de abril subiu 0,43% e, embora tenha vindo dentro do esperado, os núcleos de inflação continuam elevados — sobretudo os serviços subjacentes, que avançaram 0,60% no mês.

“O resultado reforça a mensagem do Banco Central de que os juros devem permanecer elevados por mais tempo”, avaliou Natalie Victal, economista-chefe da SulAmérica Investimentos.

Apesar da desaceleração em relação a março (0,56%) e da leitura vir em linha com as estimativas — entre 0,41% e 0,43% — os especialistas enxergam no dado qualitativo motivos para preocupação.

O foco recai sobre os chamados serviços subjacentes, considerados mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária.

Camilo Cavalcanti, gestor da Oby Capital, aponta que a alta de 0,60% nesse núcleo “veio acima do esperado” e reflete principalmente o impacto de alimentação fora do domicílio.

Já Maykon Douglas destaca que esse componente segue “rodando acima de 7,6% na média anualizada de três meses”, muito acima da meta de inflação, indicando persistência inflacionária.

Combustíveis e passagens aliviaram o índice cheio

A leitura cheia do IPCA só não foi maior porque o grupo Transportes (-0,38%) puxou o índice para baixo. Maykon explica que a forte queda nas passagens aéreas (-14,15%) e nos combustíveis (-0,45%) contribuiu decisivamente para a desaceleração em abril.

José Alfaix, da Rio Bravo, também lembra que “a gasolina mostrou retração de -0,35% no mês”, o que ajudou a conter a inflação de serviços no agregado.

Por outro lado, alimentos e saúde tiveram forte contribuição altista. O grupo Alimentação e bebidas subiu 0,82%, com destaque para a carne bovina e o café moído.

Já os medicamentos, com reajuste autorizado de até 5,09% a partir de 31 de março, impulsionaram o grupo Saúde e cuidados pessoais (1,18%).

Mercado de trabalho aquecido e câmbio ainda desafiam o BC

A resiliência da inflação subjacente, segundo os analistas, está ligada a um mercado de trabalho ainda robusto e aos efeitos defasados da depreciação cambial. “Mesmo com algum alívio vindo do câmbio, a atividade aquecida limita a reversão da inflação no curto prazo”, analisa Maykon.

Para José Alfaix, os salários reais seguem em alta, o que “mantém pressão sobre os preços de serviços mais ligados ao consumo doméstico”. A média dos cinco principais núcleos de inflação ficou em 0,5% pelo terceiro mês consecutivo, reforçando a ideia de que a desinflação será lenta.

Cenário reforça juro alto por mais tempo

Com os núcleos ainda pressionados, a expectativa de cortes na Selic em junho perde força. Natalie Victal vê no IPCA de abril um argumento claro para o Copom manter a taxa elevada. Camilo Cavalcanti reforça a leitura: “o dado não muda o cenário, mas confirma que a inflação continua pressionada pela força da atividade”.

No mesmo tom, Felipe Vasconcellos, da Equus Capital, destaca que “o IPCA acima do centro da meta reforça a necessidade de cautela”, o que favorece estratégias conservadoras. Ele recomenda “exposição balanceada entre ativos indexados à inflação e setores resilientes da Bolsa”, como exportadoras e utilities.