RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A volta ao trabalho em empresas e órgãos pública começa com indefinição na exigência de vacinação. No momento em que o Brasil ainda registra uma média de 833 mortes diárias por Covid-19, a variante delta avança pelo mundo e cresce o debate sobre a adoção de uma terceira dose para reforçar a imunização, boa parte das estatais federais e alguns órgãos públicos já programam o retorno ao trabalho presencial sem exigir que o funcionário esteja vacinado.
Ainda são poucos os casos com o da prefeitura do Rio de Janeiro, que decidiu cobrar a vacinação de forma enérgica. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, por exemplo, institui, nesta quarta-feira (18), a obrigatoriedade da vacina para todos os servidores e empregados públicos municipais, assim como para os prestadores de serviços contratados pelos órgãos e entidades da administração municipal.
Segundo decreto, “a recusa, sem justa causa, em submeter-se à vacinação contra a Covid-19 caracteriza falta disciplinar, passível das sanções”. As punições previstas vão desde advertência e suspensão até demissão.
Para decretar a obrigatoriedade de vacinação no Rio, a prefeitura se baseou na lei Federal no 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, estabelecendo que para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, a determinação de realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas.
Porém, não é este o cenário para muitas instituições públicas.
Hoje com cerca de 28 mil empregados em regime de home office, a Petrobras planeja que funcionários voltem a trabalhar presencialmente a partir de 1º de outubro. Nos prédios administrativos, o retorno será em ondas, sendo a primeira limitada a 20% da ocupação predial.
Secretaria de Administração e Finanças da FUP (Federação Única dos Petroleiros), Cibele Vieira afirma que os trabalhadores desconhecem, até agora, os critérios para a definição de quem retornará nessa primeira onda.
A FUP tem defendido a obrigatoriedade da vacina como condição para o retorno. Mas, até agora, a proposta não foi acolhida pela diretoria da Petrobras.
“A gente está colocando como pauta que seja obrigatório ter as duas doses de vacina para que não haja uma onda de contágio desnecessária na empresa. A Petrobras não está negociando os termos de retorno com o movimento sindical”, diz a diretora da FUP.
Outra reivindicação dos funcionários é a opção de teletrabalho para categorias que possam cumprir suas funções remotamente. Mas a Petrobras determinou que pelo menos dois dias da semana sejam exercidos presencialmente. Os trabalhadores sugeriram que, ao menos, a escala seja mensal, para que os funcionários trabalhem por dez dias consecutivos, por exemplo. Mas ainda não obtiveram resposta.
Ao jornal Folha de S.Paulo, a Petrobras informou que essas ondas de retorno serão sempre precedidas de avaliação de cenário, observando o avanço do Plano Nacional de Imunização.
“Para a primeira onda, essa reavaliação será feita até o final de agosto, quando serão divulgados aos empregados os critérios de priorização para a volta à atuação presencial. O retorno será híbrido, alternando dias presenciais e remotos. A adesão ao trabalho híbrido é voluntária para aqueles empregados cujas atividades podem ser realizadas remotamente, com limite de 3 dias remotos por semana”, diz a Petrobras, por intermédio de sua assessoria.
O processo é mais flexível ainda no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Na quinta-feira (5), o presidente da instituição, Gustavo Montezano, apresentou aos funcionários o plano de retorno ao trabalho presencial, programado para 1º de setembro. Em resposta aos questionamentos dos trabalhadores, a diretoria informou que, “para acessar as dependências do BNDES, não será exigido comprovante de vacinação”. Também está descartada a adoção de trabalho híbrido, ou remoto.
Não haverá escala de trabalhadores para acesso ao prédio. Segundo a diretoria, o calendário de vacinação ditará o ritmo de retorno ao trabalho presencial.
O banco também respondeu que não fará controle individualizado da vacinação, cabendo à consciência de cada um de seus 2.500 funcionários. Em uma enquete promovida pela AFBNDES, associação de funcionários do banco, 7,49% (121) dos entrevistados disseram discordar da obrigatoriedade de apresentação de comprovante de imunização como condição para o retorno ao trabalho. Outros 7,74% dos participantes da enquete (125) afirmaram concordar parcialmente com a proposta.
Presidente da associação, o economista Arthur Koblitz defende sanções, como suspensão temporária, para os empregados que não se vacinarem. O debate travado com a diretoria do banco foi relatado aos trabalhadores no jornal da AFBNDES.
“Sobre a vacinação, disseram que todos são favoráveis à obrigatoriedade da imunização, mas que isso deve ficar por conta da consciência cidadã dos empregados. Insistimos que não abriremos mão dessa exigência: não vacinados não podem ingressar no Edserj [Edifício de Serviços do Rio de Janeiro]. Reforçamos a sugestão presente no comunicado da AFBNDES de que nos reuníssemos para estipular quais seriam as consequências sobre os que se recusarem a vacinar”, diz o texto publicado no jornal da associação.
Em nota, o BNDES informou que os empregados com comorbidades, lactantes e mais de 60 anos retornarão somente em novembro. “Empregados imunossuprimidos e que coabitam com pessoas imunossuprimidas ou gestantes poderão, a seu critério, permanecer em trabalho remoto. As gestantes deverão permanecer em trabalho remoto”, afirma.
Ainda na nota, o BNDES apoia a vacinação e intensificará a campanha para todos os seus empregados. “Em relação ao trabalho remoto, está em estudo a potencial adoção do trabalho híbrido no futuro”, acrescenta.
À reportagem, o banco não respondeu se exigirá comprovante de vacinação para retorno ao trabalho.
Com 7.960 funcionários, o Serpro fixou um cronograma para retorno ao trabalho presencial, por ordem decrescente de idade, entre 2 de agosto e 6 de setembro. Não haverá testagem massiva dos trabalhadores convocados ao retorno.
Em texto que detalha o protocolo para a volta, encaminhado aos trabalhadores, a empresa usou o termo imunizável e não imunizado para definir quem deve retornar. E traduziu: “Empregados imunizáveis são todos aqueles já contempladas pelos calendários locais de vacinação (por idade, comorbidade ou pertencimento a categorias profissionais especificas)”.
Procurado pela reportagem, Serpro não respondeu se vai exigir que o trabalhador tenha tomado as duas doses da vacina para retornar às atividades presenciais.
A diretoria do Serpro descarta a hipótese de trabalho domiciliar para os imunizáveis, à exceção dos que prestam serviços a empresas que ainda não tenham retomado o trabalho presencial. No protocolo encaminhado aos funcionários, o Serpro ressaltou que “a adoção do trabalho domiciliar foi uma decisão transitória, em que fomos pioneiros entre as instituições publicas, em prol do enfrentamento a pandemia”.
O Serpro fez uma enquete entre seus empregados para saber o estágio de vacinação de cada um. No formulário, havia opção para os que não pretendiam tomar vacina. Questionado se concederia para retorno aos trabalhadores que tomaram a segunda dose da vacina, a diretoria informou:
“Para as chefias e empregados que tiverem apontado neste formulário a data prevista para segunda dosagem as convocações levarão em conta a data da segunda dose, para retorno efetivo 15 dias depois. Para os demais, que nao tiverem sinalizado a empresa quando tomarão a dose 2, não há previsão de concessão deste prazo, deverão retornar na data indicada neste cronograma”.
A diretoria também informou aos empregados que “o fato de ter comorbidades (ser do grupo de risco), morar com pessoas do grupo de risco ou ter filhos pequenos não mais esta sendo considerado como impeditivo para o próximo retorno”. “O critério preponderante de agora e de ser passível de imunização, de modo que se você já esta contemplada pelo calendário de vacinação da sua cidade ou já se vacinou, devera retornar em uma das datas previstas”.
Diretora jurídica da Fenadados (Federação Nacional dos Trabalhadores em Processamento de Dados), a advogado Débora Sirotheau lembra que, por envolver informações pessoais, a privacidade do trabalhador tem de ser protegida.
A Fenadados representa os trabalhadores da Dataprev e BBTS, antiga Cobra. E Débora lembra que, entre as empresas da categoria, o Serpro foi o único a revogar o teletrabalho. Para ela, a empresa se precipitou.
Ainda em regime de home office, a Dataprev informa que, em decorrência da pandemia, ampliou sua atuação ao assumir desafios importantes como os processamentos do Auxílio Emergencial e Programa Emergencial de Preservação do Emprego e Renda, o que exigiu um esforço ainda maior do seu quadro funcional mesmo em trabalho remoto.
“Desse modo, ao garantir também a entrega de importantes serviços à população, a empresa registrou um salto expressivo de produtividade, com o lucro por empregado saindo de aproximadamente R$ 43 mil para R$ 91 mil, um aumento de 113% comparando os anos de 2019 e 2020”.
Correios deixam claro que o retorno ao regime presencial dos empregados que se encontram, excepcionalmente, em trabalho remoto tem acontecido gradativamente, condicionado ao recebimento da imunização, sem exigência de comprovante de vacinação.
Já a Infraero informa que os aeroportos administrados pela empresa permaneceram funcionando durante toda a pandemia, com os empregados de áreas como operações, segurança e manutenção realizando as atividades presenciais de forma a não haver impacto para a aviação.
Em nota, afirma que, “quando o Ministério da Saúde anunciou a antecipação da vacinação contra a Covid-19 para trabalhadores portuários e do transporte aéreo, a Infraero realizou alinhamentos com as secretarias de Saúde de estados e municípios para viabilizar a aplicação das vacinas dentro de seus aeroportos ou em locais próximos, com o objetivo de facilitar o acesso à imunização para seus empregados e demais funcionários do setor aéreo”.
Atualmente, cerca de 20% dos empregados da Infraero, que desempenham funções administrativas, estão em hoje office e não há previsão de retorno desse efetivo para atividades presenciais. A empresa também não respondeu se vai exigir comprovante de vacinação.
Os tribunais de Justiça de São Paulo e Rio de Janeiro não exigem apresentação de comprovante de vacinação para o retorno a atividade presencial nos fóruns. O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira, determinou a volta ao trabalho presencial a partir de 2 de agosto.
Segundo ato executivo, “retornarão ao trabalho presencial todos os servidores, terceirizados e estagiários que já tenham sido vacinados com a segunda dose da vacina contra a Covid-19, ou dose única. O retorno deverá se dar quinze dias após a aplicação da segunda dose, ou da dose única”.
Também voltam ao trabalho presencial aqueles que, embora não vacinados, estão na faixa etária ou no grupo de prioridade já imunizados.
“Retornarão ao trabalho presencial também aqueles ainda não vacinados que tenham sido inseridos em faixa etária ou grupo de prioridade que já foram objeto da vacinação com a segunda dose ou dose única”, diz a determinação.