SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Donos de minimercados de regiões periféricas de São Paulo têm recorrido a um aplicativo para fazer compras direto com fornecedores ?sem precisar sair do comércio ou negociar preços. Desenvolvido pela startup Mercê do Bairro, a ferramenta já é usada por quase mil mercadinhos parceiros espalhados nas zonas sul, leste e oeste da capital paulista.
Além da plataforma de compras, a empresa oferece pagamento facilitado, consultoria de gestão e auxílio no acesso ao crédito. O foco são os estabelecimentos com até quatro caixas, que representam 35% do mercado de varejo alimentar no Brasil, segundo levantamento da Associação Brasileira de Supermercados.
“Me tirou do sufoco”, diz Danilo da Silva Souza, 38, sobre o impacto da Mercê do Bairro no seu negócio. Ele e sua esposa, Valéria Campos, 38, são proprietários desde 2018 de um pequeno mercado em Interlagos, zona sul de São Paulo, e usam o aplicativo de varejo integrado há quase um ano.
Criada pelos fundadores do Zé Delivery e do iFood, a Mercê do Bairro é, à primeira vista, uma versão para mercadinhos de bairro das empreitadas anteriores de seus sócios: um aplicativo que conecta pequenos mercados a grandes distribuidores, agilizando as entregas.
“A gente percebeu que a melhor forma de iniciar o trabalho era criando um marketplace”, diz Diego Libanio, 34, diretor-executivo da Mercê do Bairro e um dos criadores do Zé Delivery. “A gente começou pelo abastecimento, com soluções que ajudam o mercado a comprar, gerir e vender melhor.”
As compras feitas pelo aplicativo podem ser agendadas, chegam em um dia útil, e a Mercê oferece prazos de pagamentos que vão de 7 a 28 dias. “Esses mercados pequenos não conseguem estocar, não têm nem espaço físico nem capital de giro para isso”, afirma Guilherme Bonifácio, 28, diretor de operações da Mercê do Bairro e um dos cofundadores do iFood.
“É importante lembrar que esse pequeno varejista é mal atendido hoje”, afirma Libanio. Por serem pequenos e fragmentados, os mercadinhos de bairro muitas vezes têm dificuldade em negociar com atacados, industrias e distribuidores ?que, por sua vez, não dão conta de chegar no pequeno varejista. “Se você centraliza tudo numa plataforma, e consegue dar um bom atendimento, todo mundo ganha.”
O faturamento da startup vem de comissões cobradas dos fornecedores em cima das vendas realizadas, que vão de 4% a 10%. De acordo com Libanio, os distribuidores pagam menos para a Mercê do que gastariam para chegar a esse grupo pelos canais tradicionais. “A gente quer ter uma relação ganha-ganha com os parceiros, é importante que ele também se beneficie por fazer parte da rede.”
Além de integrar toda a cadeia no marketplace, a Mercê realiza um trabalho de consultoria gratuita para os pequenos mercados, com recomendações que vão desde a reforma da fachada e a organização da loja até a gestão de negócio e acesso ao crédito.
“Quando você está trabalhando na loja é muita correria, e as coisas passam despercebidas. Eu achava que tinha experiência no ramo, mas quando o pessoal da Mercê chegou aqui e começou a me dar dicas, falei ?Tem um monte de coisa que eu não sei?”, diz Danilo.
Identificado como uma loja com potencial de crescimento, o negócio de Danilo e Valéria recebeu uma proposta para se transformar em um estabelecimento parceiro, incorporando a marca da startup. Uma equipe da empresa foi ao local e ajudou a ordenar e precificar os produtos. A loja foi reformada graças ao acesso ao crédito por meio da startup e ganhou um novo nome: de Hortifruti Manancial, foi rebatizado como Mercê dos Campos, fazendo referência ao nome da família de Valéria.
“Essa conversão me tirou da falência. O movimento estava muito ruim, e você vê o impacto que a mudança teve nos clientes. Até os preços ficaram melhores”, diz Danilo.
O empresário avalia que o impacto vai além dos negócios: no início de novembro, ele aproveitou o feriado e foi ao Mato Grosso visitar a mãe. “Você já tem a compra programada, vem no automático. Fui viajar e a loja rodou certinho, sem problemas.”
Com dois anos e meio de operação, a Mercê do Bairro tem mais de cem funcionários. “Nossa visão de longo prazo é criar uma revolução no mercado de proximidade”, diz Bonifácio.
“Assim como o Uber é a maior rede de transporte sem ter o carro, a gente quer fazer a maior rede de mercados sem ter o mercado”, afirma Libanio.
Sobre os próximos passos, os dois já têm tudo planejado. “Nossa estratégia é ser relevante nos pontos em que entramos. A curva que pretendemos fazer é muito clara: pegar a cidade de São Paulo inteira, depois as cidades ao redor e então partir para Rio de Janeiro e Belo Horizonte”, conta Libanio.