BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O discurso golpista do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que chegou ao seu ápice nas comemorações do Dia da Independência, em 7 de setembro, tem levado iniciativas do governo na área de infraestrutura a ficarem sob ameaça.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), mandou recados ao ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, de que deixará expirar a validade da MP dos Trilhos, medida provisória que estabelece um novo marco legal para as concessões ferroviárias no país.
Em reação a essa postura de Bolsonaro, outras iniciativas importantes para o governo também podem ficar comprometidas nos mais diversos segmentos da infraestrutura logística do país.
Dentre elas estão a relicitação do aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), e a renovação antecipada de malhas ferroviárias -ambas podem sofrer contestações na Justiça.
Em Minas e no Pará essa discussão também ganha corpo e encontra espaço para avançar entre deputados e senadores desses estados.
Embora o edital de concessão da NovaDutra, rodovia que liga São Paulo ao Rio de Janeiro, já tenha sido publicado, parlamentares ainda consideram que uma forma de embolar o certame seria questionar na Justiça o próprio modelo da concessão, que prevê lances no leilão de acordo com faixas de redução do valor do pedágio.
No entanto, essa nova modelagem, que é diferente da adotada tradicionalmente, já foi chancelada pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e também passou pelo crivo do TCU (Tribunal de Contas da União).
A construção da Ferrogrão, uma das obras mais intensivas em termos de investimentos, é foco de um embate entre a empresa de logística Rumo e o governo. Nos bastidores, a companhia reclama que seu projeto ferroviário, que também viabiliza saída pelos portos de norte, como a Ferrogrão, vem sendo atrasado para viabilizar a ferrovia defendida por Tarcísio.
Recentemente, o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM) fez chamada pública para a construção de uma ferrovia estadual ligando a área da capital a municípios ao norte. A proposta concorre com a Ferrogrão e dá vantagem à Rumo, responsável pela operação da malha que já liga o Porto de Santos a Rondonópolis.
Segundo relatos, no caso da MP dos trilhos, além da “indigestão política” no Senado causada pelo 7 de setembro, pesou a postura do governo que preferiu não esperar a tramitação de um projeto de lei que modifica as regras das concessões no setor ferroviário.
Embora seja bem avaliado pelos parlamentares mais influentes no Congresso, o ministro Tarcísio passou a ser alvo de ataques devido à postura de Bolsonaro.
A proximidade de Tarcísio com o presidente é tão grande que coube a ele, na última quinta-feira (9), enviar um vídeo para lideranças de caminhoneiros para garantir que Bolsonaro tinha pedido a desmobilização das rodovias federais do país.
Nos bastidores, no entanto, ele já vinha conduzindo uma operação de desmonte da paralisação de uma ala de direita da categoria que apoia Bolsonaro.
O ministro é visto como um “garoto-propaganda” do presidente ao comandar uma pasta que já trouxe mais de R$ 100 bilhões e pretende encerrar o mandato com R$ 260 bilhões em investimentos contratados.
Diferentemente do ministro da Economia, Paulo Guedes, que se vê encurralado com inflação e juros em alta, Tarcísio deve encerrar sua gestão gerando mais de 3 milhões de empregos.
Esse plano só será frustrado se os principais projetos de concessão sofrerem algum tipo de atraso.
O ministro, que mais recentemente assumiu um discurso abertamente político em defesa do governo, pretendia se candidatar ao Senado. Inicialmente, cogitou lançar-se pelo Distrito Federal, mas teria a concorrência de Flávia Arruda, hoje ministra da Articulação Política.
As opções remanescentes seriam Goiás ou Mato Grosso, com o apoio do agronegócio –principal favorecido pelos projetos levados adiante pelo ministro.
Em meados de maio, Bolsonaro deu a largada para o que chamou de “namoro” de Tarcísio com o governo de São Paulo. A declaração foi dada durante visita do presidente a Alagoas.
Desde então, Tarcísio passou a acompanhá-lo em diversas viagens e a contar com Bolsonaro em inaugurações. Até ponte no interior do Amazonas teve a presença da comitiva presidencial.
“Tarcísio está se descobrindo para a política. É um tremendo gestor. É um homem com excelente formação moral e profissional, nos dará ainda muitas alegrias em nosso Brasil, e eu agradeço pelo trabalho que ele faz lá em nosso ministério”, disse Bolsonaro na ocasião.
Durante as manifestações de 7 de setembro em São Paulo, Tarcísio esteve ao lado do presidente praticamente durante todo o evento.
Em conversas com políticos, Bolsonaro não se cansa de soltar bordões como “quem sabe São Paulo adota o Tarcísio para o ano que vem” ou “se ele vier candidato por São Paulo, nem precisa fazer campanha”.
Além da campanha própria em defesa de Tarcísio, Bolsonaro pediu que o ministro passasse a dar mais entrevistas, especialmente no rádio, e a participar de lives.
O ministro ainda tenta resistir à convocação de Bolsonaro para que ele seja seu candidato ao governo de São Paulo.
Assessores do Planalto afirmam que, embora Tarcísio reconheça que não terá chances, ele aceitou a disputa para que o presidente tenha um palanque no estado, forma de fazer frente a João Doria (PSDB-SP), potencial rival na disputa pelo Planalto.
Em São Paulo, Tarcísio não nega convites para falar com o empresariado, banqueiros, e faz questão de participar dos leilões realizados na B3, a Bolsa brasileira em São Paulo.
A concessão do último trecho da Ferrovia Norte-Sul, a renovação antecipada de malhas ferroviárias partindo do Centro-Oeste até Santos e a própria privatização do porto são apontados como principal atrativo político em defesa da candidatura de Tarcísio no estado.