Gigantes da tecnologia

Taxação das big techs: o que está por trás da rodada de negociações?

O Governo Federal está propondo quatro formas para elevar a tributação das big techs; proposta deve chegar ao Congresso neste semestre

Big Techs Meta e Google
Foto: Pixabay

Mais de 370 milhões. Essa é a quantidade de usuários brasileiros ativos em duas das maiores empresas de tecnologia, chamadas Big Techs, do mundo: a Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp) e a Amazon.

Comparado às demais companhias de mesmo porte, de outros setores da economia, porém, as gigantes globais da internet pagam 76% menos impostos no Brasil, segundo dados da Receita Federal divulgados pelo deputado federal João Maia (PP-RN).

O governo está estudando formas de elevar a tributação das big techs e, diante da movimentação, há indícios de que uma proposta seja apresentada ao Congresso ainda no primeiro semestre deste ano.

O plano, inclusive, se tornou uma das prioridades do Brasil à frente do G20, pontuou a secretária de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Tatiana Rosito, à CNN.

Em meio à discussão sobre a taxação das big techs, há algumas formas sendo analisadas: o pagamento pelo uso de rede de telefonia (fair share) e a criação de uma contribuição para o jornalismo, devido, segundo os técnicos, à degradação do ecossistema de informação causada pelas gigantes da tecnologia.

Há também a cobrança de uma taxa de vídeo “on demand”, aplicada aos serviços de streamings, entre outros, e a aplicação de um imposto sobre a renda junto com a regulamentação da reforma tributária.

Segundo Fabio Murad, sócio da Ipê Avaliações, há um indicativo de que a arrecadação potencial com a maior tributação das Big Techs pode variar de R$ 3,3 bilhões a R$ 27,6 bilhões por ano, a depender do modelo de tributação aplicado. “Isso significa que a União está deixando de arrecadar esses valores atualmente”, ressalta.

O advogado tributarista Diego Fonseca, do escritório Fonseca Lawyers, explica que, atualmente, a tributação das grandes plataformas de tecnologia acontece nos “moldes convencionais” – com base nas receitas declaradas – no Brasil. É isso o que está sendo colocado em discussão.

“Este cenário atual pode não refletir de maneira adequada o real impacto econômico da atividade das Big Techs, como Google, Apple, Meta, Microsoft e Amazon. Isto porque, a inovação e disrupção trazidas pela tecnologia dessas empresas tem o potencial de desajustar a relação entre a movimentação econômica que promovem no país e a base efetivamente tributada pelo Fisco Brasileiro”, destaca Fonseca.

Diego também chama a atenção para a transferência do lucro das grandes empresas para destinos com tributações mais favorecidas, chamados paraísos fiscais, o que, segundo ele, contribui para a erosão da base tributária nos países com milhões de usuários das plataformas – como no caso do Brasil.

É evidente que este tipo de planejamento tributário, considerado abusivo por partes de muitas autoridades fiscais, não é realizado apenas pelas big techs. Contudo, devido ao alcance multinacional e a dificuldade de mensurar a atividade econômica dessas plataformas de tecnologia, acontece essa esquematização.

O advogado tributarista explica ainda que a questão da tributação das big techs não é exclusiva do Brasil.

“Existe uma grande dificuldade em se determinar uma base tributável isonômica e adequada à realidade de cada país, na atividade econômica dessas plataformas e seus usuários, que geram bilhões de reais em receitas de vendas e publicidade”, pontua.

Há também uma outra demanda do governo federal em relação ao aumento dos impostos para as gigantes de tecnologia: a necessidade de investimento em inclusão digital, o que, para Murad, é “extramemente necessário”.

A proposta do governo é que as big techs contribuam com a meta de garantir, até 2029, acesso à tecnologia do 5G a todas as capitais estaduais.

Governo enfrenta resistência entre membros e articula negociações

Além da resistência das próprias big techs, o governo enfrenta dificuldades internas e rodadas de negociações para tentar chegar a um consenso em relação à tributação. De que forma vai acontecer? Quais são os principais desafios?

Entre os receio, há o argumento de que o aumento de impostos poderia desencorajar as Big Techs de operar no Brasil – o que poderia ter efeito negativo em termos de inovações tecnológicas e, sobretudo, na economia.

Alguns parlamentares já argumentam que as grandes empresas de tecnologia não devem ser cobradas adicionalmente pelo volume significativo de tráfego que proporcionam, ideia conhecida como “fair share”. Isso, argumentam, vai de encontro ao princípio da neutralidade de rede no Brasil, definido pelo Marco Civil.

Segundo este princípio, os provedores têm que dar o mesmo tratamento a qualquer tipo de tráfego de dados, sem diferenciar por conteúdo, origem, destino ou volume. Cobrar a mais de algumas empresas, portanto, seria ferir este princípio.

Para Fonseca, é imprescindível que haja equilíbrio entre a necessidade de tributação e garantia de um ambiente de desenvolvimento econômico e tecnológico sustentável no país. Além disso, o especialista em direito tributário defende uma proposta que convirja com a ampliação da inclusão digital.

Em coletiva na sede do G20, em Brasília, no último dia 18, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, afirmou que o ideal é que as empresas façam contribuição para políticas públicas, com os recursos de uma possível taxação indo para um fundo.

“A nossa posição é de que uma eventual receita que se construa dessas plataformas fique para fazermos a inclusão digital que ainda não temos no Brasil”, disse o ministro.