SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A B3, a Bolsa de Valores brasileira, informou nesta quarta-feira (24) que levou a escultura Touro de Ouro para um depósito onde mantém seu acervo e que não há planos imediatos para nova exposição. A estátua foi retirada pela B3 na noite desta terça-feira (23). A peça estava instalada na rua 15 de Novembro, na região central da cidade de São Paulo.
A remoção ocorreu horas depois de a CPPU (Comissão de Proteção à Paisagem Urbana), da Secretaria Municipal de Urbanismo, concluir que o Touro de Ouro de 1tonelada é uma peça publicitária, instalada na via pública sem a devida autorização.
A irregularidade é passível de multa, a ser determinada pela Subprefeitura da Sé, que informou ainda aguardar o processo da CPPU para determinar o valor.
Composta por representantes da sociedade e do município, a CPPU é o órgão da prefeitura responsável por fiscalizar intervenções na paisagem urbana que possam interferir na Lei Cidade Limpa.
O debate central tratou do caráter da obra. Era preciso definir se tinha cunho cultural -e, portanto de interesse público- ou se era uma peça publicitária. A conclusão foi que o Touro de Ouro é, em última instância, publicidade e, sendo assim, havia sido instalado sem autorização do órgão.
Ao avaliar a instalação, membros da CPPU criticaram o fato de estátua representar uma das marcas do seu idealizador, o sócio da XP e presidente da empresa de educação financeira Vai Tourinho, Pablo Spyer. O empresário também é conhecido por apresentar o programa Minuto Touro de Ouro, na Jovem Pan.
Procurados, Spyer e a XP não comentaram.
Outros integrantes do conselho destacaram, porém, que a obra atraiu público para a região central, beneficiando o comércio, que havia sido muito prejudicado devido às restrições criadas pelo enfrentamento à pandemia de Covid-19.
O debate dividiu a comissão, com cinco representantes votando pela retirada do touro, e quatro integrantes se posicionando a favor da permanência.
O Touro de Ouro alimenta polêmicas e atrai protestos desde a inauguração da exposição em 16 de outubro.
No lançamento, a B3 explicou que a escultura era inspirada na estátua de bronze Touro de Wall Street, em Nova York, nos Estados Unidos. A alusão ao touro americano também consta do processo de solicitação para a instalação da peça na calçada da Bolsa, segundo informou a CPPU na reunião desta terça.
O autor do touro, o arquiteto Rafael Brancatelli, afirma, porém, que a seu touro não é cópia do americano e que até a sua constituição é diferente. O touro brasileiro é revestido de fibra de vidro, tem pintura automotiva e seu interior possui uma estrutura de metal preenchida com EPS (isopor) de alta densidade.
No dia seguinte ao lançamento, o touro amanheceu pichado. Movimentos sociais afixaram cartaz com a palavra fome. Nos dias que se seguiram, exibiu a mensagem “taxar ricos” e a organização SP Invisível promoveu um churrasco com moradores de rua na frente da estátua.
Contrato entre B3 e o arquiteto, que consta no Registro de Responsabilidade Técnica, divulgado no site do CAU-BR (Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil), detalha que peça custou R$ 350 mil. Brancatelli e B3 não confirmaram o valor.
Sobre a multa, a B3 aguarda a decisão da Subprefeitura Sé, mas inicialmente compreendeu que a CPPU determinou a punição ao responsável técnico pela obra, no caso, a empresa Dmaisb Arquitetura e Construção, de Brancatelli.
Na audiência para a CPPU, Brancatelli argumentou que tinha autorização da Subprefeitura Sé e do Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal da Cultura. As afirmações de Brancatelli foram confirmadas pelos órgãos citados e por despachos publicados no Diário Oficial da Cidade de São Paulo.
Na ocasião, Brancatelli pediu desculpas à comissão. Procurado pela Folha, ele não quis comentar sobre a decisão da CPPU.
Durante a reunião transmitida pela internet, porém, membros do CPPU alertaram que as autorizações condicionavam a liberação à aprovação da comissão que fiscaliza a publicidade, dentro dos critérios da Lei Cidade Limpa, e que esta etapa não havia sido cumprida.
Estabelecida há 15 anos na gestão de Gilberto Kassab (2006-2012, PSD), a Lei Cidade Limpa regulamentou a publicidade nas ruas da capital paulista.
Outdoors e pinturas em fachadas que faziam propaganda de empresas e produtos passaram a ser proibidos e as placas e anúncios que identificam as atividades desenvolvidas em prédios e lojas passaram a ter normas rígidas quanto ao tamanho.
Em 2018, a prefeitura modificou a lei para permitir a instalação de painéis de LED no interior dos estabelecimentos que pudessem ser vistos por meio de vitrines voltadas para a rua.
“A Lei Cidade Limpa regula como qualquer coisa que tenha interferência no espaço público pode ser instalada”, afirma a urbanista e administradora pública Camila Maleronka. Entre o que foi tipificado, está a propaganda.
A urbanista diz que, por ser uma área com vários edifícios históricos, qualquer intervenção deve ter, segundo a lei, uma análise de impacto na paisagem.