A Comissão Europeia propôs nesta quarta-feira (17) proibir a importação de produtos do agronegócio considerados fortemente ligados ao desmatamento e à degradação florestal, entre eles algumas das commodities mais exportadas pelo Brasil, como soja e carne bovina.
A regra abrange inclusive o corte de árvores considerado legal na legislação do país de origem dos produtos. De acordo com a Comissão, isso se deve ao fato de que o desmatamento ilegal foi superado pela expansão de áreas agrícolas como a principal causa da destruição de florestas.
A UE também teme que, ao fazer uma distinção entre o que é legal e ilegal, produza um incentivo perverso: o de levar países a alterarem suas legislações para ampliar a definição do que é desmatamento legal.
Ainda que o projeto fale em florestas e exclua áreas inundadas, como o Pantanal brasileiro, a Comissão afirma que a definição do que será considerado desmatamento será suficiente para proteger dois terços do que ainda resta de vegetação nativa no cerrado do país.
Além de soja e carne, a proposta se refere a óleo de palma, madeira, cacau e café, e produtos derivados, como móveis e couro. A lista pode ser ampliada no futuro para incluir, por exemplo, a borracha, segundo o comissário responsável por Ambiente, Oceanos e Pesca, Virginijus Sinkevicius .
O texto ainda precisa ser aprovado pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho Europeu (que reúne os líderes dos 27 membros). Se passar, prevê um ano para que cada empresas e Estados-membros criem as estruturas necessárias para implementá-la.
Independentemente da data em que o processo for implantado, a proposta de legislação estabelece que as empresas de comércio exterior terão que provar que as commodities e produtos não estão ligados a terras desmatadas ou degradadas após 31 de dezembro de 2020.
A Comissão afirma que não haverá proibição de qualquer país ou mercadoria. “Os produtores sustentáveis continuarão a conseguir vender os seus produtos para a UE.”
Os países ou regiões serão classificados como de risco baixo, padrão ou alto de produzir commodities ou produtos ligados ao desmatamento ou em desacordo com a legislação do país produtor, o que elevará o controle.
O Parlamento Europeu havia solicitado à Comissão que incluísse nas condições que levam à proibição das importações o respeito aos direitos humanos e às terras indígenas. Segundo a Comissão, o fato de que os produtos precisam respeitar as leis nacionais deve cumprir em parte esse papel.
De acordo com a justificativa do projeto, a expansão de terras agrícolas destinadas a produzir commodities que a União Europeia importa é hoje o principal motor do desmatamento e da degradação florestal.
Segundo a FAO (agência das Nações Unidas para alimentação e agricultura), 420 milhões de hectares de floresta, uma área maior do que a União Europeia, foram desmatados entre 1990 e 2020.
Quando descontada a área de reflorestamento ou regeneração florestal, a perda foi de 178 milhões de hectares, ou três vezes a superfície da França.
“A UE é parcialmente responsável por esse problema, e quer responder ao forte apelo dos cidadãos europeus para liderar o caminho para resolvê-lo”, afirmou a Comissão. Em consulta pública, a proposta foi aprovada por 1,2 milhão de pessoas.
O vice-presidente executivo do Green Deal europeu, Frans Timmermans, disse que as novas regras atendem a uma preocupação dos europeus para promover o “consumo sustentável”.
A defesa do ambiente e a crise climática é considerada uma das questões mais importantes pelos europeus, segundo a mais recente pesquisa Eurobarómetro, divulgada no semestre passado.
A proposta prevê que o combate ao desmatamento, com multas às companhias que desrespeitarem a proibição, será acompanhado de incentivos aos produtores para que preservem florestas intactas.
O desmatamento é no Brasil a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa (que causam aquecimento global): responde por 55% do problema.
O setor agropecuário costuma argumentar que mais de 90% da destruição florestal é provocada por atividades ilegais, mas a decisão da UE de incluir qualquer desmatamento em suas novas regras pode ser um complicador.
Entenda o regulamento A proposta da Comissão estabelece regras de “due diligence” (auditoria), pelas quais exportadores dos produtos com risco de ligação com desmatamento e degradação florestal devem garantir que eles são livres de desmatamento e legais (de acordo com as leis do país de origem) sejam permitidos no mercado da UE.
As empresas de comércio exterior serão obrigadas a coletar as coordenadas geográficas do terreno onde as mercadorias que colocam no mercado foram produzidas.
Essa rastreabilidade estrita visa garantir que a fiscalização de cada país da UE seja capaz de controlar que apenas produtos livres de desmatamento entrem no mercado comum europeu.
A lista de garantias e a rigidez da fiscalização vão variar de acordo com o risco do país ou região de origem.
As empresas terão de apresentar uma declaração a um sistema de informação europeu confirmando que exerceram com êxito a fiscalização/auditoria e que os produtos que colocam no mercado cumprem as regras da UE.
A declaração também fornecerá informações essenciais para o monitoramento, ou seja, as coordenadas geográficas da fazenda ou plantação onde as commodities foram cultivadas.
O não cumprimento de qualquer um dos dois requisitos resultará na proibição de colocar esses produtos no mercado da UE.
Além da proposta para desmatamento, a Comissão apresentou regras para transporte de resíduos e para uso do solo na UE.