“Quer comprar um pouquinho pra você?”

Como dois telefonemas levaram a CVM a punir um bilionário brasileiro

As ligações não ultrapassaram dez minutos, mas seriam as responsáveis por banir o megainvestidor da B3 por cinco anos

Foto: reprodução
Foto: reprodução

O ano era 2017 quando Silvio Tini, uma das figuras mais bem sucedidas entre os investidores nacionais, com uma fortuna de R$ 4 bilhões, decide fazer uma ligação a um funcionário da corretora Bradesco, Caio Galli, que executava as ordens de compra e venda do empresário na Bolsa de Valores brasileira, a B3.

Ao todo foram duas ligações, que somando-as não ultrapassaram dez minutos, mas seriam as responsáveis por penalizar o megainvestidor e bani-lo da B3 por cinco anos, através de uma decisão da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). 

Durante esse tempo, Araújo está proibido de ocupar cargos de administrador ou conselheiro fiscal em empresas de capital aberto ou entidades que necessitem de autorização da CVM. 

A decisão, tomada de forma unânime pelo colegiado da comissão, foi anunciada em julho e está relacionada a um caso de uso de informação privilegiada envolvendo a empresa Alpargatas em 2017. Na época Tini era conselheiro da mesma.

A análise do caso também abrangeu dois antigos operadores da Bradesco Corretora, Caio Galli e Júlio César Rossi. A CVM impôs a cada um deles uma multa de R$ 200 mil.

Em 29 de março de 2017, após “investigações internas”, o Bradesco identificou dois telefonemas através dos quais Tini supostamente teria instruído Galli a comprar ações ordinárias da Alpargatas. Conforme o processo da CVM, o corretor e seu ex-colega Júlio César Rossi, em posse dessa informação, começaram a negociar ações da empresa a partir desse momento.

Segundo a tese acusatória apresentada pela CVM, “havia sérios indícios de que as compras de ações ordinárias da Alpargatas (ALPA3) por Caio Galli, no dia 10 de abril de 2017 (2,6 mil ações), e por Júlio César Rossi, nos dias 29, 30 e 31 de março e 5 de abril de 2017 (totalizando 5,3 mil ações), foram realizadas com base em informações relevantes ainda não divulgadas sobre o projeto de migração da empresa para o Novo Mercado”. 

Tini teria repassado essa informação por telefone. Abaixo estão os trechos das conversas captadas pela corretora do Bradesco incluídas no processo:

Primeiro telefonema – Início: 10h42; Fim: 10h49

Silvio: É…essas coisa aí, Caio… É…é…essas coisa aí…Caio…o…a ALPA ON tá muito distorcida…você não quer comprar um pouquinho pra você, hein, Caio? 

Caio: Posso.

Silvio: Isto…pra você. 

Caio: Tá…E a PN [ações preferenciais da Alpargatas], Silvio, acabou a venda, hein? Voltou… 

Silvio: ‘Cê” entendeu, Caio? 

Caio: Entendi, entendi…Voltou um caminhão de compra da PN aqui, hein? Você me dá só um minutinho, Silvio, pra…? 

Silvio: Tá. 

Caio: Um caminhão de venda, hein? Um caminhão de compra na PN. 

Silvio: É…eu, eu acho que vai melhorar. Essa ON [ALPA ON] está mais barata, viu, Caio?

Caio: É…Agora fechou a R$ 10,40, as vendas estão ali a R$ 10,34. Se eu tomar um “cenzinho” lá, o papel vai parecer com queda. 

Silvio: Ô Caio? “Cê” entendeu o que eu falei? 

Caio: Lá, né? 

Silvio: É…manda o…manda o…o…manda lá o Júlio César comprar pra você. 

Caio: Tá bom. 

Silvio: Tá bom? No limite do seu fôlego. 

Caio: Pode deixar. 

Silvio: Tá? 

Caio: Pode deixar. 

Silvio: Nós não vamos falar mais. 

Caio: Tá bom. 

Silvio: Tá bom?.”

Segundo telefonema – Início: 11h01; Fim: 11h04

Caio: Silvio? 

Silvio: Muito cuidado com isso que eu falei, viu, Caio? 

Caio: Tá joia. Pode ficar tranquilo. 

Silvio: Tá. E é só pra você… 

Caio: Pode ficar tranquilo. 

Silvio:…e mais ninguém…ir com muita sede ao pote, tá? Senão… 

Caio: A outra lá é leilão…vai demorar um tempinho, viu? 

Silvio: É né? Não sossega, né? 

Caio: Não negociam há um tempo… 

Silvio: Isto. 

Caio: Então, tem que ir devagar, lá.

Silvio: É. Muito devagar, não deixa puxar o preço… 

Caio: Isso, isso… 

Silvio: Tá…Pra não…pra não me complicar, hein cara? 

Caio: Não, não… Tudo tranquilo…

Acesse a versão completa
Sair da versão mobile