Tecnologia

Com GameFi, o mercado cripto está para jogo

Como blockchains, criptomoedas e NFTs estão revolucionando a maior indústria de entretenimento do mundo

GameFi, P2E, jogos NFT, todos esses termos se referem à mesma coisa: games que fazem uso da tecnologia blockchain e oferecem recompensas financeiras aos jogadores. E esse mercado está literalmente mudando o jogo para a maior indústria de entretenimento do mundo, sendo responsável por movimentar cerca de US$ 5,1 bilhões no ano passado.

O termo ‘GameFi’ vem da fusão das palavras jogo (game) e finanças (finance), ou seja, são jogos intimamente ligados ao aspecto econômico. Marcos Issler, head de blockchain da BlueBenx, afirma que as empresas do ramo viram uma abertura de mercado para unir esses dois mundos. 

O modelo mais conhecido dentro deste universo são os jogos P2E (play-to-earn), literalmente ‘jogue para ganhar’, que são games que oferecem incentivos financeiros aos jogadores. Neles, os usuários recebem recompensas na forma de criptomoedas e NFTs ao completar tarefas, vencer batalhas e progredir dentro do universo do jogo. Através das blockchains, esses itens podem ser transferidos para fora do mundo virtual, possibilitando a negociação de NFTs e de criptomoedas em corretoras cripto. 

A evolução do universo dos videogames

Mas como o mercado de videogames chegou aos jogos P2E? Os primeiros jogos populares tinham um sistema “pay-to-play” (pague para jogar), como GTA e World of Warcraft. “O usuário comprava o jogo uma única vez, o jogo se tornava dele e ele podia jogar quando quisesse”, explica Carlos Eduardo Gomes, head de research da Hashdex.

Depois, foi implementado o modelo “freemium”, uma junção entre o ‘free’ (grátis) e o ‘premium’. Nesses jogos, o usuário não precisa gastar para começar a jogar, a exemplo de Fortnite e League of Legends. O lucro das empresas é decorrente das vendas internas do jogo, como pacotes de expansão, assinaturas, customização de personagens, etc.

Agora, com a popularização das blockchains, as empresas conseguiram uma outra forma de monetizar seus jogos, a partir das criptomoedas e NFTs. Vanessa Donnianni Aguirra, CEO da Multifaces Comunicações, afirma que “são infinitas as oportunidades que os games podem trazer para as estratégias de negócio, como as novas modalidades de fontes de renda que criam experiências de pagamentos em jogos”.

GameFi e NFTs

Segundo dados do L’Atelier BNP Paribas e NonFungible.com, os jogos NFTs movimentaram US$ 5,17 bilhões em 2021. Esse valor representa 29,3% de todo o volume do mercado de NFTs, superando, inclusive, o setor de artes.

A negociação de itens dentro dos jogos ocorre devido às características próprias dos NFTs, que carregam um certificado de exclusividade. “Isso se encaixa perfeitamente nos jogos, pois as pessoas conseguem criar um item e salvá-los na blockchain, onde fica registrado que ela é dona daquele objeto virtual”, diz Marcos. 

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Carlos explica que “na forma como os jogos são construídos hoje, todos esses itens existem apenas no servidor daquele jogo específico. Tudo o que você construiu ali pertence ao estúdio do game”. Portanto, o que blockchain e o universo cripto possibilitaram foi o registro desses itens em uma rede descentralizada, Assim, o jogador tem mais liberdade e flexibilidade para lidar com esses ativos da forma que preferir.

Por exemplo, o jogo mais popular entre os GamesFi, o Axie Infinity, que possui uma premissa similar ao Pokémon, foi o responsável por gerar a adesão global ao modelo P2E.  O Axie Infinity requer que o jogador compre um Axie, um NFT da rede Ethereum (ETH), no início do jogo. Os Axies podem se valorizar e ser negociados dentro do game. Além disso, batalhas e conquistas bem-sucedidas resultam em recompensas, que, por sua vez, podem ser trocadas por criptomoedas. 

Interoperabilidade e creator economy

Um estudo da Stratis realizado no final do ano passado com 147 desenvolvedores dos EUA e no Reino Unido revelou que 47% dos participantes já estavam usando NFTs em seus jogos. Além disso, 72% consideraram a integração da tecnologia blockchain em seus produtos.

Isso porque não é apenas a possibilidade de retorno financeiro que atrai os players para os jogos blockchain. Outra característica possibilitada por esta tecnologia é a interoperabilidade, ou seja, a capacidade de usar ativos de jogos individuais em jogos diferentes, pertencentes à mesma blockchain (ou até mesmo em blockchains diferentes). 

Dessa forma, itens de jogos que existam em blockchains interoperáveis podem ser trocados em mercados comuns. “Como os NFTs estão registrados na blockchain, é possível transferi-los para onde você quiser, desde que o jogo dê suporte para isso. O NFT pode viver em dois ecossistemas, o que não é possível nos jogos atuais”, explica Carlos.

Vanessa também cita a creator economy, uma economia facilitada por softwares que permite que os criadores obtenham receita com suas criações. “Um criador cria seus ativos, que podem ser um NFT ou um avatar, e a remuneração passa a vir da comunidade ‘descentralizada’”, explica Vanessa. “O poder da remuneração não está mais centralizado nas grandes plataformas de mídias sociais, mas sim na mão do usuário”, conta.

Jogos NFs também envolvem riscos 

O hype em volta dos jogos em blockchains atraiu milhões de jogadores dispostos a investir seu tempo – e dinheiro – nesses games. Mas nem tudo são flores. Para Marcos, por se tratar de algo recente, muitos usuários não sabem como lidar com essa tecnologia. “Enquanto o NFT estiver na sua carteira, ele é seu. Mas você pode transferi-lo para outras carteiras, e as pessoas estão se aproveitando disso”, diz ele. Hackers e golpistas estão criando sites falsos e métodos para roubar criptomoedas e NFTs de alto valor. 

Além disso, é comum que empresas utilizem o pré-lançamento dos jogos para vender NFTs e angariar fundos para financiar o próprio desenvolvimento do game. No entanto, existe o risco da empresa não conseguir lançar o produto no futuro, deixando o usuário no prejuízo. 

“O usuário deve fazer uma pré-avaliação do game para entender se o dinheiro que ele está aportando é um dinheiro importante, relativo, e se esse jogo é um projeto verdadeiro”, recomenda a BlueBenx. Carlos indica estudar a ‘tokenomics’ do jogo, como funciona a emissão e evolução dos preços dos ativos.

Jogos em blockchain: game over?

Em 2021, o Axie Infinity cresceu 30% a cada semana e se tornou o jogo com maior movimentação de dinheiro sem estar disponível em nenhuma loja de apps. Em seu auge, jogadores conseguiam faturar de R$ 2 mil a R$ 10 mil por mês. Porém, desde o início de 2022, o AXS já desvalorizou cerca de 60%. 

Mesmo com a recente queda do Axie Infinity e outros jogos “pay-to-earn”, somada às recentes baixas no mercado cripto, o universo dos games NFT tem encontrado novas oportunidades. Um exemplo são os jogos “move-to-earn” (M2E), uma outra categoria que se tornou tendência este ano. 

Os jogos M2E se baseiam em aplicativos que permitem que o usuário receba renda passiva ao fazer exercícios físicos. Os aplicativos, que contam com sistema de GPS, validam as movimentações do usuário e geram recompensas pelo exercício físico realizado, como recursos que podem ser trocados por criptomoedas e dinheiro fiduciário em exchanges. 

O mais famoso jogo move-to-earn é o STEPN, em que o usuário precisa comprar uma das 4 opções de Sneakers-NFT ofertadas no aplicativo. Ao se exercitar, o jogador é recompensado com um token que pode ser vendido em corretoras.

Carlos Eduardo Gomes, da Hashdex, acredita que os jogos blockchain vieram para ficar. Segundo ele, a adesão em massa ainda não ocorreu pois não existem tantas opções no mercado atual. “É demorado desenvolver um bom jogo. Mas existem várias empresas e estúdios de games que estão desenvolvendo jogos em blockchains, que devem aparecer nos próximos meses ou anos”, diz.

Para Marcos, GameFi, a tecnologia blockchain, os NFTs e o metaverso ainda tem muito a evoluir. “Todo esse processo ainda é muito embrionário. Eu acho que agora essas tecnologias vão começar a se adaptar para se transformar em algo que as pessoas vão poder usar no dia-a-dia”, conclui. 

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