Chega de IPO? 27 empresas já desistiram neste ano

Condição econômica no Brasil e exterior são alguns dos fatores apontados para desistências

Nas últimas semanas, mais três empresas entraram para a lista de companhias da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que desistiram de realizar o IPO (oferta pública inicial de ações) este ano. A atacadista Tambasa, a Senior Sistemas e a Qestra voltaram atrás em abrir capital e acompanharam o movimento de outras 24 empresas que já haviam protocolado o pedido de IPO entre 2021 e 2022, mas não seguiram adiante. 

Em janeiro, apenas, treze empresas desistiram de abrir capital na bolsa de valores brasileira, a B3, o maior número para um mês desde 2017, quando se deu o início da série histórica da CVM.

“A condição econômica mudou muito em 18 meses. A janela de tempo atual não é tão favorável para que se capte recursos por ações”, explica o analista da Empiricus Matheus Spiess. Com uma alta volatilidade da bolsa, a taxa de juros aumentando, o bear market no exterior e a quantidade de resgate nos fundos da indústria são fatores que, para o analista, comprometem a atividade de um IPO este ano.

Para Marcelo Cambria, professor de mercado de capitais da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), num contexto de instabilidade ainda oriundo da crise sanitária provocada pela covid-19, a CVM também estaria mais propensa a solicitar e sugerir arquivamento do pedido.

“Em tempos muito instáveis, a Comissão prefere que as empresas não abram capital porque existe a chance de vender uma ação a um preço que rapidamente abaixe, valendo menos. Isso não é interessante para compradores nem vendedores”.

Prós e contras nas baixas de IPO

Por um lado, a longo prazo, poucas safras de IPO fazem com que haja menos oportunidades listadas para se investir. Na contramão, o menor número de IPO fomenta um cenário menos poluído para o investimento em ações. É o que entende Spiess, que explica: 

“Muitas empresas que foram ao mercado nos últimos dois ou três anos não estavam preparadas para o movimento, gerando bastante ruído em termos de alocação para os investidores locais”.

Ainda, para o professor da Fecap, um setor que perde uma empresa que iria abrir capital na bolsa de valores pode ser afetado, já que, de uma maneira geral, a B3 ainda possui poucas companhias listadas. 

“Ter mais empresas em setores que já estão na bolsa é sempre favorável para se pensar em índices para o segmento”. Ainda assim, já existem fundos que compilam empresas de diversos setores, sem depender de um número maior de companhias em um único segmento. 

IPOs devem aumentar com a recuperação econômica?

Para o analista da Empiricus, o cenário de para aumento nos números de IPOs ainda é trivial, e depende de uma recuperação na bolsa local, além de estabilidade nos índices internacionais e uma posterior queda da taxa de juros básica, a Selic. 

“A curva de juros se estressou bastante nos últimos meses, em especial no segundo semestre de 2021 e no segundo trimestre de 2022, prejudicando os valuations. Elas podem voltar a captar quando a situação dos juros se estabilizar e ficar mais controlada, bem como o fator técnico de resgates da indústria cessar”, analisa Spiess.

Para Marcelo Cambria, ainda, muitas empresas aguardam para realizar o IPO em momentos mais propícios, que dependem de uma bolsa em condições de alta, como se viu, em geral, no último mês. Com isso, é possível que algumas empresas resolvam desarquivar e seguir com o processo de abertura de capital.

Nesse sentido, se for concretizado, o IPO pode ser usado para aumentar o fluxo de caixa de uma empresa. É o que explica o professor da Fecap. “Ele reúne fonte de recursos primárias e assim, deveria alocar boa parte dos recursos para ampliação de operações. Isso, a partir de estudos de caso, faz com que, a longo prazo, aumente o valor da própria empresa”, conclui Cambria.