Na esteira dos setores que têm frustrado os investidores na Bolsa brasileira, as ações de educação cravaram perdas expressivas do início do ano até o momento. Na leva de obstáculos que obscurecem o caminho estão a economia doméstica, sobretudo pela inadimplência, a dificuldade de atrair novos alunos, a insegurança com o EAD, bem como o aumento de custos das empresas.
O desenvolvimento esperado com incentivos ao ensino vindos do governo não se concretizou. No início do ano, as ações de educação estavam embaladas nesse ânimo, com projeções, inclusive para bons resultados operacionais nos trimestres, no entanto, as apostas falharam.
A Cogna (COGN3), por exemplo, teve prejuízo de R$ 373 milhões no primeiro trimestre de 2024, até o momento as ações caíram mais de 58%, segundo dados do TradingView.
“A tese principal para o setor é que o grau de ciclicidade possui nível elevado, quando observado sob a ótica dos ciclos econômicos, atividade econômica e ganho de renda da população”, afirmou Matheus Nascimento, analista da Levante, em resposta ao BP Money.
Outras ações como a Yduqs (YDUQ3), Cruzeiro do Sul (CSED3), Ser Educacional (SEER3) e Ânima (ANIM3) também seguem no mesmo patamar. A YDUQ caiu mais de 51% no ano, seguida da SEER3 com recuo maior que 31%, enquanto a CSED e a ANIM3 desvalorizaram pouco mais que 20%.
“As empresas de educação listadas possuem por um momento de sobre oferta, o que canibalizou diversos cursos, que, inclusive, tem sofrido algum tipo de mudanças regulatórias na oferta de cursos EAD”, prosseguiu Nascimento.
“Além disso, a grande maioria das listadas do segmento fizeram movimentos de reestruturação nas carteiras de imóveis, o que também impactou os balanços”, disse.
A dificuldade na captação de alunos é um dos entraves que cercam o setor, com a insegurança regulatória e a inadimplência condenando a procura pelo ensino dessas instituições.
“Os alunos estão desmotivados e muito inseguros com a “insegurança regulatória” – o debate do MEC [Ministério da Educação] quanto a qualidade da educação e o questionamento do EAD, que é a oferta que mais cresce, acabou desanimando os alunos, os mantenedores e os docentes”, esclareceu Francisco Borges, consultor da Fundação FAT.
No quesito ensino à distância, o governo Lula alterou, em junho, o modo de funcionamento dos cursos, vetando a abertura de polos, autorização de novos cursos e expansão de vagas nos que já existem até 2025, apenas no setor privado.
Anteriormente, as empresas podiam fazer tais aberturas de polos sem a aprovação do MEC. “Lutar contra o EAD e trazer mais presencialidade só vai reduzir mais e mais o acesso ao ensino superior. É impossível voltar ao presencial ou ao híbrido. Será um marco de incompetência do Ministério comprovado com censos futuros”, frisou Borges.
Ações de educação precisam vencer concorrência e inadimplência
Enquanto as empresas de educação se batem com o governo da regulação do EAD, outro peça entra no jogo para desequilibrar os players mais relevantes do mercado: as pequenas empresas.
Caritsa Moreira, analista da VG Research, explicou que diversas instituições e pequenas empresas seguem abrindo cursos, inclusive de medicina – um dos mais relevantes para o setor – o que prejudica as empresas na Bolsa, que têm uma estrutura maior e necessitam de qualidade melhor, logo gastam mais para isso.
Muitas instituições e empresas pequenas acabam abrindo diversos custos, inclusive de medicina. “Essa concorrência não é bem vista para nenhum setor, mas para a educação, principalmente em virtude do EAD, temos essas dificuldades”, disse Moreira.
Na tentativa de atrair novos estudantes, um dos principais objetivos das empresas de educação, segundo Danilo Oliveira, CMO Cubos Academy, é garantir que o conteúdo esteja atualizado para as necessidades do mercado.
“Garantir que os estudantes concluam seus cursos no prazo planejado e que absorvam da melhor forma possível todo o conteúdo ensinado. Para isso, é essencial que os educadores compreendam as dificuldades que os alunos enfrentam em manter a motivação, manter uma rotina de estudos eficaz e com conteúdo de qualidade”, apontou.
Já o CEO da Cubos Academy, José Messias Junior, reitera a tese de que as oportunidades para o setor de educação estão no desenvolvimento da IA (inteligência artificial).
“Há um grande espaço surgindo para aumento de eficiência e as instituições que tiverem coragem e mobilidade para inovar cedo, vão se destacar”, afirmou.
Porém, no caminho para esse desenvolvimento, as ações de educação ainda precisam lidar com o cenário macroeconômico, que se apresenta cada vez mais difícil em termos de acesso a crédito e financiamento. Sendo assim, as condições de pagamento de alunos de baixa e média renda são limitadas.
“Quando o crédito está muito alto, a uma taxa de juros mais elevada, consequentemente há mais dificuldade no pagamento, evasão, desistência, problema na captação. Então, tudo isso é ruim para as empresas”, enfatizou Monteiro.
“Sem contar que estamos falando de empresas que estão alavancadas, empresas de educação no geral, umas mais do que outras”, sinalizou.
A última decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) não foi favorável à redução da Selic (taxa básica de juros), nem indicou quando isso pode acontecer. Ao contrário, abriu espaço para interpretações de uma possível alta.