O mercado espera que pelo menos mais 20 ofertas de ações, incluindo IPOs (ofertas públicas de ações) e follow-ons (ofertas subsequentes de ações), aconteçam ainda neste ano, mesmo diante do cenário de incertezas políticas e fiscais no ambiente doméstico.
Apesar de o mercado ter se mostrado mais sensível aos ruídos das últimas semanas, a tendência, segundo analistas, é que os investidores sejam mais racionais ao longo do tempo e recebam bem as novas ofertas de ações.
“Ainda temos um cenário propício para IPOs no Brasil, e as expectativas continuam positivas. Já tivemos algo próximo de 70 ofertas de ações neste ano e acreditamos ter pelo menos mais 20 ou 30 acontecendo até o final do ano e provavelmente com viés de alta, possivelmente chegando a 100 operações”, afirmou o codiretor de cobertura do Itaú BBA, Pedro Garcia.
Segundo o executivo, ainda existem duas janelas de oportunidade para que essas ofertas aconteçam ainda neste ano. A primeira deve ocorrer entre o final de agosto e o início de outubro, enquanto a outra deve acontecer entre meados de novembro e dezembro, aproveitando a divulgação dos resultados do terceiro trimestre.
Para o analista da Suno Research, João Daronco, a maior aversão ao risco observada no mercado doméstico ainda pode atrapalhar a entrada dessas empresas na Bolsa -trazendo possíveis cancelamentos dos planos de IPOs ou adiamento para uma nova janela de oportunidade.
“Estamos em um período um pouco maior de aversão ao risco, com alguns estresses internacionais, econômicos e políticos. O mercado tem se mostrado mais emocional nesse sentido, e não acho que seja incomum que algumas empresas considerem cancelar ou adiar suas ofertas para momentos mais favoráveis”, afirmou Daronco.
“Mas, como tudo na vida, o mercado é cíclico, e espero que até o final do ano essa emoção mude para algo mais racional. É difícil falar quando vai mudar, mas é difícil ter mais quatro meses de pessimismo da mesma forma que temos hoje”, completou.
O ambiente doméstico difícil também tem influenciado no desempenho das ações das empresas que abriram capital ao longo deste ano.
Levantamento feito pela Economatica aponta que, das 45 ofertas públicas iniciais de 2021, pelo menos metade dos ativos apresenta um retorno inferior ao do Ibovespa (principal índice acionário no país).
De acordo com Garcia a maior parte desse movimento veio na semana passada, quando a Bolsa, influenciada pelo noticiário internacional intenso e as crescentes preocupações em relação ao cenário político e fiscal no âmbito doméstico, reverteu o sinal positivo que vinha ao longo do ano.
Apesar de ter encerrado a sessão de sexta-feira (20) em alta de 0,76%, aos 118.052 pontos, o Ibovespa terminou a semana com perdas acumuladas de 2,59%. No ano, a queda é de 0,81% -até a semana anterior, o índice acumulava um ganho de 1,83% em 2021.
“Vimos quedas bastante expressivas, e um pouco da impressão que temos é que o investidor começou a buscar papéis mais líquidos. E as ações de IPOs, que normalmente possuem liquidez menor, sofreram bastante. Mas a nossa percepção é que esse seja um cenário muito mais temporário do que estrutural e acreditamos que o mercado deva demonstrar uma recuperação em breve”, afirmou Garcia.
Os analistas entrevistados pela reportagem afirmam, ainda, que é preciso uma análise mais aprofundada e pensamento de longo prazo por parte dos investidores que quiserem alocar recursos nas novas ofertas.
“É preciso entender qual a motivação do IPO e saber se ele faz ou não sentido. Alguns acontecem apenas para que um sócio saia, e outros vem porque a empresa quer aproveitar uma oportunidade de mercado e não tem capital. Além disso, é importante também avaliar se a empresa tem um modelo de negócio provado”, afirmou Daronco.
Segundo o analista, as empresas que têm um modelo de negócio provado possuem um histórico maior de operação ou atuam de maneira parecida à de outras companhias do setor. Além disso, também têm um plano bem estruturado para a abertura de capital, com uma clara e detalhada destinação de recursos.
A maioria das empresas que abriram capital neste ano afirmou em seus prospectos (relatório que detalha informações da companhia e da oferta em si) que o destino que planejavam dar aos recursos captados na Bolsa era o investimento em crescimento orgânico e inorgânico, este último via fusões e aquisições.
Entre os demais pontos importantes para o investidor que quer entrar em um IPO, os especialistas afirmam a necessidade de ver os documentos da oferta, como o formulário de referência e o prospecto, além de entender o setor e planejar investimentos de mais longo prazo.
O investidor também precisa estar ciente dos riscos envolvidos, tanto por parte da empresa e dos setores (informação que pode ser encontrada no prospecto) como em relação ao próprio mercado de capitais.
Daronco afirma, ainda, que é interessante que o investidor saiba quem são os diretores e sócios da companhia, uma vez que a gestão de negócio é o que mais define o que agrega ou não para que a empresa tenha uma boa entrega operacional.
“Eu também diria para não medir o resultado de um IPO em relação ao desempenho de curto prazo da ação. O mercado é sensível muitas vezes, mas a longo prazo tende a ser racional e as boas companhias tendem a se provar”, afirmou o analista.
“Se eu investi em uma empresa cujo modelo de negócio eu entendi, vi que o IPO faz sentido para ela e paguei um preço nos papéis, as quedas do mercado não afetam a minha visão, mas representam oportunidades de comprar ainda mais ações. O investidor precisa colocar dinheiro em empresas nas quais acredita.”
Os investidores que quiserem participar das ofertas que serão lançadas precisarão ter conta em um banco ou corretora -é por meio do home broker que o cliente costuma receber a mensagem sobre um novo IPO.
O prospecto pode ser encontrado no site da B3, a Bolsa brasileira, e, segundo analistas, é importante que o investidor leia esse documento antes de tomar a decisão de investir na oferta.
Para participar, o investidor precisará acessar o home broker e fazer uma reserva de compra, na qual preenche o quanto deseja gastar com a oferta, o preço máximo que pretende pagar por ação ou cota e informando se é um investidor vinculado -que tem algum vínculo profissional com a empresa ou com as instituições financeiras participantes.
Apenas não adquirirão ações pela oferta aqueles investidores que definiram um preço máximo inferior ao valor definido no bookbuilding -processo usado para definir o preço justo de uma ação.
É por meio dele que os investidores institucionais sugerem a quantidade de ações que querem comprar e a que valor. Com isso, a companhia consegue sentir a receptividade do mercado para a oferta e fixar uma quantia condizente com as expectativas do mercado.