
Os quatro anos de seca de ofertas públicas iniciais de ações (IPOs) somados ao fechamento de capitais de empresas e a recompra de ações provocou a negociação em massa de ações brasileiras na Nyse (Bolsa de Nova York), que tem se aproximado cada vez mais do volume total da B3 (bolsa brasileira).
A pedido do portal NeoFeed, a consultoria Elos Ayta, de Einar Rivero, calculou qual é o volume de ADRs e ações listadas diretamente nos EUA. O resultado mostrou que empresas brasileiras movimentam em média, US$2,19 bilhões por dia nas bolsas americanas. Esse montante equivale a 65,6% de todo o volume das mais de 400 ações efetivamente negociada na bolsa de valores de São Paulo. Em 2020, essa relação era de 29%.
JBS: A última nacional a entrar na Nyse
A tendência é que esse número continue em ascensão. A exemplo é o que vem acontecendo com a gigante processadora de alimentos brasileira, a JBS, que foi a última a fazer esse movimento em direção ao mercado norte-americano, após aprovação de sua listagem há duas semanas.
Em poucos dias de negociação na Nyse, os papéis da empresa alimentícia têm movimentado US$107,4 milhões por dia nos EUA. Isso significa 51% acima do que as ações vinham girando na bolsa do Brasil.
Além da maior visibilidade internacional, a expectativa é de que a migração traga valuations mais favoráveis à JBS, em linha com seus pares americanos – só em volume de negociação, a Tyson Foods movimenta perto de US$2,8 bilhões por dia.
No Investor Day em em Nova York, a JBS mostrou seu potencial de valorização do negócio nos próximos anos. A convergência do múltiplo atual para a média dos concorrentes aumentaria seu valor de mercado em até 150% ou US$25 bilhões. Com as fusões que a companhia pretende fechar nos próximos anos, a valorização pode chegar até 300% em cinco anos.
Nubank, pioneiro nessa caminhada
Um grande símbolo dessa busca pelo investidor internacional, o Nubank optou pelo mercado americano com uma dupla listagem em seu IPO, em 2021. Menos de um ano depois, deixou a B3, mantendo somente BDRs não patrocinados no Brasil, assim como empresas estrangeiras são negociadas no Brasil.
A estratégia deu certo: o banco digital se tornou não apenas a mais valiosa entre as brasileiras, como também a mais negociada.
Só na Nyse, o Nubank tem girado US$ 629,3 milhões por dia, superando todo o volume somado das ações e ADRs da Vale, por exemplo.
“Há uma demanda, principalmente, por empresas de tecnologia nos EUA. É o setor mais quente da América nos últimos 15 anos. Então, é natural a abertura de capital no exterior”, diz Luiz Fernando Araújo, CEO da gestora Finacap.
As negociações na B3 caem vertiginosamente
Na contramão desse movimento, o volume de negociações na B3 tem caído gradativamente desde 2021, quando atingia R$34,38 bilhões por dia. Desde então, o giro médio recuou 33%, para R$19,2 bilhões. E, no acumulado do ano, está no menor nível desde 2019.
Até mesmo as gigantes da Ibovespa viram seu fluxo migrar para os EUA: Vale, Petrobras e Itaí já são mais negociadas nos EUA do que no Brasil.
Desde 2023, a Vale – ação mais negociada da B3 – perdeu, em dólar, 35,6% de volume na bolsa brasileira e a Petrobras, 31,7%. Já as ADRs dessas empresas tiveram perdas bem mais limitadas: 1,3% no caso da mineradora e 11,6% na petrolífera.
Movimento semelhante ocorreu com o Itaú: enquanto as ações caíram 15% na B3, as ADRs cresceram 37%. Com isso, as negociações do Itaú nos EUA superaram em 10% as no Brasil.
Minoria dentro de casa
Com os juros no maior patamar desde 2006 e com a perspectiva de permanecerem altos por mais tempo, os fundos de ações têm registrado neste ano o maior volume de resgates da série histórica da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais), iniciada em 2006.
Apenas nos primeiros seis meses deste ano, a saída líquida soma R$39,13 bilhões, superior aos R$38,8 bilhões, total resgatado nos últimos três anos.
“Houve uma alta de juros muito grande desde 2021 e isso afastou o investidor da bolsa. Tanto a pessoa física quanto os institucionais, que estavam alocados, migraram para a renda fixa”, diz Gustavo Gomes, head da mesa de ações e derivativos da Aqcua Vero.
Na B3, o investidor estrangeiro passou a dominar o mercado. Segundo a bolsa, eles responder por 59% do volume de negociação, contra 45% em 2019.
Nesse cenário, empresas com forte apelo entre os investidores pessoa física viram seu volume encolher drasticamente nos últimos anos. Em alguns casos, a queda foi tão intensa que analistas suspenderam suas análises, e os papéis passaram a sofrer grandes variações diárias por conta de ordens pontuais de compra e venda, afastando o investidor institucional.
Empresas como: Oi, IMC, Alpargatas, Taurus, Petz, Enjoei e Locaweb sofreram reduções superior a 75% no volume negociado nos últimos três anos. Companhias que entraram em recuperação judicial nesse período sofreram um abandono pelo mercado, como Gol e Americanas, cujas negociações caíram para menos de 10% do volume histórico.