Moedas Globais

Dólar: ‘mau tempo’ assola desempenho das moedas emergentes

O mercado financeiro tem se preocupado com a valorização do dólar sobre o real, mas o Brasil não é o único emergente prejudicado pelo cenário

Foto: pexels
Foto: pexels

No mercado de câmbio, o dólar tem se projetado como uma pesada nuvem de chuva sobre as moedas de países emergentes, impedindo seu crescimento. Mesmo em nações nas quais as Bolsas de Valores tiveram os melhores resultados do mundo no primeiro semestre, como é o caso da Argentina e Turquia.

O mercado financeiro tem se preocupado com a valorização do dólar sobre o real, visto que a moeda brasileira entrou em estado de deterioração desde o início deste ano. Mas no panorama geral, o Brasil não é o único emergente prejudicado pelo “mal tempo”.

Entre os pares da América Latina a moeda nacional teve a 2ª pior desvalorização, atrás apenas do peso argentino, posição que não mudou em quadro mais extenso considerando outros dos principais países emergentes do mundo.

No entanto, na última semana o real demonstrou uma reação contra o dólar e especialistas indicam que uma recuperação é possível, mas depende de variados fatores que pesam sobre as moedas emergentes. 

Confira a valorização do dólar frente às principais moedas emergentes do mundo no 1S24

América Latina

PaísValorização
Brasil12,50%
México6,69%
Chile6,68%
Argentina13,18%
Colômbia 5,37%
Bolívia0,15%
Paraguai3,58%
Uruguai2,35%
Fonte: TradingView 
Levantamento do BP Money do ínicio do ano até o dia 05/07

No caso da Argentina, que, conforme indicado por levantamento anterior do BP Money, teve a bolsa mais valorizada do 1S24, o chefe-estrategista do grupo Laatus, Jefferson Laatus, explicou que o país passou por uma série de mudanças, desde a posse do presidente Javier Milei, que animou o mercado.

“O Milei veio com vários pacotes de austeridade, pacotes de corte gastos, volta do trabalho remoto, cancelamento de obras, uma série de coisas que diminuiu o custo da máquina pública argentina. Junto com isso, fizeram modificações na economia, com projetos que, de certa forma, vão fazer com que a economia acelere novamente e tudo isso acaba atraindo investidores. Mas a Bolsa argentina está super descontada”, disse.

Países de outras regiões

PaísValorização
China2,27%
Rússia-1,50%
Indonésia5,62%
Turquia10,57%
Coreia do Sul6,47%
Arábia Saudita0,10%
índia0,42%
África do Sul-0,85%
Singapura2,23%
Fonte: TradingView 
Levantamento do BP Money do ínicio do ano até o dia 05/07

O quadro da Turquia não difere do argentino, pois sua Bolsa também está descontada, e qualquer melhora econômica ou fiscal anima o mercado. Segundo Laatus, as altas nesses locais ocorreram “em cima de nada”, dados os preços desvalorizados.

“Na Turquia também houve a movimentação de troca de presidente do Banco Central e alterações nas taxas de juros, isso ajudou a valorizar bastante a bolsa turca. Mas vale lembrar que a moeda turca é uma das mais desvalorizadas no ano também, então não é uma melhora econômica, é uma melhora pontual em cima de alguns fatores”, 

Na América Latina, as nações sofrem com economias desequilibradas, mesmo que não seja o caso do Brasil em 100%, porém os investidores querem mercados mais seguros, como os EUA se apresenta.

“Países da América Latina  outros emergentes sofrem um pouco mais porque a economia depende muito de produtos importados”, afirmou o professor de Economia da Universidade Anhembi Morumbi, Rodrigo Simões.

Na dinâmica econômica, as moedas desvalorizadas levam a uma reação inflacionária em cadeia, seja ela produtiva ou de consumo, por conta do repasse dos preços. 

Países do Brics: China decepciona em crescimento e Rússia se aproveita de commodities

Como mostrou a tabela, o mercado cambial na África do Sul foi um dos únicos entre os emergentes a despontar uma alta frente ao dólar no primeiro semestre, mesmo que em leve proporção.

Já a China, cujo movimento econômico influencia todos os pares emergentes, não está crescendo, disse Laatus.

“Há praticamente dois anos esperamos que a China faça novos estímulos para que volte a crescer a sua economia e não vemos isso acontecer. O país cresceu 5% no ano passado e a meta é crescer 5% este ano”, comentou.

A China está “crescendo sem grande avanço”, visto que seus setores fortes como o de serviços, varejo, industrial e imobiliário estão enfraquecidos. Este último estando, na verdade, “destruído, combalido”, prosseguiu a análise do chefe-estrategista da Laatus.

Ao passo que a China tenta desarmar a tempestade que se formou sobre sua economia e dá passos curtos à uma solução, a Rússia empregou esforços na manipulação da moeda, de acordo com Laatus.

No contexto, desde o ínicio da guerra contra a Ucrânia, o país tem enfrentado diversas sanções de nações do ocidente, sobretudo dos EUA, ao seu comércio. Mas os movimentos do Banco Central mantiveram a moeda valorizada desde então.  

“Vale lembrar que a economia russa cresceu mais de 5%. O movimento vem crescendo fortemente por causa das commodities. Os movimentos de commodities são sempre positivos para a Rússia e quanto mais caro as commodities estão, mais dinheiro o páis ganha. Apesar da Rússia não poder vender o seu petróleo e o seu gás para países do ocidente, ele consegue vender para países do oriente, com um certo desconto e vende muito”, frisou.

Por fim, no Brasil a turbulência fica por conta da perspectiva cada vez mais forte com o risco fiscal, com o governo caminhando para um aperto dos gastos públicos e dificuldades de cumprir o orçamento estipulado para este ano. 

Segundo Simões, a falha na comunicação do governo Lula com o mercado financeiro é um dos problemas que tem deteriorado o real.

“Nos últimos dias, a comunicação do governo em relação ao mercado melhorou, dizendo: ‘não iremos extrapolar os gastos, mas nós precisamos fazer gastos, precisamos fazer investimentos, mas também iremos correr do outro lado com uma maior arrecadação de receita’”, disse ele.

O professor reiterou a visão de especialistas do mercado, inclusive dos economistas consultados para o Boletim Focus do BC (Banco Central), que preveem o dólar seguindo a uma cotação acima de R$ 5 para 2024 e 2025.