‘Vassoura-de-bruxa’ varreu a commodity

Cacau não voltará ao 'protagonismo' no Brasil, dizem analistas

O Brasil chegou a ser um dos maiores produtores de cacau antes da “vassoura-de-bruxa”. Até 2021, a produção do país respondia a 4% da global.

Cacau não voltará ao 'protagonismo' no Brasil, dizem analistas

A época mais doce do ano foi permeada pelo amargor dos preços, devido aos elevados custos do cacau. A commodity, que já teve sua era de ouro no Brasil, agora atrai os olhos de investidores e levanta a questão: haverá uma retomada da alta produção?

O país já foi um grande produtor de cacau, mas atualmente, esse título está com a Costa do Marfim e Gana.

Segundo especialista, o Brasil pode ser visto como um bom exportador da commodity, mas seus níveis ainda estão bem abaixo dos patamares internacionais.

“Em 2023, nossas exportações totalizaram apenas 455 toneladas, contra mais de 2 milhões da Costa do Marfim e 1 milhão de Gana”, explicou ao BPMoney Alê Delara, Sócio Diretor da Pine Agronegócio.

No início de 2023, o mercado sentiu os efeitos dessa pouca produção, com a elevação constante nos preços. Delara acredita que este ano também será um período de baixa oferta da commodity.

“Este ano será o quarto consecutivo com déficit na oferta de cacau, sendo o pior deste período; o principal fator para as quebras de safra foram as condições climáticas, que deixaram o clima muito seco e quente, abortando as floradas dos cacaueiros, reduzindo a produtividade”, disse o executivo.

Em seu entendimento, o vento seco acabou trazendo muita poeira do deserto do Saara. Isso prejudica a chamada “florada”, trazendo uma certeza sobre a baixa oferta no Brasil na temporada intermediária que começará em maio.

Nesse mesmo sentido, no início de 2022, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação publicou um estudo apontando que as mudanças climáticas podem reduzir e reconfigurar o cultivo de cacau na Amazônia brasileira até 2050.

Também nessa perspectiva, o analista da Benndorf Research, João Lucas Tonello, acredita que a commodity não deve voltar a ser “protagonista” no país.

“Aconteceu momentaneamente que a Costa do Marfim interrompeu a venda de contratos de exportação de cacau para a temporada corrente devido às chuvas que acabaram estragando a plantação por inundação”, explica Tonello, em relação à baixa oferta do exterior na Páscoa de 2024.

‘Vassoura-de-bruxa’ varreu o cacau brasileiro

A “vassoura-de-bruxa” assolou a Bahia no início dos anos 90 e destruiu as plantações de cacau da região, levando diversos produtores e donos de fazendas à falência.

“A vassoura-de-bruxa apareceu muito em áreas tradicionais, em locais muito úmidos, como a Mata Atlântica e a Mata Amazônica no Pará, e também na Mata Atlântica na Bahia”, comentou o CEO da Fruticultura do Grupo Schmidt Agrícola, Moisés Schmidt.

Segundo a Fiocruz, até meados da década de 20, o país era o maior produtor de cacau do mundo. No fim dos anos 80, o Brasil ainda ocupava o segundo lugar, ficando atrás somente da Costa do Marfim, no continente africano.

Até 2021, o Brasil contribuía apenas com 4% da produção mundial, ficando em quinto lugar no patamar global.

A queda na produção e a elevação do consumo fizeram o país, a partir de 1988, não conseguir nem mesmo atender à demanda interna de consumo. Esse cenário fez o Brasil deixar de ser um forte exportador para se tornar um importador.

Além disso, o contexto atual segue desfavorável para a produção brasileira.

“Temos outro cenário que aparece no Brasil há pouco tempo e que amedronta muito o produtor de cacau, que é a Monilíase, outra doença que parece muito forte e que tende a atacar áreas mais úmidas, com clima mais ameno”, acrescentou Schmidt.

“A Monilíase é uma doença do cacaueiro e do cupuaçuzeiro, causada pelo fungo Moniliophthora roreri, que ataca diretamente o fruto em qualquer fase do seu desenvolvimento”, explicou o Ministério da Agricultura e Pecuária em nota técnica.

Plantio a céu aberto pode atrair investimentos

“Até a década de 2020, o cacau no Brasil era produzido de uma maneira um pouco arcaica, trazido nos anos 50”, explicou Moisés Schmidt, CEO da Fruticultura do Grupo Schmidt Agrícola.

Desta forma, ele também acrescentou que a nova demanda do cacau e cultura, e o mercado aquecido, faz os produtores focarem em implementar mais tecnológica.

O plantio de cacau a céu aberto é um método que tem ganhado cada vez mais adeptos, mediante o uso de mudas mais resistentes.

“O problema é que este sistema tem um custo maior devido à necessidade de mais uso de fertilizantes, defensivos e, a depender da região, irrigação”, pontuou Alê Delara, sócio-diretor da Pine Agronegócio.

Contudo, João Lucas Tonello, analista da Benndorf Research, sinaliza que a modalidade de plantio pode atrair injeção de capital para o setor.

“Atrairá investimentos para o setor de forma controlada, mas a diferenciação de preço está acontecendo por choque de oferta e demanda da Costa do Marfim”, disse.

Em relação à Costa do Marfim, a região está sentindo um déficit na oferta.

Informações da “Bloomberg” apontam que no início de abril de 2024, o Conselho Cacau-Café, ligado ao governo do país, solicitou que os compradores da commodity esperem até a próxima colheita da safra intermediária para receberem aproximadamente 130 mil de amêndoas negociadas.

O problema da produção de cacau, além de afetar a Costa do Marfim, tem afetado outros produtores como Gana, também no continente africano.

Em meio à fraca oferta e alta demanda, o preço do cacau tem apresentado altas constantes. Na quinta-feira (10), os contratos futuros da commodity chegaram a ter alta de 2,94%, cotada a US$ 10.539,50 na bolsa de Nova York.

Mesmo com mais tecnologia e mecanização na produção de cacau no Brasil, investidores podem pender por injetar capital em regiões com produção mais consolidada.