Pós recorde histórico

Dólar quase R$ 6: exportadores ganham, mas danos se alastram na Bolsa

Após o marco histórico do dólar sobre o real, os papéis de exportadores são os que tem a ganhar, mas o destino da Bolsa é um mais espinhoso

Dólar/Foto: CanvaPro
Dólar/Foto: CanvaPro

O mercado financeiro brasileiro viveu momentos históricos na quinta-feira (28), quando o dólar bateu a marca inédita de R$ 6. O número foi mais um no quadro quase inteiramente vermelho que se tornou o Ibovespa na sessão, menos pelos papéis de exportadores, que tendem a ser aqueles a ganhar nesse cenário.

O recorde do dólar, que é extremamente negativo para a economia nacional, reflete a corrosão do resquício de confiança que os investidores tinham no compromisso do governo em criar uma limitação para o crescimento das despesas. 

O analista de ações da Skopos Investimentos, Pietro Tortoreli, explicou ser difícil, no momento, visualizar gatilhos positivos ou alguma valorização expressiva do real até o final do ano.

“Nesse sentido, uma característica importante das empresas exportadoras é a proteção a eventuais desvalorizações da moeda, visto que estas possuem receita dolarizada”, afirmou.

Companhias como a Vale (VALE3), Suzano (SUZB4) e Klabin (KLBN4), cujos produtos são cotados e negociados em dólar, deverão ser os beneficiários do ritmo imposto ao câmbio, “oferecendo certa proteção aos investidores”.

Já na visão de Jeff Patzlaff, especialista em mercado de capitais e Planejador Financeiro CFP, uma exposição a setores como o Agro (que se beneficia do dólar mais alto), neste momento pode permitir lucros adicionais nas carteiras. 

As avaliações se confirmam pelo fato de exportadores como a JBS (JBSS3), Suzano (SUZB4) e SLC Agrícola (SLCE3) terem fechado com as maiores altas da sessão de véspera, enquanto a maioria dos papéis recuaram. 

Acompanhando a moeda brasileira em seu pior momento, o Ibovespa também teve um grande retrocesso a níveis não vistos há mais de 4 meses, caindo 2,40% no fim do pregão, aos 124.610 pontos.

Tortoreli reiterou ainda, que as empresas brasileiras desses segmentos também têm a seu favor a competitividade global.

“Independente do desarranjo da economia local, as vantagens competitivas em seus devidos setores permanecem intactas. No ramo da mineração e do agronegócio, incluindo a indústria de papel e celulose, as empresas brasileiras são líderes globais reconhecidas”, frisou.

Com dólar disparado, Vale (VALE3) e Petrobras (PETR4) podem segurar o Ibovespa?

Os investidores e agentes do mercado financeiro estão sempre de olho nas duas ações de maior peso do Ibovespa: Petrobras e Vale. Diariamente elas costumam virar a balança para o lado em que estão pendendo, mas o fato de ganharem em dólar, segundo os analistas, ainda não é suficiente para segurar a prevista piora da Bolsa.

No caso da Vale principalmente, ainda que sua valorização esteja atrelada ao desempenho do minério de ferro, com dólar em forte alta é esperado um aumento nas receitas.

Patzlaff acrescentou que o fato da mineradora ter influência do governo pode ampliar ainda mais sua participação no principal índice acionário brasileiro.

Já no outro lado, Tortoreli afirmou que mesmo adotando uma política de preços com bandas mais flexíveis, a Petrobras ainda se vê fortemente influenciada pelos preços internacionais do petróleo, que tem se mantido estáveis ultimamente, evitando reajustes nos valores dos combustíveis.

“Neste contexto, não se observa, por enquanto, a necessidade de elevação no preço de venda desses derivados, utilizando como referência, o preço de paridade de importação destes produtos está defasado em torno de 8%, o que ainda não demanda tal reajuste”, disse.

Varejo

Um dos setores da Bolsa mais sensíveis aos indicadores econômicos, que, portanto, sofre muito com o dólar alto, é o varejo. Isto porque, a moeda estrangeira pressiona a inflação, ao passo que os insumos comprados pelo mercado brasileiro, sobretudo o de consumo, ficam mais caros. 

“Acredito que as vendas com a Black Friday serão apagadas com esta alta do dólar nos resultados do Varejo de forma geral”, disse Patzlaff.

As vendas podem ficar bem se o dólar cair, hipótese que o especialista reforçou não acreditar. “No cenário principal, não vejo com bons olhos os resultados previstos para o varejo em 2024”, finalizou.

Além disso, essa perspectiva de inflação mais pressionada, já ronda também às estimativas para a próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), outro tópico sensível para o varejo, que perde com os juros altos e dificuldade de acesso ao crédito pelos consumidores.

“Devemos ver uma atuação mais forte ainda do BC com relação à elevação da taxa Selic, buscando conter a inflação. Neste momento, os preços de mercado indicam uma taxa Selic acima de 14% até a metade do ano que vem, um patamar que não vemos desde 2015”, projetou Tortoreli.