Investidores de todo o mundo acenderam um alerta quando o banco Citi, um dos maiores dos EUA, rebaixou, em 10 de março, sua recomendação de investimentos no país norte-americano para neutra. Indo além, também elevou a indicação de ativos chineses para overweight, ou seja, de compra.
Ainda há muito a acontecer e é cedo para entender plenamente os impactos das políticas do presidente Donald Trump, o que faz o próprio banco admitir que sua nova visão ainda não está completamente implementada. Mas, para o Citi, há sinais cada vez mais claros de que a hegemonia dos EUA “está pausando”.
A alta volatilidade nas bolsas norte-americanas em razão das incertezas sobre a política tarifária também aumenta receios de investidores sobre os EUA. Mesmo assim, analistas brasileiros mostram ceticismo para investimentos na China e outros mercados emergentes em substituição aos ativos americanos, considerando essas opções mais interessantes para complementar os investimentos no país norte-americano.
Para Sidney Lima, da Ouro Preto Investimentos, avaliações como a do Citi estão fundamentadas na busca por diversificação e pela recuperação econômica chinesa, que vem apresentando sinais de retomada após um período de menor crescimento.
“Investir na China pode trazer oportunidades de rendimento superiores, mas também envolve maior volatilidade, sendo indicado para quem tem um perfil de risco mais ousado“, comenta Lima.
A China tem um mercado grande e em crescimento, com setores atraentes como tecnologia, consumo interno e energias renováveis, destaca o sócio-fundador da Septem Capital, Frederico Avril. Para ele, isto leva uma parte dos bancos a verem oportunidades mais atraentes no país asiático, após as desvalorizações recentes em mercados desenvolvidos.
Por outro lado, o país traz riscos geopolíticos, relacionados às tensões com os EUA, e de intervenções governamentais no mercado, como regulações nos setores de tecnologia e imobiliário, além de uma tendência a menor liquidez, falta de transparência e maior flutuação cambial, em relação a países desenvolvidos.
Como investir na China e em outros mercados emergentes?
Diversificação
Para o sócio-fundador da Septem Capital, Frederico Avril, apostar na China e outros países em desenvolvimento é ideal para aqueles que buscam investimentos de longo prazo (de cinco anos ou mais) e que sejam tolerantes à volatilidade, já que países emergentes podem sofrer quedas bruscas.
Também é recomendado que esses investidores já tenham uma base de ativos em mercados desenvolvidos, como nos EUA e Europa. Assim, Avril sugere que seja feita uma alocação complementar no país asiático, de 5% a 15% da carteira, a partir de uma análise cuidadosa de onde investir. Outra opção é fazer investimentos de 10% a 20% da carteira em países emergentes (não só a China).
“A diversificação internacional permanece como estratégia fundamental para a construção de portfólios robustos, devendo ser implementada de forma alinhada aos objetivos financeiros específicos de cada perfil de investimento”, comenta o delegado do Corecon-SP (Conselho Regional de Economia do Estado de São Paulo) Adenauer Rockenmeyer.
Como começar a investir?
Para investir no exterior, é preciso primeiramente abrir uma conta em um banco ou corretora que ofereça investimentos internacionais.
Depois disso, há algumas opções, como os ETFs (Exchange Traded Funds), também chamados de Fundos de Índice, com uma carteira de ações que tem como objetivo replicar a rentabilidade de um determinado índice de referência. Alguns exemplos são o EM (MSCI Emerging Markets) e o FXI (iShares China Large-Cap).
O investidor também pode buscar outros tipos de fundos que foquem em emergentes ou na China, como o Capital Emerging Markets e o Templeton Asian Growth.
Outra possibilidade são os BDRs (Brazilian Depositary Receipts), certificados de depósito de valores mobiliários que representam ações de empresas estrangeiras. No Brasil, há opções de BDRs de empresas chinesas como a Alibaba e Tencent que estão listados na B3. Mas, ao investir nessas opções, Avril alerta que é importante verificar tributações e riscos cambiais.
O que considerar ao escolher uma opção de investimento
- Tipos de ações que compõem a carteira de um fundo
Para escolher uma opção de fundo, é preciso verificar se ele investe em ações offshore ou locais, pois há riscos diferentes para cada uma delas.
As ações offshore são aquelas pertencentes a empresas que estão listadas em outros países, como as H-shares, de chinesas listadas em Hong Kong, e os ADRs, que representam ações de empresas estrangeiras negociadas nos EUA.
Enquanto isso, as locais são aquelas negociadas em seu país de origem (como as empresas chinesas negociadas nas bolsas de Xangai e Shenzhen).
Sidney Lima, da Ouro Preto Investimentos, também destaca é importante verificar se o fundo em questão privilegia grandes empresas chinesas de tecnologia e e-commerce ou se busca companhias de médio porte mais expostas ao consumo interno.
“Isto pode ajudar a identificar o nível de risco, pois cada abordagem sofre influências distintas do cenário econômico e regulatório local”, afirma o analista.
Outro ponto a se observar é a diversificação desses fundos, de forma a escolher opções com mais empresas e setores e evitar concentração excessiva.
- Gestão do fundo
Avril recomenda que a taxa de administração do fundo escolhido esteja abaixo de 1%. ETFs costumam ser mais baratos.
Também é preciso olhar para o histórico do fundo, em termos de consistência de retornos, comparando a opção avaliada com índices de referência, como o MSCI Emerging Markets, que acompanha o desempenho das bolsas de diversos países emergentes.
Também é preciso avaliar a experiência da equipe gestora do fundo e, para ETFs, a liquidez, verificando o volume de negociações.
“Antes de tudo, é importante analisar a reputação e o histórico da gestora, observando como o fundo se comportou em diferentes cenários de mercado”, resume Lima. A transparência na divulgação de relatórios e a solidez regulatória também são fatores que conferem maior segurança.
Outro ponto é a tributação. Nesse quesito, Avril destaca que fundos no exterior podem ser mais eficientes, como, por exemplo, ETFs irlandeses para residentes no Brasil.
Além disso, é fundamental verificar as estratégias de proteção cambial, qual a liquidez do investimento e a transparência na comunicação com investidores.
“Investir na China e em emergentes pode agregar diversificação e crescimento, mas exige seleção criteriosa e alinhamento com seu perfil. Comece com ETFs amplos e, se quiser exposição direta, utilize corretoras internacionais ou BDRs. Monitore riscos políticos e cambiais regularmente”, resume Avril.
Oportunidades recomendadas por analistas
Alguns analistas consultados pela reportagem recomendaram fundos que representam oportunidades interessantes, a depender do perfil de cada investidor. São eles:
- MCHI (iShares MSCI China), com foco em grandes empresas;
- KWEB (KraneShares CSI China Internet), para o setor de tecnologia e internet;
- ASHR (Xtrackers Harvest CSI 300 China A-Shares), para ações locais (A-shares).
Já considerando os fundos ativos, aqueles que procuram superar um índice de referência e costumam ser mais arriscados, Avril recomenda:
- CHFX (Matthews China Fund), de gestão ativa com histórico sólido;
- JCGI (JP Morgan China Growth & Income), focado em dividendos.
Alguns analistas defendem maior cautela
Diante dos riscos, também há especialistas que não acreditam que a China e outros mercados emergentes são atraentes para investimentos.
“Sempre digo que, se os EUA pegam um resfriado, os mercados emergentes ficam com pneumonia. Ou seja, a tendência é que sofram ainda mais. Por isso, considero arriscado migrar para esses mercados”, destaca o CEO da Boost Research, André Franco. Para ele, os EUA continuam sendo a opção mais segura no mercado estrangeiro.
Para o economista-chefe da Blue3 Investimentos, Roberto Simioni, se as promessas tarifárias de Trump forem cumpridas em sua totalidade, há riscos de que a China tenha uma queda de exportações, o que a levaria, necessariamente, a desvalorizar a moeda, para cumprir sua meta de crescimento.
Além disso, Franco considera que um dos pontos mais problemáticos sobre a China e outros mercados asiáticos é que eles carecem de transparência. “Em economias mais fechadas, como a chinesa, há dificuldades em comprovar números e obter informações concretas, o que aumenta significativamente o risco”, explica.
Dessa forma, Simioni acredita que uma alternativa (ou complemento) melhor aos EUA seria o mercado europeu, considerando mudanças políticas que estão ocorrendo agora e podem trazer bons resultados para a economia do continente nos próximos trimestres.