Decisão

Fundo fechado: Justiça fica a favor e ameaça arrecadação de R$ 24 bi 

Em decisão liminar, o fundo Kviv Participações conseguiu suspender cobrança retroativa de imposto de renda e abre espaço para outras gestoras obterem o mesmo na Justiça

Fundo fechado
Dinheiro / Foto: Pixabay

No ano passado, o governo federal projetou uma arrecadação de R$ 24 bilhões para o período de 2023 a 2026 com a implementação de uma nova lei que tributa fundos fechados e visa uniformizar a cobrança de impostos entre diferentes tipos de fundos.

Em dezembro, devido à opção pelo pagamento antecipado, a Receita Federal conseguiu arrecadar R$ 8 bilhões.

No entanto, a nova lei enfrenta contestações judiciais que podem resultar em uma disputa prolongada, potencialmente frustrando os planos do governo federal de aumentar a arrecadação por meio da taxação de grandes fortunas.

A principal questão é a cobrança sobre rendimentos acumulados antes da vigência da nova legislação.

Pela primeira vez, uma decisão judicial foi favorável a um Fundo de Investimento em Participações (FIP), estabelecendo um precedente que pode ser seguido por outras gestoras.

O NeoFeed obteve acesso à decisão liminar da 21ª Vara Cível Federal de São Paulo, que suspendeu a cobrança do imposto de renda sobre o fundo Kviv Participações.

O FIP da Kviv Ventures, especializada em investimentos ilíquidos, direciona recursos para empresas em estágio inicial por meio de venture capital e para empresas maiores por meio de search funds.

Entre seus investimentos estão empresas como Pet Anjo, Hand Talk e Moneta. De acordo com dados da CVM, o fundo administra mais de R$ 220 milhões e conta com apenas dois cotistas.

Na decisão, o juiz Paulo Cezar Neves Junior sustentou que a nova lei viola o princípio da anterioridade, que estabelece que tributos só podem ser cobrados a partir do ano seguinte à publicação da lei.

O magistrado também ressaltou que a norma infringe o princípio da irretroatividade, que proíbe a tributação sobre rendimentos ou ativos adquiridos antes da vigência da nova legislação.

Justiça a favor do fundo fechado

O juiz mencionou uma ação direta de inconstitucionalidade que aborda a cobrança antecipada de impostos para empresas coligadas estabelecidas no exterior. Esse caso gerou uma jurisprudência após o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar que a antecipação de impostos é inconstitucional.

“A decisão abre espaço para que outros FIPs entrem com recurso com base nela, o que esperamos que deva ocorrer. Assim como a União deve recorrer. Será um processo demorado que deverá chegar ao STF”, afirma Érico Pilatti, sócio do Cepeda Advogados, escritório responsável pela ação judicial, em entrevista ao NeoFeed.

O Kviv Participações efetuou o pagamento apenas da primeira das 24 parcelas estabelecidas e não fará o pagamento das demais enquanto a liminar estiver em vigor ou até que uma decisão judicial final favorável seja proferida. \O valor da causa, conforme consta no processo, é de aproximadamente R$ 7,5 milhões.

É crucial destacar que o mandado de segurança não aborda a questão dos pagamentos futuros referentes ao imposto de come-cotas semestrais.

O objetivo é apenas suspender a exigência de imposto sobre rendimentos acumulados antes da vigência da nova lei. Isso estabelece um precedente para que aqueles que já pagaram esse imposto, sejam pessoas físicas ou jurídicas, possam buscar judicialmente a restituição.

O que a lei mudou?

Antes da alteração legislativa, os fundos fechados eram tributados somente quando havia retirada de capital, seja por meio de amortização, resgate ou liquidação do fundo.

Esse regime permitia um diferimento tributário conforme previsto pela legislação, significando que não havia tributação sobre as operações realizadas pela carteira do fundo, mas apenas no momento do resgate ou liquidação.

A Lei 14.754 estabeleceu que, a partir de 2024, os rendimentos de investimentos em fundos fechados (como FIPs, ETFs e FIDCs) que não sejam classificados como entidades de investimentos serão sujeitos a uma tributação semestral (por meio de come-cotas) de 15% sobre os rendimentos acumulados na carteira, mesmo que esses rendimentos não tenham sido resgatados ou amortizados.

Além disso, a lei previu a cobrança de imposto sobre o estoque de rendimentos acumulados até o final de 2023, com o objetivo de tributar os ganhos já obtidos.

Para as pessoas físicas que possuem cotas, o governo ofereceu a opção de pagamento à vista com um desconto de 8% (dividido em quatro parcelas no início de 2024) ou, alternativamente, o recolhimento à alíquota de 15% até 31 de maio de 2024, podendo ser pago à vista ou em até 24 parcelas.

Como resultado, a maioria das pessoas físicas optou pelo pagamento com desconto.