Desde o início do ano, a Bolsa de Valores Brasileira tem registrado uma crescente saída dos investidores estrangeiros. A deterioração do quadro fiscal, somado às incertezas locais vêm se acumulando e gerando uma onda gradativa de retirada do capital externo do mercado de ações nacional.
O dado mais recente aponta que os investidores estrangeiros sacaram R$ 84,9 milhões em recursos no segmento secundário da B3 na última quinta-feira (13). Na véspera, quando o desconforto fiscal derrubou o Ibovespa e fez o dólar bater R$ 5,40, os investidores estrangeiros sacaram R$ 3,08 bilhões da B3.
Em um piscar de olhos, no acúmulo do mês de junho, ainda que em meados dele, houve saída de R$ 7,22 bilhões até o dia 12, revelando que o ritmo de fuga engatou a marcha de maior velocidade e segue disparado rumo a outros mercados mais atrativos fronteira afora.
Instabilidade fiscal e política
Iago Zandonadi, assessor de investimentos da SVN Investimentos, destacou ao BP Money a instabilidade fiscal e política como um grande fator para a saída de capital estrangeiro.
“A falta de articulação no Senado e na Câmara, além da incerteza no cumprimento de metas fiscais, são determinantes para a desconfiança dos investidores”, afirmou.
O economista mencionou o desalinhamento entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Lula, que resultou em uma revisão de gastos do arcabouço fiscal e aumento indireto da carga tributária.
De acordo com o especialista, esse cenário levou a um aumento nas curvas de juros futuros e na cotação do dólar, além de uma queda significativa no Ibovespa.
Zandonadi também citou a economia americana como um fator contribuinte, com a inflação ainda elevada e os juros sem cortes previstos até que a meta de 2% seja atingida.
O fortalecimento do dólar e o desempenho fraco do real também foram apontados como motivos para os investidores retirarem seus lucros do Brasil em busca de economias mais estáveis, como a dos EUA.
Interferência governamental e política econômica
André Colares, CEO da Smart House Investments, concorda com a visão de Zandonadi sobre a instabilidade fiscal e política, mas enfatiza a interferência governamental como um dos principais motivos para a saída dos investidores.
“A condução da política econômica pelo governo Lula, com intervenções em empresas estatais e privadas, tem afetado negativamente a confiança dos investidores”, comentou Colares.
O especialista destacou que a falta de cortes nas taxas de juros pelo Banco Central e a interferência do governo em empresas como Petrobras (PETR4), Vale (VALE3) e Eletrobras (ELET3) criam um ambiente de incerteza que afasta os investidores.
Colares também mencionou que investidores estrangeiros estão preferindo mercados com maior estabilidade, como Índia e Israel, devido ao seu desempenho positivo.
Segundo o economista a saída de capital estrangeiro aumenta a pressão sobre o câmbio, resultando na depreciação do real e contribuindo para a alta da inflação, dificultando o controle inflacionário pelo Banco Central.
Cenário externo
Em resposta à reportagem, Jefferson Laatus, estrategista-chefe da Laatus, menciona que o cenário internacional também contribui para essa fuga de capital.
A inflação persistente nos EUA e a expectativa de manutenção das altas taxas de juros por lá tornam os investimentos em mercados emergentes, como o Brasil, menos atraentes.
Laatus observou que os investidores estão preferindo destinos mais seguros e previsíveis, como ouro e títulos americanos. “Estamos em um movimento de ‘flight to quality’, por isso a bolsa americana continua batendo recordes, com dinheiro voltando para lá”, explicou.
Laatus também ressaltou que a fuga de capitais pressiona a alta do dólar, impactando negativamente a economia brasileira ao encarecer as importações e aumentar a inflação.
Como reconquistar confiança do mercado externo?
De acordo com o estrategista-chefe, a única maneira de reverter essa tendência seria o governo brasileiro adotar um plano claro e efetivo de corte de gastos, algo que ele considera improvável no atual cenário político.
Para reconquistar a confiança dos investidores estrangeiros, Zandonadi sugere uma melhor articulação política e maior rigidez com os gastos do governo, visando alinhar as medidas governamentais com as metas fiscais. Ele acredita que isso aumentará a confiança dos brasileiros e dos estrangeiros na economia.
Colares, por sua vez, enfatiza a necessidade de uma política econômica previsível e pró-mercado, evitando intervenções desnecessárias em empresas estatais e privadas. Ele destaca a importância de uma gestão fiscal responsável e de um ambiente de negócios favorável para atrair e reter investimentos estrangeiros.