Momento pessimista

Mercado de capitais enfrenta desafios sem IPOs desde 2022; entenda

Entre 2020 e 2021, 74 empresas movimentaram mais de R$ 109 bilhões com IPOs, incentivadas por Selic mais baixa

Mercado de capitais
Foto: Freepik

O mercado de capitais brasileiro vivenciou um “boom” de IPOs (ofertas iniciais de ações) em 2020 e 2021, quando 74 empresas abriram capital, movimentando mais de R$ 109 bilhões. Contudo, após esse período de grande entusiasmo, a janela de emissões se fechou, e de 2022 até o momento não houve novos IPOs.

O momento de otimismo foi impulsionado pela taxa Selic mais baixa e por uma expectativa de crescimento econômico, com apetite dos investidores, tanto nacionais quanto internacionais, por novos ativos.

Segundo Gustavo Vaz, sócio da VGRI, “a ausência de novas emissões desde 2022 não se explica apenas pelo contexto macroeconômico de altas taxas de juros, mas também pela percepção negativa deixada pelas performances decepcionantes das empresas que abriram capital no auge da pandemia”.

Aproximadamente 78,4% das empresas que realizaram IPOs nesse período apresentaram desvalorização nas ações. Além disso, 84,61% do valor total negociado envolveu ações que sofreram perdas, indicando que grande parte do capital investido também se desvalorizou.

Quando vista sob a ótica de investidores internacionais, a situação é ainda mais desafiadora, com uma desvalorização média ponderada das ações em dólar de cerca de 40%.

“Isso demonstra que a entrada de capital estrangeiro não foi suficiente para garantir o crescimento esperado, especialmente com a volatilidade cambial adicionando uma camada de risco”, acrescenta Gustavo Vaz.

Enquanto isso, os retornos da renda fixa no Brasil, com o CDI acumulando 38,6% de retorno entre janeiro de 2020 e setembro de 2024, tornaram-se uma alternativa mais atraente para muitos investidores, em comparação com a volatilidade e os riscos das ações.

“A diferença entre os retornos da renda fixa e da bolsa nos últimos anos é um dos principais fatores que sustentam a atual aversão ao risco dos investidores. Isso nos leva a questionar a viabilidade de novas emissões de ações no curto prazo”, destaca Gustavo.

Apesar do cenário atual, há sinais de que o mercado pode se recuperar. A expectativa de queda nas taxas de juros nos EUA e a estabilização das taxas no Brasil em níveis mais baixos, além de indicativos de crescimento econômico, podem criar um ambiente mais favorável para uma reabertura do mercado de capitais.

No entanto, Gustavo Vaz alerta que “o estigma deixado pelos IPOs de 2020 e 2021 ainda pesa sobre o mercado e será necessário um esforço coordenado para restaurar a confiança dos investidores”.

Para superar esses desafios, será preciso que as empresas que planejam abrir capital apresentem fundamentos sólidos, boa governança e planos de crescimento bem estruturados.

“O mercado precisa mostrar que aprendeu com os erros do passado e que está pronto para oferecer oportunidades mais transparentes e sustentáveis. Somente com uma mudança significativa na percepção de risco e com a apresentação de histórias de sucesso será possível reverter o estigma atual e reativar o acesso ao mercado de equity no Brasil”, conclui Gustavo Vaz.

IPOS no Brasil: apenas 16% de ações têm retorno positivo desde estreia

Diante de um cenário de juros altos e um ambiente econômico adverso, as empresas que realizaram IPOs têm enfrentado dificuldades em entregar retornos positivos. Dos 93 papéis de empresas que fizeram abertura de capital nos últimos dez anos, um total de 84 seguem listados na Bolsa de Valores e apenas 15 registraram desempenho positivo em relação ao preço fixado na oferta inicial de ações.

Os dados pertencem ao levantamento da assessoria financeira Seneca Evercore divulgado pela VEJA.

Segundo Régis Chinchila, head de research da Terra Investimentos, a alta taxa Selic, que há tempos se mantém elevada, exerce um forte impacto sobre o mercado de ações. A especialista destaca que os juros altos tornam a renda fixa uma alternativa mais atraente para os investidores, elevando o custo do capital. 

“Esse ambiente de juros altos afeta empresas mais vulneráveis, como as dos setores imobiliário, varejo e tecnologia, que têm mais dificuldade em se adaptar e entregar resultados,” afirma.

Além disso, a restrição de crédito reduz a demanda por produtos e serviços, impactando negativamente o desempenho das empresas e, consequentemente, o retorno de suas ações. 

Segundo Chinchila, esse cenário explica por que apenas 15 das 93 ações analisadas apresentam retorno positivo desde seus respectivos IPOs

“Muitas companhias não conseguiram se adaptar às condições econômicas desafiadoras e falharam em entregar seus projetos conforme o planejado.”