O tão aguardado pacote fiscal foi finalmente anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na quarta-feira (27) à noite, em rede nacional de TV e rádio. Dentre os vários pontos tocados pelo ministro, um dos que mais chamou a atenção do mercado e gerou um sentimento de desconfiança diz respeito ao imposto de renda (IR).
Haddad anunciou que o governo irá propôr isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil. “Uma parte importante da classe média que ganha até R$ 5 mil por mês não pagará mais imposto de renda”, declarou o ministro, acrescentando que a medida “não trará impacto fiscal, ou seja, não aumentará os gastos do governo”.
A isenção do IR até R$ 5 mil beneficiaria 36 milhões de contribuintes. Isso representa 78,2% do total de 46 milhões que declaram Imposto de Renda todos os anos, segundo a Unafisco (Associação Nacional de Auditores Fiscais da Receita Federal).
De acordo com o economista Maykon Douglas, embora haja “mérito” na discussão sobre o IR, anúncio deve deixar um gosto amargo no mercado, que desconfia dos efeitos positivos dessa isenção e aguarda mais detalhes sobre medidas compensatórias.
“Dado o contexto de estresses de mercado e o tempo apertado para resolver outras pautas, como Orçamento e reforma tributária, sobretudo, a parte “pró-superávit” desse arsenal de medidas poderia estar 100% explícita antes de o governo lançar no debate uma intenção de sentido contrário. Isso evitaria novas especulações indevidas; agora, são mais novas perguntas para se responder”, destacou Maykon.
Isenção do IR demanda compensação: quem vai pagar a conta?
Embora sem grandes detalhes, o governo já sinalizou que pretende compensar a perda de receita com medidas como a taxação de lucros e dividendos e a intensificação da fiscalização sobre empresas. De acordo com o jornal Folha de S.Paulo, a proposta deve envolver um IR mínimo de 10% para quem ganha mais de R$ 50 mil.
Na avaliação do advogado tributarista Waldir de Lara, fundador da LaraFy Consultoria, a isenção anunciada não é um alívio genuíno, mas uma redistribuição de encargos que deverá recair sobre empresários e a iniciativa privada.
“O empresário brasileiro, que já lida com uma das maiores cargas tributárias do mundo, pode estar prestes a enfrentar mais um golpe no seu caixa”, explicou Waldir.
Segundo o advogado, se por um lado a isenção parece um avanço, por outro, ela mascara uma política de estímulo ao consumo financiada pelo setor produtivo.
“Em vez de criar um ambiente de negócios mais favorável, o governo prefere usar os empresários como a “fábrica de compensação” para as renúncias fiscais. A promessa de alívio pode facilmente se tornar um peso, que irá refletir nos preços, na redução de investimentos e até mesmo em cortes de empregos”, completou.
Sidney Lima, Analista CNPI da Ouro Preto Investimentos, chama atenção ainda para a proposta de tributar fundos exclusivos e super-ricos, que, segundo ele, gera “incertezas”.
“Isso pode reduzir o apetite de investidores de alta renda, impactando o fluxo de capital para a bolsa e a entrada de investimento estrangeiro, afetando dolar e inflação”, pontuou Lima.
Além disso, o especialista avaliou que o estímulo ao consumo e os reajustes salariais com a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil podem gerar pressões inflacionárias, o que dificulta a manutenção da política monetária restritiva.