O cenário internacional, sobretudo os EUA, detém forte influência nas condições econômicas brasileiras. Pensando nisso, o Superintendente de Renda Variável da SulAmérica Investimentos, Gilberto Nagai, ouvido pelo BP Money, fez uma análise abrangente das incertezas que o mercado enfrentará em 2024.
Nagai ressalta a influência significativa dos EUA nas condições econômicas brasileiras, indicando que uma possível recessão norte-americana poderia afetar o Brasil devido às relações comerciais. Além disso, ele aborda as preocupações em relação às decisões do Federal Reserve (FED) sobre cortes de juros e a gestão fiscal no Brasil durante as eleições municipais, considerando como esses fatores podem impactar o mercado.
Nagai discute a perspectiva da SulAmérica Investimentos para o mercado de ações em 2024, destacando a possibilidade de um ano favorável para a Bolsa de Valores, especialmente se o Federal Reserve efetuar cortes de juros. Ele explica como a redução das taxas de juros pode impulsionar a economia, melhorar o resultado financeiro das empresas e atrair investidores para o mercado de ações. No entanto, ele ressalta a importância de considerar os riscos associados a eventos imprevisíveis que podem influenciar as condições de mercado.
Quando questionado sobre a estimativa da taxa Selic para 2024, Nagai indica a projeção da equipe de economia da SulAmérica Investimentos, indicando uma expectativa de queda para 9% até o final do ano. Ele destaca o impacto dessa redução nas condições de mercado, considerando a relação entre a Selic, o desempenho econômico e o comportamento dos investidores.
Quais são as incertezas do mercado em 2024?
Em primeiro lugar, temos que começar olhando para os EUA, nós temos a mania de olhar só para o Brasil, mas metade ou 60% do beta vem de fora, é muito difícil os EUA entrar em recessão, se for o caso, e o Brasil sair ileso. Até pelas relações intercomerciais. Então esse talvez seja o maior risco que nós da SulAmérica enxergamos, iniciou Nagai.
Se o Federal Reserve derrapar na condução, tem sempre essa discussão, do que porque ele está querendo já cortar os juros em março, se a atividade econômica está super forte. Então, será que nós não estamos enxergando, algo que o Fed está enxergando.
Em geral, tudo que faz a economia americana ter mais sensibilidade, afeta o Brasil.
No Brasil, a parte fiscal é muito importante, lembrando que neste ano terá eleições municipais, então é razoável que qualquer governo federal tenha bastante carinho nas eleições municipais, porque isso vai ditar o quão bem assaltado suas forças eleitorais para a eleição presidencial, porque é muito difícil ganhar uma eleição presidencial sem ter força municipal. Então essa é uma dúvida que o mercado tem, será que o governo federal vai abrir mão de controlar os gastos para ir melhor na eleição municipal.
Isso depende sempre, e o mercado em geral é meio monotemático, então hoje ninguém está prestando atenção, de repente tem um problema nos EUA, aí o juros sobe, e no Brasil tem o problema fiscal, então só lembrando dos riscos.
Vocês estão enxergando a Bolsa com otimismo?
Considerando que o Fed consiga cortar os juros em meados de março e abril e no Brasil não haja exageros, nós da SulAmérica Investimentos, vemos que pode ser um ano bom para a Bolsa de Valores. Porque, basicamente, quando você está fazendo investimento em bolsa, quando tem corte de juros, a bolsa tende a subir. Nós fizemos uma análise que mostra que, em todos os anos que houve corte na taxa de juros, a bolsa de valores apresentou valorização. Tem alguns casos de exceção que a bolsa sobe a despeito da subida de juros.
O motivo para isso acontecer é simples, a queda de juros estimula a economia. Um bom ponto de partida para avaliar a expectativa de crescimento da bolsa, é observar o quanto o lucro da bolsa vai crescer.
Para exemplificar, se você tem uma padaria, e ela tem R$ 100 de lucro, quanto a padaria deveria valer no ano que vem. Se sua padaria cresce 20% do lucro, você deveria vender a padaria 20% mais cara. Então se você acha que sua padaria vai dobrar em três anos, você não vai vender pelo dobro, porque tem o custo do dinheiro, mais o risco de não executar. Então você projeta, seu lucro vai subir de R$ 100 para R$ 200, descontado a taxa de desconto, esse R$ 200 vai valer menos.
No caso de um ano, como ninguém é capaz de definir o juros a longo prazo, então você pega quantos pontos a bolsa está hoje, e adiciona 20%, da mais ou menos 155.000 pontos, ou algo parecido. Isso é uma pergunta que todo mundo faz e é muito difícil de acertar, mas se você pensar, a médio prazo, se acertar o crescimento do lucro, geralmente, você acerta onde a bolsa vai chegar.
Outro fator, quando o juros cai, as empresas são endividadas, lembrando da padaria, digamos que tem R$ 100 projetado de lucro, ele tem R$ 100 por hipótese de dívida, se o juros que ele estava pagando de 13% ao ano, ele vai para 10%, esses R$ 3 que ele está pagando, vai direto no bottom line, então sua padaria vale menos sem fazer nada. Então, quando o juros cai, sobra mais dinheiro para os consumidores, então ao invés de comprar um salame, ele compra um pastrami que a margem é melhor, então a venda melhora, e eu que estava pagando o serviço da dívida alto, vou pagar menos.
Então, resumindo, com a queda de juros, estimula melhor a economia, o bottom line melhora, e por fim, o custo de oportunidade do investidor local melhora. Então, por isso, que em geral tende a ser melhor para a bolsa de valores.
Quais setores vocês veem com bons olhos em 2024?
Se dividirmos a bolsa em empresas que produzem commodities e empresas domésticas, as empresas de commodities, que chamamos de cíclicas, nós da SulAmérica Investimentos estimamos que elas terão um crescimento de lucro em torno de 15% em 2024 em relação ao ano passado.
E as empresas domésticas devem ter um crescimento no lucro de 25% em relação a 2023, claro que também o ano passado foi totalmente destruído, então as empresas estavam endividadas, o juros subiu e pegou o ponto máximo de alavancagem
Lembrando que, é normal que uma empresa no Brasil a dívida líquida sobre Ebitda é duas vezes, gera de caixa R$ 100 milhões, e a dívida líquida é R$ 200 milhões, quando o juros era 12%, a empresa vai no mínimo pagar 15% ao ano, então R$ 30 milhões, muita coisa, então por isso o lucro das empresa cresce tanto em 2024.
Em geral, nós estamos mais otimistas nos setores domésticos, temos mais exposição em bancos, construção civil, um pouco de varejo seletivo, energia elétrica e saneamento e transportes. E nós não temos exposição e não gostamos dos setores de celulose, mineração e siderurgia. E a nossa exposição está relacionada em como será o lucro dessas empresas em 2024. E em petróleo estamos neutros.
Eu gosto de pensar assim, quando você se expõe em commodities, você está comprando o crescimento externo, da China e como ela está desacelerando, é ruim. Então, se o Brasil tem mais surpresa de crescimento do que a China, os setores domésticos serão melhores que as commodities.
Qual a projeção de vocês para os IPO em 2024?
É super difícil projetar o IPO, mas nós acreditamos que será um pouco melhor neste ano. Vale destacar que, em termos de IPOs não teve nenhum em 2023, foi tudo follow ons, então se tiver um em 2024 já será melhor.
Nós temos uma lista de IPOs, que está todo mundo esperando, mas na nossa visão, deverá ser melhor, de fato, em 2026. Isso porque, daqui a dois anos, o custo de oportunidade vai cair, então o preço da ação deve subir e haverá animação para captação no mercado. Mas tem uma lista, razoavelmente grande com empresas de saúde, o que mais vem geralmente são empresas de construção porque as empresas desse setor precisam de sócios, é um business de capital muito intenso, então eles aproveitam a oportunidade para captar. Deve ser melhor sim que em 2023.
Até agora, foi divulgado o da Energisa.
Reabertura do mercado e queda da Selic, como os investidores devem se portar?
Os investidores estão bem machucados. É engraçado isso, porque se olharmos o comportamento da Bolsa de Valores em 2023, ela subiu 22%, foi uma boa valorização. No entanto, esse movimento aconteceu apenas nos últimos dois meses do ano, então todo mundo está com a sensação de que foi um ano ruim para a bolsa, mas na verdade, não foi.
Então os investidores não estão com aquela sensação de “nossa não posso perder oportunidade na bolsa, porque estamos em euforia”. Em geral, o fluxo local melhora quando estamos mais eufóricos ou quando não há mais alternativa. Os investidores só vão notar que os juros de fato estão caindo, mais para o final do ano, porque o Banco Central está sinalizando que os cortes serão graduais, de 0,50 p.p. a cada reunião, então nós da Sul América Investimentos, não vemos uma forte aceleração na bolsa.
Eu não acho que terá grandes animações agora no início do ano.
A bolsa acumula quedas em janeiro, o que explica?
Todo mundo está se perguntando, na minha visão, acho que houve um exagero no final de 2023, tem uma parte de devolução desse movimento, mas talvez eu não concorde com a magnitude das quedas. Eu não concordo que deveria ter caído tudo isso, se for observar, o Ibovespa está caindo 5,2% e o small caps está caindo mais de 6%.
Outro fator que eu vejo é que as sinalizações de resultados do quarto trimestre estão vindo mais fracas. Então aparentemente o 4T23, não será tão bom, como era esperado pelo mercado, então, isso pode movimentar também.
Por último, nós estamos ‘grudados’ com os EUA, que estava precificado com uma razoável convicção um corte de juros já em março, e agora, os membros do Fed estão sinalizando preocupação com a inflação e que o cortes de juros não está garantido.
Lembra que o Fed tem esse problema, se ele cortar rápido demais, o país que está com desemprego nas mínimas, e a inflação voltar, o Fed terá que subir muito mais os juros e causará uma recessão muito forte e o Brasil será afetado. Por enquanto, nós estamos sendo afetados pelo “bom motivo”, em que ele está sendo cauteloso.
Se a taxa de juros dos EUA de 10 anos subir, é bem possível que no Brasil também suba, e se isso acontecer é bem possível que a bolsa caia entre 12% a 15%.
Bolsa de Valores deve bater novos recordes?
Acredito que sim, na verdade, teoricamente isso não é muito difícil, porque se o recorde é 135 mil pontos e bater 137 mil pontos, na verdade ele está atrasado. É razoável ter novas máximas da bolsa, mas vejo esse movimento mais para o final do ano, porque no curto prazo não teremos visibilidade se o Fed irá cortar tão rápido. Seria muito bom o Fed estar cortando juros, juntamente com o Brasil, porque os investidores globais serão atraídos para comprar aqui também, mas por enquanto, ninguém está nesse ritmo.