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No China X EUA, Brasil pode pagar o pato

Segundo analistas consultados pelo BP Money, País pode ser afetado diretamente com a desavença entre as duas potências por causa de Taiwan

Nas últimas semanas, as tensões entre EUA e China se intensificaram com a ida da presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, para Taiwan. Tal visita foi vista como uma provocação, visto que a ilha se declara independente, mas a China a considera como uma província. De acordo com os analistas consultados pelo BP Money, o Brasil pode ser afetado diretamente com a desavença. 

A China é a principal parceira comercial do Brasil desde 2009. Em 2021, dos US$ 289 bilhões que o País exportou, 32% do montante foi destinado ao país asiático. Além disso, o Brasil é a nação que mais importa mercadorias da China. 

Grande produtor de commodities, o Brasil oferece uma grande quantidade de alimentos, como soja e carne bovina, e matérias-primas, como petróleo e celulose. Todos demandados em peso pela China.  

Além da relação entre governos, muitos empresários brasileiros possuem negócios e têm relações comerciais com o país asiático. Várias empresas vão buscar na China os mais variados bens, como equipamentos de telecomunicação, fertilizantes, válvulas e adubo.

Segundo Fabrício Gonçalvez, Ceo da Box Asset Management, um provável conflito entre a China e os EUA faria com que o capital estrangeiro fugisse do Brasil, em direção a mercados mais consolidados. Assim, o real se desvaloriza frente ao dólar. 

“Quaisquer riscos políticos interferem no movimento de mercado, pois os investidores ficam mais avessos ao risco, passando a buscar mais segurança em economias como os EUA. Com uma fuga de capital de países emergentes a cotação do dólar sobe. No Brasil, por exemplo, a cotação dólar ficaria mais cara, perto dos R$ 6 ou R$ 7 reais. E isso é muito ruim, pois desvaloriza nossa moeda e impacta nossa inflação”, afirmou. 

Gonçalvez ainda relata que o acordo comercial do Brasil com as duas superpotências seria afetado. 

“A questão comercial com a China é muito importante. Hoje o principal cliente da Vale é a China, com nosso minério de ferro. A cada 5 dólares na cotação do minério, há um impacto de quase US$1,5 bilhões de dólares no Ebitda da Vale. Os chineses compram muitos produtos nossos, açúcar, carne bovina, soja e frango. Já os EUA importam aviões, aço, petróleo e alumínio. Nosso maior risco é o acordo comercial que temos com as duas nações”, completou. 

Daniel Toledo, advogado especialista em Direito e Política Internacional, afirmou que um possível conflito entre China e EUA por Taiwan poderia causar o fechamento de diversas áreas comerciais, prejudicando o Brasil e várias outras nações. 

“Num provável conflito, o Brasil seria impactado, porque somos um grande fornecedor de commodities para a China. Quando há um conflito a primeira coisa que acontece é o fechamento da área comercial, do trânsito de navios, de aviões e de pessoas. Se a China parar de comprar, os navios não vão fazer entregas, impactando o Brasil”, disse. 

Quais setores seriam beneficiados e prejudicados?

Segundo Ricardo Julio Rodil, head de Capital Markets da Crowe Macro Auditoria e Consultoria, as exportações seriam fortemente impactadas com uma desavença entre China e EUA.

“O setor de commodities seria o mais prejudicado, na medida em que tal conflito pudesse frear ou diminuir drasticamente o comércio mundial, sendo que nossas exportações com a China são extremamente relevantes”, afirmou. 

Rodil ainda afirmou que pode ocorrer uma diminuição no fluxo de importações. 

“No lado das importações e dos investimentos, haveria seguramente uma diminuição desse fluxo, o que pode deflagrar uma corrente nefasta para o Brasil, valorização do USD, que impacta a inflação, que impacta o consumo e que impacta o emprego, e assim por diante”, relatou. 

Por outro lado, Rodil acredita que há um ponto positivo nisso tudo: o fortalecimento do dólar faria com que o Brasil ficasse mais atrativo para o investidor estrangeiro, puxando interesses comerciais. 

“O único ponto positivo de uma valorização do US$ e das moedas fortes seria que esse movimento poderia incentivar investimentos já que o Brasil ficaria mais “barato”, confidenciou. 

Toledo lamentou o fato do Brasil não investir tanto no setor de tecnologia e bélico, pois acredita que esses dois segmentos se sobressaem quando um conflito mundial explode. 

“Diversos setores se beneficiam com conflitos, principalmente setores de tecnologia e bélico. O Brasil infelizmente tem deixado de investir em tecnologia de dados, setor aeroespacial e defesa. Isso faz as grandes potências do mundo serem o que elas são. Se o Brasil quiser se colocar no meio das grandes potências, precisa investir mais em tecnologia”, afirmou. 

O Brasil se aproximaria de alguma das duas potências? 

Para Toledo, se o conflito entre EUA e China estourar, o Brasil irá acabar escolhendo um lado. Nesse contexto, acredita que o Brasil precisa se posicionar para não ser isolado do seu próprio continente.

“Um conflito vai fazer com que o Brasil se aproxime necessariamente de uma delas. É difícil prever qual lado o País vai escolher. Por exemplo, o Brasil ultimamente tem se aproximado da Rússia, que tem muito poder e influência no cenário internacional. Se o Brasil não se posicionar e não entender sua relação com seus países da América, vamos acabar ficando isolados, comercialmente e estrategicamente”, disse. 

Segundo Rodil, é difícil prever se o Brasil tomará partido nesse caldeirão político, visto que não se pode ainda saber se o Itamaraty terá autonomia para agir caso um conflito exploda. 

 “Relações internacionais se fazem com base em interesses. Tudo dependerá do quanto o Itamaraty terá de autonomia para conduzir essas relações com base nos interesses do Brasil e/ou o quanto a diplomacia brasileira se deixar engolir por colocações ideológicas”, relatou.

Ainda para Rodil, se o Brasil ficar ao lado de alguma das potências, haveria retaliações, prejudicando comercialmente o País.  

“Se o Brasil apoiar a China para “não perder cliente”, os EUA podem retaliar de diversas maneiras, pois são o segundo maior investidor estrangeiro. Adicionalmente, se o conflito estrangular o tráfego marítimo entre a costa ocidental da América e a China, as exportações nossas poderiam ser inviáveis, pois os navios não chegariam ao destino, ficando de mal dos dois lados, disse. 

“Se o Brasil apoiar os EUA, a corrida para achar um cliente que possa absorver o comércio atualmente mantido com a China afetaria por um bom  tempo a entrada de divisas”, completou.