O “rombo” de R$ 40 bilhões no balanço da Americanas (AMER3) respingou também nos fundos de renda fixa. Mas como e por que ocorre esse processo de queda em decorrência dos efeitos causados pela varejista?
De acordo com Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, a queda de alguns fundos de renda fixa está acontecendo pela marcação a mercado do título, que está sofrendo pressão da “força vendedora”.
“Muitos investidores e fundos estão buscando vender a dívida da Americanas, literalmente, a qualquer preço, e isso tem puxado a cotação dos fundos de renda fixa que têm o papel”, explicou Alves ao BP Money.
“Além disso, cotistas desconfortáveis com a situação estão retirando dinheiro dos fundos, que precisam vender posições a preço de mercado para devolver o dinheiro aos cotistas, e tudo isso gera um “dente negativo” na rentabilidade dos fundos de renda fixa”, completou Alves.
A desvalorização das debêntures emitidas pela varejista varreu o mercado de crédito privado, o que assustou investidores que procuram construir sua reserva de emergência nesse tipo de investimento e, consequentemente, não estão habituados a verem o seu rendimento cair.
“Já tem fundo provisionando perda de 50% em cima dessas debêntures. Ainda não se sabe como ficará lá na frente, mas de fato já não honrou um dos pagamentos. Apesar de ser uma renda fixa, há um risco pois se está comprando uma renda fixa de uma empresa, e a mesma tem que ter capacidade de pagamento. Por isso vários fundos estão apresentando queda, pois já não receberam e talvez perderão o dinheiro que aplicaram nessas debêntures”, apontou Ricardo Brasil, fundador da Gava Investimentos e pós-graduado em análise financeira.
Por ser considerada segura e sendo uma empresa quase que centenária, a Americanas se tornou um dos principais credores desses fundos, o que acabou afetando a queda de muitos deles que contam com títulos de dívida da companhia.
“A Americanas é um dos principais credores, e tem posição acionária de vários de fundos de investimentos, por até então ser considerada uma empresa, e um veículo de investimento seguro, o que mudou drasticamente com a dívida de R$ 40 bilhões que não foi corretamente contabilizada e se tornou um passivo “bomba relógio” a qual todos os investidores estão tentando fugir, exceto os acionistas majoritários, 3G Capital, que deve precisar fazer um aporte e renegociar dívidas para salvar a empresa”, disse Alves.
Queda nos fundos seguirá por mais tempo?
O caso mais conhecido foi o do “Nu Reserva Imediata”, do Nubank, mas outros diversos fundos também apresentaram e seguem apresentando queda por conta dos efeitos gerados pela Americanas, como projeta Alves.
“Enquanto a situação não for minimamente resolvida e houver uma luz no fim do túnel, qualquer nova notícia deve continuar puxando o preço dos papéis de dívidas e das ações, e como costumamos falar no mercado, em situações como essa o valor do título tende a zero, até que a situação de fato seja resolvida”, explicou.
Ricardo Brasil destaca que o momento de incerteza deve continuar, o que acaba afetando o mercado. “Eu não vejo a Americanas literalmente quebrando, pois na pior das hipóteses — ainda mais se houver uma recuperação judicial, vejo uma outra empresa comprando”, afirmou Brasil.
“Porém, nesse caso, tudo leva a crer que a empresa quebrou. São muitos questionamentos que só aumentam a incerteza, mesmo com a empresa tentando trazer uma certeza ao mercado. De qualquer forma, o mercado ficará menos volátil quando souber mais informações, como o que fará a 3G Capital”, completou Brasil.
Ainda de acordo com o fundador da Gava, o caso da carteira do fundo na Nubank foi algo desagradável, mas não ao ponto de preocupar o investidor.
“Segundo o Nubank o fundo só tinha 1% de exposição. Não é algo muito legal, vai render menos que o CDI, mas 1% numa carteira pulverizada é uma perda chata, mas o impacto não é gigante. Por mais que a perda seja milionária, não é o fim do mundo. Talvez ele não consiga chegar na rentabilidade que propôs para o cliente, mas não será uma grande perda”, avaliou o fundador da Gava Investimentos.
Assessor da SVN BP Investimentos, David Carneiro salienta que é preciso analisar o tamanho do impacto do prejuízo no portfólio do investidor e se há capacidade de recuperação na própria carteira.
“Em teoria, essa etapa de avaliação e escolhas deveria ter sido realizada previamente, no momento de composição da carteira de investimentos com, se possível, auxílio de um profissional capacitado. Com o fato consumado, resta descobrir o quanto desse Fundo está exposto aos títulos de dívida da Lojas Americanas (AMER3)”, explicou Carneiro.
Ele aponta que esse processo pode ser feito por meio de consulta no site da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) ou em relatórios e lâminas do próprio Fundo. “Com essas informações, é possível projetar se vale a pena manter o Fundo na carteira ou migrar para outro investimento”, concluiu Carneiro.