As negociações para uma possível fusão entre a Gol (GOLL4) e a Azul (AZUL4) avançaram na última quinta-feira (16), com o anúncio da assinatura de um memorando de entendimento para a união das empresas no Brasil.
Porém, funcionários do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) já sinalizaram ao “Valor” que o processo de aprovação da união vai ser complexo e não deve ser concluído sem restrições.
A concentração de mercado começa a ser preocupante para o Cade a partir de 20%, destaca o sócio de concorrencial e M&A do NHM Advogados, Mario Nogueira. Com a fusão, a Gol e a Azul teriam 60% de participação no segmento de transporte aéreo.
Dessa forma, para manter uma concorrência leal no setor, o Cade pode exigir, por exemplo, que as empresas vendam ativos e mantenham operações separadas em determinadas rotas, avalia o assessor da Valor Investimentos, Virgílio Lage.
Em outras fusões do setor, o Cade já impôs restrições como a redistribuição de slots em aeroportos congestionados para outras companhias, medida que pode se repetir nesse caso, lembra o assessor.
Para os funcionários questionados pelo “Valor”, essas restrições são prováveis, mas o processo para a decisão deve demorar. O prazo para que o Cade aprove a operação é de 240 dias, que podem ser estendidos por mais 90 dias, em casos mais complexos.
“Dada a magnitude dessa fusão e seus potenciais impactos no mercado, é provável que o Cade utilize todo o período disponível e isso dá quase um ano para que a fusão seja aprovada” destaca Lage.
Movimentos parecidos já passaram por desafios durante a tramitação na autarquia. ” Em situações como a da fusão Gol-Azul, o Cade tem se mostrado bastante cauteloso e atento às implicações do movimento”, destaca Marcelo Tommasi, líder de finanças corporativas da Crowe Macro Brasil.
Como é o processo para que o Cade aprove a fusão entre Gol e Azul
No Brasil, não há um percentual específico de participação no mercado que possa impedir uma fusão entre empresas. Dessa forma, é papel do Cade avaliar se a operação vai resultar em uma concentração excessiva que possa prejudicar a concorrência.
Para a aprovação, é necessário primeiramente que as empresas envolvidas notifiquem formalmente suas intenções de fusão. Funcionários do Cade informaram ao “Valor”, em reportagem publicada na sexta-feira (17), que esse aviso oficial da Azul e do grupo Abra, controlador da Gol, ainda não ocorreu.
Depois das notificações de ambos os lados, inicia-se uma análise preliminar do Cade, destaca Lage. Nessa etapa, a Superintendência Geral do órgão avalia os impactos nas concorrências. A análise pode envolver consultas públicas e manifestações das empresas envolvidas.
Depois desse processo, o Tribunal do Cade faz uma decisão por aprovar, reprovar ou impor restrições à fusão.
No caso da fusão entre a Gol e a Azul, esse processo de aprovação deve ser especialmente complexo, uma vez que o Brasil já tem uma concentração expressiva no mercado aéreo, diz o sócio-fundador da Essentia Consulting, Acilio Marinello.
“São três companhias aéreas que detêm quase a totalidade do mercado: Latam, Azul e Gol. Agora, com a fusão de Azul e Gol, vão ficar praticamente dois grupos econômicos”, comenta o especialista.
No processo de análise, o Cade deve considerar tanto a possibilidade de concorrência já existente (a Latam já detém 40% do mercado) quanto a concorrência potencial (quem e em quanto tempo uma nova aérea entraria no mercado), destaca Nogueira.
“A análise a ser realizada pela autarquia também deverá considerar as rotas individualmente, para compreender os impactos em cada situação”, acrescenta o professor de Direito Empresarial Marco Antônio Pascoali.