FIFA: conheça escândalos que mancham reputação da federação

Enquanto todas as atenções estão voltadas à Copa do Mundo Qatar 2022, a newsletter "Mercado tem História" explora as maiores polêmicas envolvendo a dona do futebol mundial

Esta é a versão online para a edição desta semana da newsletter “Mercado tem história”. 

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É fato: todas as atenções estão voltadas à Copa do Mundo Qatar 2022.

A competição, que começou oficialmente neste domingo (20), é a mais cara de toda a história. Segundo dados levantados pela Statista, a Copa do Mundo deste ano teve um custo de US$ 220 bilhões, quase 19 vezes a mais do que a Copa de 2018, na Rússia, e 14 vezes a mais o custo da Copa de 2014, no Brasil.

Pensando nisso, existe momento melhor para expor a corrupção e o jogo de poder presente na FIFA? Para a Netflix, o time é perfeito.

A plataforma de streaming lançou, no dia 9 deste mês, o documentário “Esquemas da FIFA”. A produção relata um lado mais obscuro da instituição mundial de futebol, revelando inclusive quantas vezes o Mundial foi usado em prol da política e do enriquecimento.

O “Mercado tem História” de hoje vai te explicar, em poucos minutos, como o nome da FIFA começou a ser ligado a práticas antiéticas e o principal escândalo que eclodiu na federação – além de te mostrar o que o Brasil tem a ver com isso…

 

O método carioca

Ok, é praticamente impossível estipular uma data de início para a corrupção de qualquer entidade, e na FIFA não é diferente. No entanto, é simples nomear o homem que, impune até quase o fim da vida, a instituiu como método padrão: o carioca João Havelange.

Eleito presidente da então CBD (primeira entidade nacional de futebol) às vésperas da chamada “Era Pelé”, o ex-atleta de natação João Havelange se aproveitou das vitórias do esquadrão canarinho durante sua gestão para fazer seu nome na política do futebol. As copas do mundo de 1958, 1962 e 1970 foram, sem dúvida, a passagem de Havelange para Zurique, cidade em que fica a sede da FIFA. Mas o sucesso que sua seleção conseguiu em campo ainda não lhe garantiria o poder de que precisava.

Desde sua criação, a FIFA é uma instituição considerada europeia e, por isso, quando se candidatou à presidência da entidade, Havelange passou longe de ser o favorito, disputando com o então presidente, o inglês Stanley Rous. A maneira como o brasileiro driblou essas dificuldades é o pontapé inicial da história de corrupção e poder que ele construiu dentro da entidade.

Presidente da confederação brasileira, Havelange entendia as dificuldades do futebol fora do velho continente, e foi essa a moeda de troca que usou para angariar votos. Prometeu incentivar o futebol em outros lugares do mundo, assegurou investimentos e favores a nações da Ásia, África e América. Visitou 86 países durante as dez semanas de sua campanha, com promessas e presentes aos representantes dessas nações. Assim, teve o resultado que queria.

Em 11 de junho de 1974, João Havelange foi o primeiro não-europeu eleito para a presidência da entidade máxima do futebol mundial. Mais do que presidente, ele sabia que, com os favores e subornos com que havia sido eleito, teria a gratidão e fidelidade de inúmeros dirigentes ao redor do mundo. Seria dono da FIFA e dono do futebol.

 

Donos do jogo

Havelange construiu um império dentro da FIFA e manteve consigo muitos aliados. Homens de sua total confiança, agentes da FIFA que, às claras, movimentavam o mundo da bola. Entre eles, talvez seu maior aliado tenha sido o secretário-geral e seu futuro sucessor na presidência, o suíço Joseph “Sepp” Blatter.

Um nome que figura entre os aliados do grupo político de Havelange e Blatter, é o caribenho Jack Warner, ex-presidente da federação de Trinidad e Tobago e, por anos, presidente da CONCACAF (Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe) e representante continental no comitê da FIFA. Acusado por veículos de imprensa de inúmeras práticas corruptas ao longo dos anos, Warner não teve punição dentro da instituição. Ao contrário, foi nomeado vice-presidente da entidade, onde cometeu mais crimes.

O caso de Jack Warner é apenas um dos vários escândalos em que nada foi feito para resolver os crimes cometidos. A FIFA sofre há anos com casos de corrupção exaustivamente investigados por jornalistas do mundo todo. No entanto, os processos que resultaram em demissões de executivos da entidade ou qualquer outra medida efetiva por parte dela ou da justiça são – ou pelo menos eram – raríssimas exceções.

Para Luís Aguilar, jornalista português que investigou durante anos a entidade e publicou o livro “Jogada Ilegal”, a falta de empenho da justiça em capturá-los é simples de se explicar: “A FIFA, além de ter estado por muito tempo sob o sigilo bancário suíço – as leis fiscais são menos rígidas no país –, a grande maioria dos políticos vê no futebol uma oportunidade para acenar das arquibancadas e ganhar votos.” Ele ainda comenta: “E, em última análise, os países se submetem a coisas inimagináveis para sediar uma Copa do Mundo, e a FIFA acaba por ter esse poder do futebol, que se põe acima dos outros poderes e encobre suas más condutas.”

 

Fifagate

No dia 27 de maio de 2015, quase duas décadas após a saída de Havelange da FIFA e com Blatter na presidência, o mundo descobria o “Fifagate”, ou Caso Fifa, o maior escândalo de corrupção da história do futebol mundial.

Uma operação conjunta das polícias de Suíça e EUA resultou na prisão de sete dirigentes de futebol em Zurique – entre eles o brasileiro José Maria Marin, ex-presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol).

A investigação resultou no indiciamento de 34 réus, entre empresas e pessoas, e na devolução de milhões de dólares. Como o caso ganhou ramificações em outros países, com mais envolvidos e novos desdobramentos, é quase impossível calcular sua extensão, tanto no prejuízo causado quanto na quantidade de envolvidos.

Mas como tudo começou? A história teve início com a escolha das sedes das Copas do Mundo de 2018 e 2022, na Rússia e Qatar, respectivamente.

A Fifa vinha sendo assolada por diversas denúncias de corrupção que começaram com contratos fraudulentos com a ISL, empresa de marketing esportivo que comprou os direitos de transmissão das Copas de 2002 e 2006, cujos relatórios indicando ilegalidades foram revelados pela Justiça suíça apenas em 2012.

Diante da repercussão negativa, a própria Fifa resolveu criar um comitê de ética e um comitê de investigação para apurar as escolhas das Copas no Qatar e Rússia. Quem ficaria encarregado das investigações seria um ex-promotor da cidade de Nova York, Michael Garcia, que descobriu na pele que a organização não buscava esclarecer a escolha.

Seu relatório nunca foi divulgado, e Garcia pediu demissão. O problema é que antes de sair, o ex-promotor envolveu autoridades norte-americanas na investigação, o que desencadeou um efeito em cadeia no futebol mundial.

A legislação americana prevê que suas entidades podem investigar qualquer caso que envolva instituições dos Estados Unidos, seja pelo uso de um banco ou de um servidor cuja sede esteja no país. Foi assim que o FBI iniciou uma devassa nas contas de Jack Warner, achando o rastilho de pólvora que iria chegar ao maior escândalo de corrupção do futebol.

Na investigação de Warner, surgiu o nome de Chuck Glazer, ex-secretário-geral da Concacaf. Seus crimes de lavagem de dinheiro e receptação de propina fizeram com que ele fechasse acordo de delação premiada com a Justiça americana. Foi a senha para a investigação se tornar internacional com a cooperação da Justiça suíça, uma vez que a sede da Fifa fica na cidade de Zurique.

As investigações feitas por Estados Unidos e Suíça descobriram um extenso histórico de pagamento de propinas, em especial para a escolha do Qatar como sede em 2022, em votação realizada em 2010.

As Justiças concluíram que Ricardo Teixeira, presidente da CBF na época, foi um dos que recebeu propina para votar a favor do país do Oriente Médio. Teixeira foi indiciado pela Justiça suíça e americana, mas o histórico de não extradição de seus cidadãos pelo Brasil fez o dirigente se autoexilar no país.

O processo acabou por chegar às mais altas esferas do futebol mundial. Em setembro de 2015, a Justiça suíça abriu um processo-crime contra Blatter, até então presidente demissionário da FIFA, que implicou também Michel Platini, presidente da UEFA (União das Associações Europeias de Futebol). A causa refletia uma suposta gestão danosa e apropriação indevida de fundos.

O dirigente francês, que era candidato à sucessão de Blatter, foi na altura ouvido por, alegadamente, ter recebido do suíço “um pagamento ilegal” de dois milhões de francos suíços (cerca de 1,8 milhões de euros).

Enquanto estavam em julgamento, ambos foram proibidos de exercer cargos ligados ao futebol por vários anos pelo Comité de Ética da FIFA. No entanto, em julho deste ano, Blatter e Platini foram absolvidos do caso de fraude que marcou para sempre a história do futebol.