De produtos “amigos da natureza” as prateleiras estão cheias, com rótulos que chamam atenção de consumidores que tentam ser “eco-friendly”. Porém, essa “amizade” nem sempre se prova verdadeira, quando empresas usam desses rótulos para enganar o comprador através do greenwashing.
A “maquiagem verde”, como também é conhecido o greenwashing, atinge não apenas os consumidores finais, mas também investidores que se preocupam com as boas práticas ambientais por empresas com as quais iniciam negócios.
A agenda ambiental tem chamado atenção da população, com a percepção dos efeitos devastadores das mudanças climáticas a cada nova tragédia, como as enchentes no Rio Grande do Sul este ano.
Contudo, o desconhecimento quanto aos processos que tornam um produto verdadeiramente sustentável, junto à falta de uma legislação e fiscalização, tornam o greenwashing uma prática fácil para as empresas.
Segundo dados da Pesquisa Global com Investidores 2023 da PwC, cerca de 75% dos investidores no Brasil e no mundo querem saber dos efeitos exercidos por uma empresa no meio ambiente.
Quanto a se as empresas deveriam investir em práticas relevantes de ESG, mesmo com impactos nos lucros no curto prazo, 29% dos entrevistados concordaram um pouco, outros 29% concordaram e 12% concordaram muito.
Na linha contrária, um total de 12% se dividiram nos níveis de discordância, enquanto 17% não souberam responder.
Falta de códigos de regularização fortalecem o greenwashing
No entanto, a preocupação ainda não ganhou espaço suficiente entre os agentes e órgãos reguladores corporativos, visto que, no Brasil o greenwashing não é abordado diretamente no CDC (Código de Defesa do Consumidor) e no código de regulamentação publicitária.
Segundo Jaques Paes, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e consultor de empresas, o Brasil não é o único nesse ciclo, pois a Organização Mundial do Comércio também não tem meios de punir o greenwashing.
“Para que ocorra uma punição seria necessário o enquadramento como uma prática enganosa ou abusiva, que tenha gerado um dano ao consumidor, ou influenciado uma decisão que não seria tomada não fosse a ação direta da empresa, mas isso é de difícil comprovação”, explicou el, em resposta ao BP Money.
Nesse cenário, uma das manobras de greenwashing utilizadas no mercado é o chamado “plástico vegano”. O termo, utilizado inclusive por marcas conhecidas, pode ser classificado como vago, impreciso e principalmente irrelevante, de acordo com Gisele Barbin, gerente comercial da Extrusa Pack.
“Plásticos comuns não são feitos a partir de animais, nem são testados neles. Portanto, todos os plásticos como conhecemos são obviamente veganos. Os plásticos baseados em plantas, de fontes renováveis e os diversos tipos de biodegradáveis são tão veganos quanto os comuns oriundos do petróleo”, esclareceu.
Segundo Barbin, o plástico representa 1% de todos os tipos de materiais que usamos. “A divulgação de falsas informações sobre determinado tipo de material tem o potencial de enganar as pessoas, fazendo-as optar por outros mais impactantes, o que acaba gerando manobras de greewashing”, disse.
Paes concordou com a posição e explicou que, embora a indústria de bioplástico possa ser sustentável em impacto global, não significa que os produtos sejam veganos, podendo ter aditivos de origem animal.
“Vejo esta narrativa como uma tentativa de suprir uma necessidade dos stakeholders e de posicionamento de marcas no mercado”, completou ele.
“Por exemplo, há uma empresa calçadista no Brasil que reforça práticas sustentáveis na produção de seus calçados por utilizar um “plástico vegano” no entanto, quantos pares são feitos com plástico tradicional e são descartadas?”, citou ele.
Os 7 pecados da “maquiagem verde”
Contudo, hoje, essas considerações são mais do campo ético, levando o tema a outras discussões, como a economia circular, por exemplo, disse Paes.
Conforme a agência canadense TerraChoice, as práticas de greenwashing variam em 7 maneiras: a falta de provas, a troca oculta, a informação vaga ou imprecisa, a irrelevância, o “menor dos males” e a mentira.
Barbin afirmou que, nos produtos da Extrusa Pack, os pontos considerados sustentáveis precisam ser informados com clareza. Divulgar a tecnologia utilizada, além de parcerias, explicando a origem ou decomposição do produto ajuda o consumidor a escolher de forma mais consciente, disse ela.
“Temos, por exemplo, os sacos PackLixo Biobags, em que divulgamos a marca do aditivo d2w aplicado. E para a destinação correta de suas embalagens, temos parceria com Instituto Eureciclo em que é feita a compensação da reciclagem dos itens”, acrescentou.
“Os selos ecológicos funcionam como uma espécie de carimbo ao produto, como forma de dizer que aquele determinado produto seguiu uma prática ambientalmente correta em sua fabricação”, disse Paes.
Ainda assim, é desafiador para os interessados analisarem a veracidade do selo e comprovarem que ele não é usado de forma enganosa. Sem métricas e mensuração, claras e transparentes, é difícil sair do campo da subjetividade, afirmou o professor da FGV.
“Deveríamos analisar o selo em vários aspectos como rigor dos seus processos de emissão, credibilidade da organização emissora e os critérios utilizados para emissão destes selos”,
Para Jaques Paes, o problema da agenda sustentável no Brasil é a relação de poder tripartite centralizada. A ligação entre o poder público, o privado e o das comunidades é desequilibrada, sobretudo para este último.
“A regulamentação ecológica forte junto com métricas claras, assertivas e auditáveis a qualquer tempo, poderia sim impulsionar o país em direção a uma agenda sustentável mais assertiva, proporcionando uma comparação entre pares do mesmo setor e também do Brasil em relação aos demais países”, completou.