Congresso

Recuperação judicial: advogados criticam normas do agronegócio

Durante o Congresso Baiano de Direito e Agronegócio, especialistas apontaram falhas no entendimento da recuperação judicial

Mesa composta por Washington Pimentel, Argemiro Dutra, Henrique Arake, André Santa Cruz e Júlio Travessa / Foto: Instituto Washington Pimentel
Mesa composta por Washington Pimentel, Argemiro Dutra, Henrique Arake, André Santa Cruz e Júlio Travessa / Foto: Instituto Washington Pimentel

Desde o ano passado, o cenário macroeconômico foi dominado pelos juros altos, em resposta à inflação acima da meta, e pressão sobre as atividades que mais precisam de crédito. Nesse ritmo, o setor do agronegócio sofreu com o aumento expressivo nos pedidos de recuperação judicial. Sendo assim, advogados baianos criticaram a legislação atual dessa manobra e o tratamento reservado aos produtores rurais.

Durante sua participação no Congresso Baiano de Direito e Agronegócio, na sexta-feira (9), o professor de Direito Empresarial do Centro Universitário IESB-DF, André Santa Cruz, destacou as regras específicas definidas no Código Civil para o setor rural, que abre brechas para que essa classe de empresários possa decidir se submeter ou não ao regime jurídico empresarial.

“Esses dispositivos [artigos 971 e 984] estabelecem que o produtor rural, seja pessoa física ou jurídica, tem a faculdade — e não a obrigação — de se registrar na junta comercial”, explicou.

Por muitos anos, essas normas eram, segundo ele, mais um desafio acadêmico do que prático: “Essas regras só geravam problema para professores e estudantes de concurso público, que tinham que entender e responder questões sobre isso”, comentou.

No entanto, a situação ganhou outra dimensão quando produtores rurais começaram a solicitar recuperação judicial. A partir de então, surgiu uma controvérsia jurídica sobre a legitimidade desse grupo para acessar os institutos previstos na Lei 11.101/05, que trata da recuperação e falência de empresas. 

“A dúvida passou a ser: o produtor rural é ou não empresário? Pode ou não se beneficiar da lei de recuperação judicial?”, questionou Santa Cruz.

A resposta, segundo o professor, está diretamente ligada à opção pelo registro. “Esses dispositivos do Código Civil são claros ao dizer que, se o produtor rural opta pelo registro, ele será considerado empresário para fins legais — e, portanto, poderá pedir recuperação judicial”, concluiu.

Conforme dados da Serasa Experian, o agronegócio brasileiro registrou 1.272 pedidos de recuperação judicial, um aumento de 138% em comparação com 2023, que tinha 534 pedidos.

A recuperação judicial virou modelo de negócio?

A crítica de André Santa Cruz foi reforçada por Henrique Arake, Secretário-Geral da Comissão de Direito Empresarial da OAB/DF, que avaliou que a recuperação judicial tem sido utilizada pelas empresas atualmente como um modelo de negócios. 

O secretário citou especificamente o caso da empresa de telecomunicações, Oi (OIBR3), que entrou com o terceiro pedido de recuperação judicial em 2023, antes mesmo de encerrar o segundo processo. 

“Existem empresários que ficam inadimplentes com questões fiscais como modelo de negócio. Optam por não pagar o imposto. Por quê? Porque calcularam ali que mais ou menos de 5 em 5 anos, 6 em 6 anos, o governo vai soltar um programa de negociação, de reparcelamento, matar toda a multa”, explicou ele.

Enquanto isso, o produtor rural e juiz do Tribunal de Justiça da Bahia, Argemiro Dutra, reiterou a necessidade de fortalecer a mentalidade e a confiança entre os produtores e empresários do agronegócio, para que a concessão de crédito seja estimulada.

Segundo ele, quando o agronegócio contava mais com a ajuda do poder público, a mentalidade era de anistia das dívidas. Porém, a partir do momento em que a iniciativa privada entrou no cenário, o entendimento mudou, acompanhando a dinâmica das empresas, não oferecem algo — nesse caso, crédito ou investimento — sem garantias.

“Precisamos saber que se você pegar um empréstimo, você tem que pagar, porque precisamos dar segurança aos investidores”, disse.