
Após mais de duas décadas de negociações, o Acordo de Associação entre Mercosul e União Europeia está perto de sair do papel. O tratado cria um mercado integrado de quase 780 milhões de consumidores. Além disso, prevê a eliminação ou redução de tarifas para mais de 90% dos produtos negociados entre os blocos.
No entanto, os ganhos não devem se espalhar de forma uniforme pela economia brasileira.
Segundo Fabrizio Gammino, contador e administrador formado pela FGV e sócio da Grownt, alguns setores largam na frente. Na avaliação do especialista, cinco segmentos concentram as principais oportunidades.
Proteína Animal: Margem em vez de Volume
O setor de carnes costuma aparecer como o grande vencedor. Ainda assim, Gammino ressalta que o impacto inicial não será de volume, mas de rentabilidade.
“O Brasil já projeta exportar entre 120 mil e 150 mil toneladas para a UE em 2025, acima da cota inicial de 99 mil toneladas”, explica.
Hoje, a tarifa intra-cota para carne bovina é de 7,5%, enquanto fora dela pode superar 100%. Para aves, o acordo prevê uma cota de 180 mil toneladas com isenção total.
“O maior benefício é a redução drástica da tarifa. Produtos hoje inviáveis passam a competir em condições melhores”, afirma. Nesse cenário, Marfrig (MRFG3) e JBS (JBSS32) aparecem bem posicionadas.
Papel e Celulose: O Prêmio Verde
Para empresas como Suzano (SUZB3) e Klabin (KLBN11), o acordo vai além das tarifas, que já são zeradas para celulose. O diferencial está no reconhecimento ambiental.
Segundo Gammino, a facilitação comercial pode criar um “prêmio verde”. Isso tende a favorecer a celulose brasileira, reconhecida como uma das mais sustentáveis do mundo. Como resultado, os produtores podem acessar mercados mais exigentes e negociar preços melhores.
Mineração: Parceiro na Transição Energética
O minério de ferro da Vale (VALE3) já entra na Europa sem tarifa. Mesmo assim, o acordo traz um ganho estratégico relevante.
“A União Europeia vive uma transição energética acelerada e busca reduzir a dependência da China”, destaca Gammino.
Nesse contexto, o Brasil ganha espaço como fornecedor de níquel, cobre e lítio, insumos essenciais para baterias, veículos elétricos e projetos de energia renovável.
Calçados e Têxteis: Derrubada de Barreiras
Este é um dos setores onde a redução tarifária terá impacto mais direto. Atualmente, calçados e têxteis brasileiros enfrentam tarifas de 8% a 17% na Europa. O acordo prevê eliminação completa em até 10 anos.
“Para um setor que depende de volume e preço competitivo, a remoção dessa barreira é transformadora”, avalia Gammino. Empresas como Alpargatas (ALPA4), dona da Havaianas, e Vulcabras (VULC3) terão oportunidade de expandir presença no mercado europeu.
Bens de Capital: Integração às Cadeias de Valor
Máquinas e equipamentos já tinham tarifas baixas (0% a 5%), mas o acordo beneficia empresas como WEG (WEGE3) com integração às cadeias produtivas europeias.
“A eliminação de barreiras regulatórias e a simplificação de normas técnicas facilitam a exportação de componentes do Brasil para serem integrados em produtos mais complexos na Europa”, explica o especialista.
Segundo Gammino, o sucesso na capitalização dessas oportunidades dependerá da capacidade de cada setor de se adaptar e competir no novo cenário comercial que se desenha.