Especialistas avaliam

BRICS: mesmo antes de Trump, criação de moeda estava distante

As diferenças entre os países do bloco e os riscos políticos já dificultavam as negociações

Moeda brics
Brics / Foto: Marcelo Camargo - Agência Brasil

Uma moeda própria do BRICS já estava longe de se concretizar, mesmo antes das declarações do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, dizem especialistas. Trump afirmou que iria taxar os países do bloco em 100% caso fossem a cabo com o projeto.

Diante dessas declarações, é provável que os países do BRICS adotem uma abordagem estratégica e cautelosa, especialmente considerando a postura de Trump historicamente protecionista e retaliatória a medidas que possam desafiar o protagonismo econômico dos EUA, considera o CEO da iHub Investimentos, Paulo Cunha.

Porém, mesmo antes das ameaças, o projeto já era considerado de difícil execução. “A realidade está muito distante de ocorrer e é de difícil previsão do tempo”, destaca Welinton dos Santos, economista e conselheiro do CORECON-SP. Segundo ele, a criação da moeda comum é atraente para o bloco, mas envolve riscos políticos.

Nesse contexto, para os devidos ajustes econômicos e cambiais que a moeda requer, Santos afirma que deve haver análise criteriosa dos custos e benefícios gerados. Cumprida essa etapa, mesmo sendo um projeto ambicioso e complexo, a moeda pode se concretizar, avalia o economista.

“Com a implementação das novas tecnologias digitais, desde que aceita pelos seus membros, a moeda torna-se possível, em um cenário de negociações e coordenação do grupo“, afirma Santos.

Por sua vez, Cunha acredita que a criação da moeda é improvável. “Talvez a ideia permaneça mais no campo da narrativa política, como um esforço para se desvincular dos Estados Unidos e da concentração de poder associada à emissão do dólar — uma moeda global e amplamente aceita”, afirma.

Dificuldades para a criação da moeda do BRICS

Cunha defende que não há, hoje, um possível substituto para o dólar, uma vez que a China, maior economia do BRICS, controla rigidamente sua moeda, que “não é livre nem transparente“.

Enquanto isso, o Brasil enfrenta desafios fiscais; a África do Sul não tem relevância econômica em escala global; e a Índia, mesmo em ascensão, ainda enfrenta barreiras que dificultam a integração nesse contexto.

“Além disso, os países que compõem os BRICS são extremamente diversos, com interesses econômicos distintos. Esse nível de diversidade torna a união necessária para implementar uma moeda comum ainda mais complexa“, destaca o CEO.

A volatilidade política é outro desafio, já que os governos desses países mudam frequentemente e podem simplesmente abandonar o projeto. “Implementar uma moeda comum exigiria um comprometimento de longo prazo e um investimento considerável de capital político e energia. Sem um uso prático e claro para essa moeda, sua criação seria pouco viável”, diz Cunha.

Ainda, as diferenças entre as infraestruturas financeiras dos países do bloco representam mais um empecilho. No Brasil, por exemplo, essa estrutura é amplamente desenvolvida, diferentemente de alguns outros membros do bloco.

“A moeda exigiria uma infraestrutura robusta, que inclui sistemas de pagamentos integrados e bancos centrais dispostos a serem mais flexíveis às novas tecnologias que precisariam ser integradas a sistemas de tokenização, moedas digitais, plataformas virtuais de ativos financeiros e outros sistemas de regulação e controle” explica Santos.