Na cidade das luzes onde todos os habitantes e visitantes se tornam fumantes passivos em razão da quantidade exorbitante de cigarros que são consumidos pelo público local, nem tudo é sobre fumaça.
Tive o privilégio de passar os últimos dias na capital francesa e aproveitar um pouco da gastronomia e cultura local, e claro, alguns dos melhores vinhos do mundo. Em meio a esta experiência, me questionei inúmeras vezes o que faltava em nosso país para que vinho fosse um item mais consumido e acessível.
Quando falo do consumo, quero dizer em geral. Desde o mega colecionador que possui uma adega milionária para centenas de garrafas até o consumidor despretensioso que gosta de beber uma tacinha depois do trabalho sem nem saber do que se trata.
Ambos são participantes importantes do mundo do vinho, mesmo que por motivos completamente diferentes.
Fiz um esforço razoável para visitar um pouco de tudo com o tempo que eu tinha disponível. Percebi que por aqui bares de vinho não são todos iguais – óbvio – mas é mais complexo que isso. Como o vinho faz parte da cultura francesa de maneira íntima, percebi que a diversidade de bares reflete justamente isso.
Veja o Divvino Paris Marais, por exemplo, que oferece uma variedade de vinhos em taça, cursos de degustação e eventos privados na lindíssima adega tombada do século XVI onde você pode fazer uma degustação harmonizada com queijos locais.
Não vi nenhum local por lá. A dona brasileira Marina, uma cavista reconhecida na França, (o que não é tarefa fácil) optou por uma estratégia de experiência e educação que, ao meu ver, está dando certo.
Outro bar como o Liquiderie funciona como uma lojinha e bar de vinhos naturais com uma carta de cerveja muito bacana. Nunca tinha ido e ao entrar fui extremamente bem recebido pela dona atrás do balcão.
Claramente é um ambiente feito para entrar, comprar e sair. Dito isso, as duas mesinhas do lado de fora e o balcão para quatro pessoas oferecem uma experiência intimista para quem quiser muito dividir uma garrafa rapidamente.
Nos 40 minutos que fiquei sentado vi mais de 10 pessoas entrando (todos locais) em busca de uma garrafa que me parecia a escolhida do jantar em família.
Paralelamente, fui parar no La Quincave para uma taça entre refeições. Este microbar não possui carta de vinhos e pouquíssimos produtores conhecidos. Os clientes entram batem um papo rápido com o Sommelier e puxam uma garrafa das estantes (literalmente). As taças são standards e a sensação é que pouco importa o que está sendo consumido.
Demérito? De forma alguma. Vinho é notoriamente complicado o que afasta muita gente do meio. Cartas de 200 páginas são excelentes para grandes entendedores que compreendem o que está escrito e se deliciam como um amante de literatura o faz ao ler um autor(a) que admira. Se quisermos trazer novos rostos para o vinho, precisamos de lugares que incentivam o consumo de vinho e não necessariamente de um um tipo de vinho.
Este não é o intuito deste bar. Vi muitas pessoas parando aqui depois do expediente com um amigo para beber uma tacinha. É simples como pedir um chopp para um garçom no botequim ao lado do trabalho
Outra experiência completamente diferente pode ser encontrada no Frenchie. Trata-se de um restaurante na Rue du Nil em Paris que recebeu a sua primeira estrela Michelin, 10 anos após a abertura. Mas e o vinho?
Para os entusiastas que não querem gastar muito dinheiro em comida, os proprietários abriram o Frenchie Bar à Vin literalmente na frente do seu irmão estrelado. A carta incrivelmente bem construída é complementada pelo menu reduzido com diversos pratos que podem (e devem) ser compartilhados com a mesa.
É um lugar agitado, divertido, cool e bastante inclusivo. É possível gastar 30 euros ou 3000 euros, dependendo do que é consumido no quesito vinho. Neste bar locais e turistas se misturam.
Qual é a conclusão?! Não encontrei nenhum bar que quer ser tudo. Inclusive, acredito fortemente na frase “quem quer fazer tudo acaba não fazendo nada direito.” Cada proprietário achou o seu nicho e hoje Paris conta com mais de uma (talvez várias) centenas de bar à vins de sucesso.
Temos muito chão (ou taças) pela frente mas sigo otimista quanto ao futuro do vinho no Brasil.