Mesmo que inelegível, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) exerceu o papel de principal liderança da direita e atuou em muitas frentes nas eleições municipais deste ano. No entanto, alguns fatores podem tê-lo tornado um dos maiores “derrotados” do pleito, deixando o seu espectro político com possibilidade de “novos donos”.
Apesar de o PL (Partido Liberal) ter tido um resultado bem significativo, conquistando 516 prefeituras, incluindo às capitais Aracaju, Cuiabá, Maceió e Rio Branco, Bolsonaro também acumulou algumas “derrotas” ao longo do processo.
“Bolsonaro é um dos perdedores dessa eleição. O que aparece hoje é uma direita mais inteligente, que participa com muita tranquilidade do jogo democrático, não tendo nada de golpista e nem de autoritária”, avalia o professor do Ibmec-RJ e cientista político, José Niemeyer em entrevista ao BP Money.
Em São Paulo, o ex-presidente apoiou timidamente o prefeito reeleito Ricardo Nunes (MDB), tendo inclusive indicado o candidato a vice sendo do seu partido. Porém, logo após sua vitória, Nunes exaltou a parceria com o Governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) o chamando de “líder maior”.
Com um palanque forte em São Paulo, Tarcísio parece sair da sombra de Bolsonaro ganhando força para ser o nome da direita em 2026. Mesmo tendo um eventual apoio do ex-presidente, o governador do estado mais poderoso do País passa a “caminhar com suas próprias pernas”, enfraquecendo o então líder direitista.
“A exaltação feita por Nunes ao Tarcisio de Freitas chamando-o de ‘líder maior’ mostra que o governador apostou na reeleição, investiu na campanha, ofereceu apoio explícito a Nunes e, com isso, agora colhe os frutos da vitória saindo fortalecido em sua imagem pública tanto como de liderança leal e confiável como, também, alguém que se cacifa como um possível candidato na disputa pela presidência da república”, destaca o cientista político Luiz Bueno.
Foi também em São Paulo que surgiu mais uma “dor de cabeça” para Bolsonaro: Pablo Marçal. O ex-coach “bateu na trave” de chegar ao segundo turno, mostrou força e, mesmo tendo sido criticado pelo ex-presidente, conquistou mais de 1,7 milhão de votos na capital paulista.
Neste domingo (27), quando esteve em Goiânia para apoiar seu candidato Fred Rodrigues (PL), Bolsonaro voltou a falar do ex-coach e negou qualquer tipo de racha na direita.
“Dizem que Pablo Marçal teria rachado a direita. Já caiu a máscara. Não tem racha. A direita, em grande parte, são pessoas conscientes, sabem o que está em jogo”, disse o ex-presidente.
Para Bueno, o campo bolsonarista sai rachado, significando portanto que, em algum grau, Bolsonaro saiu enfraquecido desta disputa municipal.
“Jair Bolsonaro não tem realmente as características de um líder, uma vez que não apoiou Nunes no primeiro turno, sendo praticamente ausente na campanha, além de ter demonstrado que podia apoiar Pablo Marçal, quando este mostrou sua força mediante o tamanho do eleitorado que este conquistou no campo da direita, que até então era considerado como liderado por Bolsonaro”, pontuou Bueno.
“Marçal pode até vir a ser considerado inelegível, assim como está Bolsonaro, mas o efeito de sua candidatura abre espaço para novos atores no campo da direita, seja da centro-direita, ou mesmo da direita mais radical”, completou.
Niemeyer vê Marçal como mais uma “dor de cabeça” para Bolsonaro resolver e, de acordo com ele, todos os problemas que surgiram no pleito podem gerar sério prejuízo ao ex-presidente.
“É mais um problema [ascenção de Marçal] para o ex-presidente, que já tem problemas na centro-direita, na direita e agora na extrema-direita com o Marçal. Todas essas questões que aconteceram durante essas eleições podem, sim, significar uma perda de poder político de Bolsonaro”, destacou Niemeyer.
Governadores em ascensão impõem derrotas a Bolsonaro
Além dos golpes sofridos na capital paulista, Bolsonaro também resolveu medir forças em outras capitais e viu governadores do seu espectro político saírem vitoriosos em suas “casas”.
O ex-presidente não conseguiu emplacar candidatos em sete das 15 capitais que elegeram prefeitos no segundo turno deste domingo. Os candidatos do PL em Palmas (TO), Manaus (AM), Goiânia (GO), João Pessoa (PB), Fortaleza (CE), Belo Horizonte (MG) e Belém (PA) foram derrotados.
As derrotas mais sentidas vieram de Goiânia, com o triunfo de Mabel (União) — candidato apoiado pelo governador de Goiás Ronaldo Caiado (União Brasil), e em Curitiba, com vitória de Eduardo Pimentel (PSD) apoiado pelo Governador Ratinho Jr. (PSD).
“Tenho a impressão que essa direita mais inteligente, uma direita mais racional, representada por nomes como Caiado, Ratinho Jr., Zema e Tarcísio está cada vez mais ganhando espaço, pois o que está acontecendo é que a centro-direita está conversando cada vez mais com o centro”, apontou Niemeyer.
Agora, só o futuro dirá como Bolsonaro chegará ao pleito de 2026. Além de enfrentar sua inelegibilidade, o ex-presidente terá que lidar com uma direita mais dividida e com novos nomes querendo comandar.
“Bolsonaro agora tem que liderar com uma direita mais dividida e com mais concorrentes, o que não ocorria até pouco tempo atrás. O que isso vai significar para a campanha à presidência, somente o tempo dirá, mas é possível imaginar um caminho bem mais difícil para o bolsonarismo”, salientou o professor Bueno.