De acordo com o último relatório divulgado pela Transparência Brasil, cerca de R$ 8,5 bilhões do orçamento de 2025 serão destinados a emendas de comissão “paralelas”, valor que está oficialmente sob controle do Poder Executivo, mas, na prática, vêm sendo direcionadas por parlamentares — em um movimento que especialistas consideram uma tentativa de burlar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).
Essas emendas, que deveriam ser geridas conforme critérios técnicos e transparentes, acabam sendo redirecionadas por meio de acordos entre o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto, levantando algumas dúvidas sobre a integridade e a rastreabilidade dos recursos públicos.
O que são as emendas de comissão “paralelas” no orçamento de 2025 e por que elas preocupam?
A expressão “emendas de comissão paralelas” refere-se a um novo mecanismo adotado, pela primeira vez desde 2020, para alocar recursos públicos. Embora ligadas ao Executivo, essas emendas são operadas diretamente por comissões da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
A manobra, segundo a Transparência Brasil, foi viabilizada por uma instrução normativa do senador Ângelo Coronel (PSD-BA), relator do Orçamento, que alterou as regras para apresentação e codificação dessas emendas.
O mais alarmante: essas emendas não são identificadas como RP 8, o código tradicional para esse tipo de gasto, e sim como RP 2 e RP 3, o que dificulta o seu rastreamento e as torna quase indistinguíveis dos demais gastos discricionários do governo federal.
R$ 7,1 bilhões sem destino definido
Um dos pontos mais críticos levantados no relatório é que R$ 7,1 bilhões dos R$ 8,5 bilhões estão alocados em ações genéricas.
Na prática, isso significa que o destino final do dinheiro só é conhecido após ofícios dos presidentes das comissões serem enviados aos ministérios, um processo que, segundo a entidade, é pouco transparente e desalinhado ao planejamento federal.
Essa opacidade permite, segundo o estudo, a distribuição de verbas conforme interesses políticos locais, comprometendo o bom uso dos recursos públicos e potencializando práticas clientelistas.
Os maiores beneficiários: órgãos com histórico de uso político
Entre os principais destinatários dessas emendas paralelas, estão órgãos já conhecidos por serem canais de repasses políticos:
- DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes): R$ 242 milhões
- Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba): R$ 218 milhões
- Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas): R$ 154 milhões
Essas instituições já foram protagonistas em reportagens sobre alocação política de verbas, o que acende ainda mais o alerta sobre o retorno de práticas consideradas inconstitucionais pelo STF.
Senado abocanha fatia maior do que deveria do orçamento de 2025
O relatório também expõe uma discrepância na divisão dos recursos. Isso porque, enquanto o Senado Federal, comandado por Davi Alcolumbre (União-AP), recebeu R$ 4,9 bilhões, o montante oficial de emendas de comissão da Casa é de apenas R$ 3,8 bilhões.
Ou seja, há R$ 1,1 bilhão a mais em relação ao previsto. A Câmara dos Deputados, presidida por Hugo Motta (Republicanos-PB), ficou com R$ 2,8 bilhões.
A entidade foi enfática ao afirmar que, sem uma medida clara do Executivo para diferenciar essas emendas dos demais gastos, estamos diante de uma reedição do orçamento secreto, declarado inconstitucional pelo STF em 2022.
“A simulação de conformidade entre os Poderes, enquanto criam exceções para burlar decisões judiciais, é um grave desrespeito à sociedade brasileira”, apontou o relatório.
Para a Transparência Brasil, o governo precisa criar um identificador exclusivo para essas emendas, garantindo transparência total e rastreabilidade.