No Brasil, a repercussão da vitória de Donald Trump nos EUA foi gigante: no mercado, a pressão sobre o dólar e as projeções de vantagens e desvantagens para os principais setores da economia pesaram enquanto, na política, houve uma injeção de ânimo na possibilidade de retorno de Jair Bolsonaro (PL).
O próprio ex-presidente, em entrevista à Folha de S. Paulo, disse que “o que acontece lá, acontece aqui”, em referência ao fato de que a vitória republicana nos EUA deve ser um motor para o triunfo da direita no Brasil. “Que a vitória de Trump inspire o Brasil a seguir o mesmo caminho”, disse Bolsonaro ao parabenizar Trump.
Apesar das declarações esperançosas, o caminho de volta de Jair Bolsonaro ao Palácio do Planalto tem um enorme empecilho: a inelegibilidade. O ex-presidente tornou-se inelegível por 8 anos em junho do ano passado após levantar dúvidas sobre a lisura do processo eleitoral e das urnas eletrônicas em reunião com embaixadores estrangeiros.
A expectativa do seu eleitorado é que isso seja revertido, principalmente agora diante da vitória de Trump. Antônio Celso Baeta Minhoto, mestre em direito político e econômico, explicou, porém, que não existe uma relação direta.
“A eleição de Trump não influencia de modo direto a questão da inelegibilidade de Bolsonaro, uma questão hoje judicializada, mas cria, digamos, um ânimo extra na direita brasileira que pode se movimentar com maior volúpia e assertividade em relação aos seus objetivos, sendo o principal deles a volta à presidência do país em 2026”, destacou Minhoto.
O cientista político Luiz Bueno pontuou ainda que, diferente de Trump, Bolsonaro sequer pode sair do país por estar com o passaporte retido.
“A sua intenção de participar da posse de Donald Trump pode nem se quer se materializar. Nesse sentido, portanto, os fatos não apoiam a afirmação de que ‘o que acontece nos EUA, acontece aqui’. O comportamento da Justiça brasileira em relação à Justiça norte-americana é um comportamento diferente, assim como do Congresso Nacional, que não apoiou iniciativas mais radicais de Bolsonaro”, avaliou Bueno.
Eleição de Trump, ao contrário, aumenta disputa para Bolsonaro
Já para o cientista político Jose Luiz Niemeyer, o retorno de Donald Trump à Casa Branca pode complicar a vida de Bolsonaro, uma vez que abre portas para que outros candidatos cheguem com força em 2026.
“A vitória de Trump faz com que apareçam novos candidatos com potencial para 2026 além de Bolsonaro, como Ronaldo Caiado, Ratinho Júnior, Tarcísio de Freitas, Eduardo Paes e Romeu Zema. São muitos formadores de opinião para a próxima eleição que não estão na mesma sala de estar que Bolsonaro”, disse Niemeyer.
Ainda de acordo com o cientista político, o ex-presidente, provavelmente, não conseguirá reverter a inelegibilidade. “Existem muitos interesses em Bolsonaro permanecer inelegível para não ser candidato em 2026. Tá todo mundo caminhando para o centro, acho que vai haver uma mudança em relação ao radicalismo de opiniões no Brasil”, avaliou Jose Luiz Niemeyer.
Onde o impacto é mais forte?
Luiz Bueno destacou que a intensidade do impacto de Trump de volta ao poder será determinada pela atenção que o governo dele dará a cada região – e o Brasil não está entre os principais focos.
“A gente pode imaginar que ele vai dar, primeiramente, importância às regiões que lhe dão maior visibilidade, que lhe dão maior resposta, inclusive junto ao seu próprio eleitorado interno norte-americano. Então, regiões como a Ucrânia, como o Israel, como as relações com o Oriente Médio, com a Europa, devem, muito provavelmente, ocupar a sua pauta de forma muito mais intensa do que as relações com o Brasil”, disse.
O cientista político chama atenção também para o apoio de Elon Musk à candidatura de Trump. Segundo ele, o bilionário, sim, pode atuar de forma mais intensa no Brasil. “Elon Musk tem interesses econômicos mais extensos aqui no Brasil. Teremos que acompanhar o quanto suporte um estado americano sob o comando de Trump vai oferecer a Musk para ele atuar em uma economia como a brasileira”, destacou.