Engenheiro de formação e filho de médico, o sócio-fundador e CEO da Esh Capital, Vladimir Timerman, não esteve desde sempre no mercado financeiro, mas vontade não lhe faltou. Em 2015, ele montou a gestora. Oito anos depois, com R$ 830 milhões sob gestão, Timerman conta que a estratégia da casa é mirar em “criar valor de governança” nas empresas através de special situations em equities.
O carro-chefe para colocar em prática a estratégia é o Esh Theta, um dos dois fundos da casa que tem sob gestão R$ 163 milhões. Para ele, no Brasil, há uma cultura de não confrontação por parte dos acionistas. Como exemplo, ele cita o caso da Americanas (AMER3), onde “os credores agiram de uma maneira super rápida, mas não teve nenhum acionista que entrou atuando na companhia”.
“Nesse caso da Americanas, ninguém chamou uma assembleia para destituir a administração. Os acionistas, no Brasil, têm uma postura complacente e isso faz com que empresas que tenham problema de governança, acabem ficando muito barata, porque ninguém quer ser sócio. Mas entendemos que se nós conseguirmos entrar em uma empresa dessas e impor governança, outras pessoas vão querer ser sócias e isso, por si só, vai fazer com que o equitiy se valorize. Então o Esh Theta é encontrar um caso desses, estudar muito bem, pegar o que a gente acredita que está acontecendo de errado e atuar”, explicou.
Além do Esh Theta, há o fundo Esh Prospera gerido pelo sócio Sérgio Goldman. “É um fundo de ações tradicional, mas que eu gosto de falar que é old school. O Sergio é um cara mais velho, com muitos anos de experiência. Hoje a gente tem muitos fundos de ações com pessoas novas, que não tiveram essa vivência e acabam caindo em umas armadilhas que o Sérgio consegue escapar”.
Como objetivo para 2023, Timerman conta que a meta é montar um fundo de special situations em crédito. “A gente está olhando outras coisas, sempre tem coisa nova acontecendo, estamos no Brasil. A gente faz essa parte de equities e entende que a evolução natural do que a gente faz é ir para crédito”, explicou.
Confira a entrevista da gestora Esh Capital ao BP Money
Em 2022, o Esh Theta teve retorno de 37,20%, bem acima do CDI, que foi 12,39%. O que vocês atribuem esse resultado?
Vladimir – O Esh Theta é um fundo de special situations. São posições muito concentradas. São casos/teses/temas, que a gente pega em empresas que a gente acredita que dê para criar valor de governança. Mas às vezes a gente não precisa nem atuar, as pessoas enxergam o que a gente está enxergando. A gente teve uma posição grande, que a gente entendia que tinha uma diferença grande de valor entre ações preferenciais e ordinárias de Oi (OIBR3;OIBR4), e a gente ganhou bastante dinheiro com isso. A gente montou uma posição e de repente as pessoas perceberam e o negócio valorizou 50% em dois dias e a gente acabou saindo. Então o Theta é esse bicho diferente. São duas ou três posições, onde tem um monte de advogado atuando e eu, que trabalho e acordo pensando nessas empresas.
Em 2022, a valorização das ações do Grupo Alliar (AALR3) tiveram grande participação na rentabilidade do fundo. Por que essa aposta no setor de laboratórios?
Vladimir – No Grupo Alliar, você tinha a mesma pessoa tentando tomar o controle e fazendo movimentos para tentar fugir de uma outra. Quando você tem essa percepção do mercado, as ações caem muito porque ninguém é compatível. Todo mundo falou ‘vou ser só sócio desse cara, não vai ter outro?’. Então, vamos montar uma posição e vamos obrigar a cumprir a lei. Ou você cumpre o que está na lei ou eu não vou deixar você se dar bem com isso. Daí me falaram que estão com a Oferta Pública de Aquisição (OPA), mas passou um ano e não saiu e a CVM já está incomodada com essa questão. Os outros acionistas viraram até mim, em agosto, e eu falei para indicarmos para o conselho final para não deixarmos acontecer nada de esquisito lá dentro. O pessoal falou que isso ia atrasar a OPA, mas eles não sabem o que estão falando. Mas vai sair a OPA, ontem, terça-feira (31) teve o julgamento do recurso que eles pediram para o colegiado da CVM pedindo mais 60 dias de prazo contando a partir do dia 4 de janeiro e o colegiado deu 40 dias.
As ações da Terra Santa Agro (TESA3) também tiveram contribuição positiva de mais de 28% para o resultado do Theta ao longo do ano. Por que investir nesse setor?
Vladimir – A gente tem uma posição muito grande em Terra Santa. Ela é uma empresa que tem terra que vale o dobro do que está na Bolsa, mas você tem um arrendamento feito pela SLC, onde a gente entende que tiveram alguns problemas de conflito quando foi acordado esse arrendamento e que você tem um yield muito baixo. Então as pessoas que fazem a conta do yield, o negócio não conversa com o valor da terra.
Os papéis da construtora Gafisa (GFAS3) subiram fortemente em dezembro puxados principalmente pela perspectiva de melhorias na companhia após maior visibilidade dos eventos societários. Essa foi uma das principais alavancas para o desempenho positivo do fundo no ano. Pode explicar?
Vladimir – O caso mais recente que está na boca do povo é a Gafisa. Na Gafisa, hoje eu tenho 15% da empresa e eu não vou parar enquanto não impor a governança que eu acredito ser a adequada. A gente já estava olhando a Gafisa antes desse controlador entrar. É uma empresa que teve um problema grande e a gente estava sempre tateando.
Quando você tem um controlador novo entrando, a gente tinha duas coisas que poderiam acontecer na nossa visão: ou ele ia resolver a empresa e ganhar dinheiro, porque já estava muito barato; ou ele ia fazer o que ele fez. E ele fazendo o que ele fez, a gente entendeu que poderia haver um desconto muito grande por questão de governança, é uma pessoa que já teve problemas, já foi condenado na CVM por abuso de poder de controle. Então lá a gente soube como atuar para tentar reverter a situação e foi isso que aconteceu.
A gente esperou chegar em um momento em que a gente acreditava que ninguém mais queria ser acionista da companhia e você tinha uma questão de uma debênture conversível, foi em 2021 que começou essa operação e a gente já fez a primeira denúncia na CVM em outubro daquele ano, aonde você tem veículos derrubando as ações em 50% para emitir uma debênture conversível, onde metade era conversível nesse valor.
A gente achava que era só esse problema, mas fomos nos aprofundando e percebemos que, na verdade, a contrapartida das emissoras dessas debêntures eram muitos terrenos com coisas que não param em pé, como pagar R$ 84 milhões à vista para receber R$ 84 milhões em 30 anos, em um terreno que tem contaminação no solo. Outro terreno que a gente acabou achando um processo que falava ‘derruba o que construiu, tira um entulho e recompõe a flora, nada pode ser construído lá’. Por óbvio, isso não é um bom negócio, você está pagando para ter um passivo?
Então a gente começa a fazer o dever de casa e a gente decide tentar impedir a conversão dessa debênture, a partir do momento que você faz isso, a gente entende que pode começar a ter a criação de valor. Então isso é uma discussão que ainda está acontecendo.
Os advogados do outro lado gostam de falar que eu faço coisa errado. Mas o que tem de errado em entrar de acionista em uma empresa e querer que as coisas aconteçam de uma maneira certa? Usar da lei para que a empresa seja ressarcida pelos prejuízos causados pelo controlador, pela administração. Então, a partir do momento que a gente entende que a empresa poderia ter salvação e estava muito barata, a gente monta uma posição para exercer poder de voto.
Como vocês estão visualizando a Americanas?
Vladimir – A gente foi chamado por diversos acionistas para atuar. Por um momento, eu fiquei muito tentando em dar uma consultoria. Não dei de fato, mas eu expus o que eu achava que estava acontecendo. A resposta que eu tive das pessoas foi ‘não é nossa pegada fazer esse ativismo, brigar’. Então nesse caso eu respondi que pelas ações, elas não valem nada. As pessoas estão loucas de estarem comprando essas ações agora. Eu não acho que esteja barato para entrar. Mas ficam tentando me puxar para essa disputa. É uma conta simples, o valor da companhia está em cerca de R$ 1 bilhão, mas você tem R$ 40 bilhões em dívidas, um monte de credor, se tiver alguma maneira de resolver isso, que eu acho que não tem, essa dívida vai virar equity. Então a pessoa tem uma ação hoje em um negócio que vale R$ 1 bilhão, vai se diluir em 40. Aqui eu não acho que tem como criar valor de governança. Eu fico pensando porque uma pessoa em sã consciência colocaria dinheiro em uma empresa que mesmo fraudando balanço, deu prejuízo por 20 anos, imagina se não tivesse fraudado o balanço, né?