Por Larissa Barreto, VP da Sail Capital
Assim como em muitos setores, no cenário financeiro global, as mulheres têm desempenhado um papel importante para a construção de um mercado cada vez mais inclusivo e diverso e, podemos ver esse movimento sendo feito todos os dias, com mulheres quebrando barreiras e moldando o futuro do setor.
No Brasil, esse contexto de preconceito dentro do mercado financeiro, que tradicionalmente é dominado por homens, não é diferente, mas, por aqui, temos uma sobrecarga que está atrelada a desafios únicos, que refletem a dinâmica cultural e econômica que temos no país. E é por isso que neste artigo, quero explorar a trajetória das mulheres no mercado financeiro brasileiro e destacar a influência delas, como agentes de transformação fundamentais para o amadurecimento do setor e para garantir possibilidades reais mudanças, principalmente, quando pensamos na flexibilidade do mercado para posições de liderança e nos desafios persistentes que, como mulher que está inserida dentro desse cenário, sei que enfrentamos.
Historicamente, a presença das mulheres no mercado financeiro brasileiro começou a ganhar força a partir das décadas de 1980 e 1990, um período marcado por importantes mudanças econômicas e sociais no país. Durante muito tempo, o setor financeiro foi dominado por homens, o que ainda acontece nos dias de hoje e as oportunidades para as mulheres eram limitadas a cargos de apoio ou administrativos.
Esse cenário começa a ser modificado com a expansão da economia e a maior participação feminina em cursos de finanças e economia. É nesse momento que as mulheres começam a ocupar posições mais estratégicas dentro do mercado financeiro, tendo mais espaço de fala, sendo fundamentais no desenvolvimento de novas abordagens de gestão financeira e trazendo uma perspectiva diversa e muitas vezes mais colaborativa para a mesa de decisões. No entanto, os números nos mostram que essa participação ainda é muito desafiadora.
Uma pesquisa realizada pela coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGVcef), Claudia Yoshinaga, mostra que apenas 11% das mulheres no Brasil estão certificadas pela Chartered Financial Analyst (CFA) para atuar no mercado financeiro e a situação é ainda mais desafiadora ainda quando se trata de cargos de liderança: a representação feminina como CEOs é de apenas 16% entre os 50 maiores bancos comerciais do mundo.
De acordo com um levantamento da FESA Group, as executivas representam 33,86% nos cargos de lideranças nas empresas de finanças e apesar dos avanços, as mulheres no mercado financeiro ainda enfrentam muitas barreiras que precisam ser ultrapassadas.
Estudos recentes também mostram que mesmo com escolaridade superior e maior carga horária de trabalho, as mulheres ainda recebem salários menores que seus colegas homens, mesmo desempenhando as mesmas funções. No setor financeiro, conseguimos ver essa desigualdade claramente na predominância feminina em funções administrativas e de apoio (10,7%) em comparação com os homens (5,4%), conforme dados divulgados pela FGV. Hoje, mesmo com o mercado financeiro brasileiro dando sinais de maior flexibilidade e abertura para a presença de mulheres em posições de liderança, ainda temos muito o que evoluir.
Investimentos: como elas se posicionam como investidoras?
O número de mulheres investidoras tem crescido no Brasil, mas ainda está aquém do número de homens. O estudo “Raio X do Investidor Brasileiro”, realizado pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) em parceria com o Datafolha, mostrou que a quantidade de mulheres com alguma aplicação financeira passou de 33% em 2022 para 35% em 2023 e embora a participação feminina no mercado de capitais venha aumentando desde 2021, quando representava apenas 28% das investidoras, ainda somos minoria.
Entendo que a desigualdade de gênero no mundo dos investimentos está muito atrelada ao que acontece fora dessa indústria, sendo um retrato de uma sociedade ainda muito machista, que vem caminhando lentamente para mudar essa realidade. Um exemplo disso são as condições de trabalho e as disparidades salariais entre mulheres e homens, que mudaram pouco nas últimas duas décadas. Para se ter uma ideia, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as mulheres ainda ganham metade do salário dos homens no mundo. Essa realidade, somada às responsabilidades familiares e ao trabalho de cuidado não remunerado, no meu ponto de vista, limitam a autonomia financeira das mulheres e seu acesso a espaços de poder.
Estamos testemunhando um novo momento no mercado financeiro, onde mulheres ocupam e administram espaços que antes eram majoritariamente masculinos e esse movimento, embora ainda modesto, é irreversível e inspirador.
As conquistas já são mensuráveis e são de muita luta, de mulheres que foram firmes em seus propósitos e trilharam o caminho até aqui, o cenário que temos hoje é fruto de embates históricos e do esforço contínuo por uma maior representatividade feminina no mercado financeiro. O que foi alcançado até aqui é valioso, no entanto, mudanças estruturais são necessárias para que a diversidade de gênero no setor financeiro seja significativa e os avanços sejam respeitados e valorizados no cenário econômico do país.
No Brasil, somos 104,5 milhões de mulheres, uma potência da qual a nação precisa para continuar crescendo e inovando. O caminho para a igualdade no mercado financeiro é longo, mas os passos dados pelas mulheres até aqui, nos inspira a continuar desafiando as normas estabelecidas e promover uma cultura de inclusão, também no setor financeiro, que pode sim, se tornar um modelo de diversidade e inovação a ser seguido também em outros mercados.
Estamos trabalhando para que o futuro do mercado financeiro seja moldado não apenas por dados e números, mas pela diversidade de perspectivas que nele se inserem, e estamos mais do que preparadas para liderar essa transformação.