Bolsonaro fala em desabastecimento por falta de fertilizantes

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente Jair Bolsonaro afirmou na quinta-feira (7) que o Brasil deve enfrentar “problemas de abastecimento” no ano que vem. O cenário, segundo ele, está relacionado à crise energética na China e seu impacto sobre a produção de um insumo básico para o agronegócio, o fertilizante.
“Eu vou avisar um ano antes, fertilizantes: por questão de crise energética, a China começa a produzir menos fertilizantes. Já aumentou de preço, vai aumentar mais e vai faltar. A cada cinco pratos de comida no mundo, um sai do Brasil. Vamos ter problemas de abastecimento ano que vem”, declarou Bolsonaro, durante cerimônia no Palácio do Planalto.
Por conta da projeção, o mandatário disse que a SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos) está concluindo a elaboração de um plano emergencial de fertilizantes.
O fertilizante pode ser orgânico ou químico e pode ter na sua composição, dependendo do tipo, mais de uma dezena de nutrientes. Os mais importantes são nitrogênio, fósforo e potássio. Cerca de 85% dos fertilizantes utilizados no Brasil são importados, e há grande participação de nitrogenados, que derivam de amônia e da transformação química do gás natural.
Desde junho, há rumores no mercado de que a China têm problemas para abastecer produtores locais e avalia restringir exportações. O país responde por 30% do comércio global do produto.
A situação vem sendo acompanhada de perto, ao longo deste ano, pela coluna Vaivém das Commodities, do jornal Folha de S.Paulo. Veja, abaixo, o que tem pressionado essa indústria.
ALTA DO DÓLAR
Há uma intensa relação entre os preços desses insumos e o dólar, que, nesta sexta (8), foi cotado a R$ 5,5, uma vez que a produção interna de fertilizantes está longe de atender a demanda do agronegócio brasileiro. A importação de alguns produtos supera a casa dos 90%.
Para complicar, no mercado internacional, vários fatores, como alta do petróleo, redução de oferta internacional de insumos e questões políticas entre países produtores de adubo, forçaram uma elevação dos preços desses produtos.
O resultado é a deterioração na relação de troca de produtos por fertilizantes nos últimos meses. O pecuarista precisa vender um animal jovem para obter uma tonelada de adubo, dependendo do tipo do insumo. Já os produtores de soja têm a pior relação de troca desde 2009.
Em julho deste ano, os principais fertilizantes utilizados pela pecuária e na produção de grãos haviam dobrado de preço em relação ao mesmo período de 2020.
Com base em dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), a Neo Agro havia apurado uma evolução de 104% nos preços do fosfato monoamônio, quando comparados os valores de julho deste ano com os do mesmo mês de 2020.
Ureia e cloreto de potássio tiveram aumentos próximos de 85%, enquanto o formulado 20-00-20 ficou 74% mais caro no período. Deflacionados pelo IGP-DI, os valores atuais dos fertilizantes estão nos maiores patamares desde 2009.
EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA
Após a acentuada retração da economia em 2020, a agricultura brasileira começou a ser demandada para atender os mercados em recuperação ao redor do mundo. Com isso, o ritmo das importações brasileiras de insumos agrícolas começou a subir, pressionando a demanda.
No início de setembro, as compras externas de agrotóxicos apontaram para 55 mil toneladas para o mês, enquanto a de fertilizantes pode ter superado 5 milhões, conforme dados semanais apurados pela Secex (Secretaria de Comércio Exterior).
DIMINUIÇÃO DA OFERTA
Em entrevista de agosto à coluna Vaivém das Commodities, da Folha de S.Paulo, Natália Fernandes, coordenadora do Núcleo de Inteligência de Mercado da CNA, afirmou que a alta expressiva no mercado internacional de fertilizantes ocorre devido à redução na oferta de alguns produtos. No caso da ureia, a China está produzindo menos, e a Índia, consumindo mais.
Fatores internos dos países podem influenciar. A Índia é uma grande fornecedora de insumos agrícolas, e até o meio deste ano estava seriamente afetada pela pandemia. Atualmente, o país está com mais de 450 mil mortes.
A crise energética na China também é sentida pelo agronegócio. “Essa produção pode ser prejudicada, levando a China a restringir a exportação desses produtos”, completa o coordenador do mestrado profissional em agronegócio da FGV, Felippe Serigati, em entrevista para a Folha de S.Paulo nesta semana.
“Impacta de duas formas: pelo aumento dos custos de produção e também pode pressionar a produtividade, uma vez que os produtores podem ter de aplicar uma quantidade inferior desses fertilizantes em suas lavouras”, completa.
Um estudo feito por economistas do Farmdoc, da Universidade de Illinois (EUA), mostra que os preços atuais dos adubos estão em patamares próximos aos do pico de 2008.
O DAP (fosfato diamônico) subiu 83% do fim de julho do ano passado ao mesmo período deste ano, em Illinois (EUA). No Brasil, o MAP (fosfato monoamônico) acumulou alta de 65% apenas no primeiro semestre deste ano.
O aumento dos preços deve afetar a inflação de alimentos.
“Fertilizantes e defensivos agrícolas vão subir demais e acabam afetando o agronegócio. Se tem choque de oferta de defensivos e fertilizantes, a inflação de alimentos vai piorar”, afirma. “E, se vende menos ao exterior, há efeito no câmbio [elevação do dólar]”, afirmou o professor de economia chinesa do Insper, Roberto Dumas Damas, também em entrevista à Folha de S.Paulo nesta semana.

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