BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo demonstrou preocupação com o impacto que a venda das redes móveis da Oi pode ter para a competição e concorrência do setor de telecomunicações e encaminhou o caso à Anatel (agência nacional de telecomunicações) para apurar a possibilidade de infração da ordem econômica.
As informações constam em resposta oficial enviada a questionamentos feitos pelo deputado Elias Vaz (PSB-GO) sobre a compra da rede móvel da Oi pelas operadoras Vivo, Tim e Claro por R$ 16,5 bilhões, em operação realizada em dezembro de 2020.
Em indicação parlamentar, o deputado sugeriu ao Ministério das Comunicações que instaurasse um procedimento administrativo junto à Anatel para apurar a possibilidade de infração contra a ordem econômica e prejuízo aos usuários eventualmente advindos da venda das redes móveis da Oi.
Ofício assinado pela secretária de Telecomunicações substituta da pasta, Nathália Almeida de Souza Lobo, afirma que a “preocupação do parlamentar coincide com a do governo federal, no sentido de promover um mercado de competição ampla, livre e justa, a concorrência e a livre iniciativa”.
A seguir, a secretária afirma que o ministério não tem competência legal para instaurar procedimento administrativo prévio para apurar a possível infração e que, por isso, o assunto foi encaminhado à Anatel “para a adoção das providências cabíveis previstas na legislação pertinente”.
Em nota informativa, o Departamento de Políticas para Telecomunicações e Acompanhamento Regulatório, da Secretaria de Telecomunicações, diz que “a preocupação do autor é a mesma do próprio Ministério das Comunicações ao formular suas políticas para o setor”.
“Ainda, ressalta-se que os atos de concentração econômica no setor de telecomunicações estão submetidos aos controles, procedimentos e condicionamentos previstos nas normas gerais de proteção à ordem econômica.”
A nota também diz que cabe à Anatel a regulação e a fiscalização do setor, “inclusive quanto ao controle, prevenção e repressão das infrações da ordem econômica”, enquanto o ministério fica responsável pela definição das políticas setoriais.
O deputado Elias Vaz diz que o setor já é monopolizado e que a operação de compra das redes móveis da Oi pelas três rivais “concentra o que já está concentrado”.
“Isso, na minha opinião, fere o interesse da sociedade, porque é um setor muito importante na vida das pessoas. Isso fere a questão de monopólio, da formação de cartéis. E a gente fez essa provocação formal ao governo, porque o governo estava omisso diante dessa situação”, afirma.
“O governo acabou acatando a nossa solicitação e fez um requerimento à Anatel. Na minha opinião, a Anatel tem que se posicionar para a sociedade, não permitindo que haja essa concentração. A nossa expectativa é que outra empresa que quiser participar do mercado brasileiro possa se interessar, porque a concorrência faz bem aos usuários do sistema de telefonia do país.”
A Anatel afirmou à reportagem que para garantir a oferta de serviços em padrões compatíveis com as exigências do usuário podem ser adotadas medidas necessárias ao estímulo à competitividade no setor.
“Caso se identifique impactos negativos para os consumidores ou para a competição no mercado de telecomunicações, a Anatel pode impor restrições, limites ou condicionamentos às empresas ou aos grupos de empresas prestadoras de serviços de telecomunicações, sejam eles limites ou encargos, observando sempre as condições impostas pela legislação, bem como a sua adequação ao estrito interesse público”, disse.
De acordo com o órgão regulador, em relação ao caso específico da venda de ativos da Oi, a análise da operação está em fase de reunião de informações e fundamentos, período que apura os reflexos da operação e sua adequação à legislação. A fase antecede a tomada de decisão da agência sobre o caso.
A Anatel ressaltou que, no requerimento das operadoras à autarquia, serão analisados aspectos como limitações legais à concentração econômica e o grau de competição.
“A transferência de controle somente será aprovada se não prejudicar a competição e não colocar em risco a prestação do serviço”, disse.
Procuradas pela reportagem, Claro, Tim e Vivo afirmaram que a proposta apresentada para a compra dos ativos móveis da Oi preserva os aspectos concorrenciais no segmento de telefonia celular.
“A divisão de ativos será feita de forma a fortalecer a rivalidade entre as companhias e respeitar integralmente os limites de detenção de espectro fixados pelo regulador”, afirmaram em nota conjunta.
Em comunicado, a Oi afirmou que o processo de venda das redes móveis tem “ocorrido com total transparência, tendo sido aberto um processo competitivo para a participação de qualquer interessado antes da realização do leilão judicial, respeitando todas as etapas prévias concursais e de recursos cabíveis, com a conclusão do processo competitivo tendo sido já plenamente homologada pelo Juízo da Recuperação Judicial”.
“A companhia ainda reitera que não houve nenhum tipo de contestação na ocasião e que não recebeu proposta de nenhum outro interessado durante o leilão”, indica. A empresa afirma ainda que está empenhada para “cumprir os ritos previstos no aditamento do seu processo de recuperação judicial” e que tem prestado as informações necessárias “para a correta avaliação do mérito da aprovação da transação”.
Em nota, o Ministério das Comunicações disse que não monitora o ambiente de concorrência no mercado de telecomunicações, tarefa que cabe à Anatel e ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).
O ministério afirmou, porém, que aguarda o resultado de análise feita pelos dois órgãos ?em caso de necessidade de atuação desta pasta?.
Após a publicação da reportagem, o ministério, procurado na sexta-feira (27), apresentou novo posicionamento. Informou que a nota técnica assinada pela secretária substituta se restringiu a afirmar que o assunto é da esfera de decisão da Anatel e do Cade, “não tendo havido qualquer análise ou manifestação quanto à existência de infração”. Segundo o órgão, também não houve chancela ao pedido do deputado.
A venda das redes móveis da Oi ocorreu em um leilão sem concorrência, como parte de um esforço de reposicionamento da empresa para tentar sair de processo de recuperação judicial iniciado em 2016 para lidar com uma dívida de R$ 65 bilhões. A Highline, que chegou a negociar os ativos, desistiu do negócio e não apareceu no leilão.
A conclusão da operação depende ainda de aprovação do Cade, que vai analisar como os clientes serão divididos entre as três companhias para evitar concentração excessiva de mercado.
No final de julho, o conselho considerou a operação “complexa” e indicou que são necessárias investigações adicionais para avaliar a probabilidade de exercício de poder de mercado por parte das compradoras após a operação.