Na Stoxos, aposta são em small caps que "dobrem" de valor

Olhar para small caps com potencial de pelo menos dobrar os resultados é o foco do fundo criado por Heloisa Cruz. Confira a entrevista exclusiva dada ao BP Money

O que era para ser só um investimento próprio, se tornou um fundo com mais de 2,5 mil cotistas. A engenheira Heloisa Cruz, criou em 2014 um clube de investimentos para gerir suas finanças, mas ao conhecer pessoas interessadas no mercado financeiro, transformou seu projeto pessoal em seu trabalho. Atualmente, o Stoxos FIA é um fundo incubado na distribuidora de títulos e valores mobiliários Órama Investimentos. Seu foco é apostar em um perfil ‘do contra’, visando small caps que possuem potencial de dobrarem resultados.

“Algumas pessoas falaram ‘abre [seu fundo], sua estratégia tem pouca gente fazendo’, que é small caps mais contrary, que é tipo ‘do contra’. Eu faço tudo ao contrário do que a maioria das pessoas está fazendo”, brincou a gestora Heloisa.

Ao focar na bolsa brasileira, a engenheira conta que trabalha com posições compradas e vendidas em um perfil chamado 130/30, ou seja, 130% comprado e 30% vendido. Para sua estratégia, a base do fundo é o valuation, “que é o quão barato você consegue comprar em relação ao preço de tela, ou em relação ao que a empresa vale (o preço de tela comparado com o que a empresa vale)”, explicou.

“O meu objetivo é tentar comprar ações baratas de empresas que vão surpreender no resultado. Basicamente é isso o que eu faço e quanto maior a diferença entre o que vale e o que está sendo negociado, melhor. Porque, entre tantas coisas, eu busco [empresas] que possam pelo menos dobrar na minha mão. Se não tiver chance de subir de subir 100%… Hoje eu tenho ações que poderiam quintuplicar”, comentou.

Confira a entrevista exclusiva do fundo Stoxos ao BP Money

O fundo surgiu em 2021. Você pode contar um pouquinho da história dele, o que te levou a criar esse fundo?

Heloisa Cruz – A história do fundo é de janeiro de 2021, mas a história da cota é bem mais longa, ela é de fevereiro de 2014. Quando eu tive meu primeiro filho, eu decidi abandonar a carreira, pegar meu dinheiro e colocar em um clube de investimento. Por isso que a cota já tem um número alto, perto de 10. Nesse tempo, o capital multiplicou por 10.

E [o fundo] veio para isso, eu queria, por um lado, ter um veículo que fosse fiscalmente mais eficiente. Ao mesmo tempo, eu teria uma cota caso um dia eu resolvesse voltar para o mercado financeiro e, eventualmente, fosse procurar um emprego, poderia mostrar o que eu fiz nesse período. Com o tempo, eu acabei desistindo de voltar [para o mercado]. O fundo (na época o clube) começou a performar muito bem e eu falei ‘ok, vou ficar fazendo só isso’. Em paralelo, eu comecei a me envolver com as pessoas nas redes sociais para trocar ideias. Às vezes, você amadurece com ideias de outras pessoas, você leva informações, as pessoas trazem informações de volta e, com isso, eu acabei conhecendo muita gente. 

As pessoas pediram para eu dar cursos e depois pediram para eu abrir o meu clube e transformar ele em um fundo. Mas eu não queria, porque eu tenho uma vida bem confortável. Eu tenho minha flexibilidade, meu horário nobre de trabalho é depois que as crianças dormem, depois das 20h, e aí eu falei que não queria, porque a única forma que eu aceitaria fazer, seria em uma estrutura de outra pessoa, não queria ter a minha própria asset, ter um monte de sócio e etc. Eu sempre gostei muito da parte de análise e pensei que não fazia sentido eu abrir um fundo grande, uma asset. Se fosse para ser seria eu, meio sozinha, fazendo de casa. Nesse momento, eu falei [para meu público] ‘isso vocês não vão querer’, e as pessoas falavam ‘a gente quer’, e eles realmente quiseram. Hoje eu tenho 2,5 mil cotistas.

Você comentou que o fundo foi aberto, de fato, em janeiro de 2021. Era um momento ainda delicado da economia por conta da pandemia. Por que escolheu esse período?

Heloisa – Eu decidi [abrir] depois da queda na pandemia, porque o meu fundo tem um perfil de investimento de ações mais desconhecidas. Já é a terceira queda de 40% nesse período de 9 anos. E quando as pessoas viram o fundo caindo mais de 50% e, ainda assim, elas quiseram continuar investindo, eu pensei que talvez realmente fizesse sentido, que eles realmente estavam dispostos a tomar esse risco. Eu sempre falo para o meu cotista que é a parcela de maior risco do capital deles, mas as pessoas falaram ‘é agora que a gente quer investir, abre logo’. Daí teve o tempo para abrir. Em maio e 2020, começaram as conversas, mas eu levei um tempo para amadurecer.

É um fundo de ações em que você tem esse perfil de ser ‘do contra’, ou seja, apostar em empresas menos hypadas pelo mercado. Você pode aprofundar com mais detalhes sobre a estratégia?

Heloisa – Hoje, a gente está em um momento super raro da bolsa onde as ações estão muito descontadas. Mas, em geral, dobrar já é de bom tamanho. O que acontece é que, tipicamente, essas empresas estão onde tem menos gente olhando. Se tem menos gente olhando, têm menos liquidez. Tem menos liquidez, onde tem menos ações disponíveis. Tem menos ações disponíveis, quando a empresa é menor. Ou seja, tipicamente eu invisto no que eles chamam de small caps. É normal que a maior parte da minha carteira esteja alocado neste tipo de ações. Isso para as ações compradas.

Já as ações vendidas, é ao contrário. Eu tento estar em ações que estão tão caras que não justifica. Então o resultado que ela precisaria entregar para valer tudo que ela está sendo negociada é muito difícil de entregar. Daí são ações que são bem cobertas e os analistas, em média, querem estar comprados nesse papéis, porque eles acham que faz muito sentido, porque a empresa é muito boa. Mas vem uma decepção e a empresa acaba caindo.

Quando você olha, por exemplo, uma ação que está precificada a coisas maravilhosas, você vai ver que várias delas de 2021 para cá, caíram muito. Uma delas que eu posso citar (e eu peguei só uma parte do short) foi Natura (NTCO3). Não dava para entender, Natura estava negociando a 70 vezes o lucro e existia uma expectativa de que eles iam absorver Avon e virar uma operação dela. Mas eu, pessoalmente, não gosto de grandes fusões. Ou seja, eu tinha uma ação extremamente cara, vindo de uma fusão grande de um ativo difícil que era Avon. Eu estou citando um exemplo que eu nem peguei o short inteiro, mas tem tido vários exemplos na bolsa, porque algumas ações viram queridinhas e aí o mercado exagera em quanto elas valem.

Qual é o cenário que você visualiza para o Brasil e quais setores você mais investe por aqui?

Heloisa – A gente entra em 2023 com um ano bem confuso. Você tem o presidente dando sinais claros de que ele não se importa com o mercado, e também uma discussão fiscal muito feia. E a gente sabe que o risco fiscal é um risco muito relevante para o Brasil, porque o custo de capital do dinheiro brasileiro (os juros) acaba sendo muito alto. Na bolsa, você sempre tem que olhar a competição com os juros. Isso acaba que a expectativa não é muito boa para a bolsa. E esse juros alto se mantendo, com uma previsão de desaceleração da economia, as revisões do que era até novembro de PIB, de inflação, só pioram e toda essa discussão acaba sendo muito ruim para a bolsa como um todo.

O que eu tenho para mim é que acho que vai ter uma deterioração de confiança, e toda vez que tem isso, inflação, queda de PIB, quem sofre são as pessoas mais pobres, porque eles não têm como proteger o capital. Eles estão, inclusive, entre os primeiros empregos cortados. Então a gente tem um cenário [difícil] para essa população e todas as outras consequências. A gente está tendo alguns pedidos de falência, tanto instituições financeiras, quanto de varejo, e há uma expectativa que só piore.

Sendo assim, eu acabei buscando dentro da minha carteira, estar zero exposta a consumo. Eu estou fugindo de varejo, estou fugindo de bancos, estou fugindo de qualquer coisa que seja bem supérfluo, em geral. Vários serviços B2C, que servem o consumo direto, também estou evitando. E o que eu fiz? Eu aumentei bastante a exposição da carteira a agro e também tenho bastante exposição a empresas cuja a tese é aumento de penetração.

Eu vou dar dois exemplos em que a tese é muito parecida, onde eu não dependo do crescimento do PIB para que as minhas empresas cresçam. Uma delas é a Simpar (SIMH3). Ela é basicamente uma empresa que aluga caminhões, presta serviço de logística e aluga carros também. Com o PIB caindo e as empresas tendo que investir mais em capital, faz mais sentido alugar um caminhão do que comprar.

Até porque essa empresa do grupo Simpar, que chama Vamos (VAMO3), já é um competidor tão grande que ela consegue comprar em um preço que o cliente dela não conseguiria. Acaba fazendo muito mais sentido alugar via Vamos do que você mesmo comprar. Essa empresa está crescendo 50% ano contra ano. É uma que não depende de como vai ser o PIB. Outra coisa que, às vezes, as pessoas têm dificuldade de entender nesse caso, é que hoje ela está fechando contratos considerando os juros de longo prazo de 13%, então a rentabilidade desse contrato que ela fecha hoje é muito boa, por isso ela continua crescendo mesmo nesse patamar de juros.

Dentro da Simpar, você tem ainda a JSL (JSLG3), que é uma empresa que presta serviço logístico para o cliente. O que acontece é que ela oferece, por exemplo, toda logística interna, distribuição urbana, ela distribui para Ambev bebida. Essa empresa consegue ter uma eficiência e oferecer um serviço mais barato do que a própria empresa faria. E aí é a mesma coisa, essa empresa compete com o motorista que tem uma frota de 10, 15 caminhões, mas como os juros subiram, ele está super apertado. São empresas que tendem a continuar crescendo mesmo com um cenário pior do país. Essa é uma tese da Simpar.

Uma outra tese que eu tenho uma posição bem relevante também é a Ambinar (AMBP3). Ela é uma empresa que, entre outras coisas, faz economia circular. Ela pega, por exemplo, resto de plástico da indústria, leva para reciclagem, transforma em plástico para revender. Para você ter uma ideia da importância dela, hoje ela é a única autorizada no Brasil a vender plástico com a marca Dow Química, que é uma empresa considerada de referência e de qualidade super alta. Ela está fazendo um projeto de reciclagem de vidro verde para a Heineken. Isso, antigamente, cada indústria tinha que contratar uma porção de empresas para fazer isso. Ela faz também o transporte de materiais pesados, materiais perigosos. Estamos vendo, por exemplo, nos Estados Unidos os descarrilamentos de trem com material perigoso, ela faz esse tipo de transporte. E ela também tem um outro negócio de resposta a emergência, como incêndio, vazamento, tombamento de caminhão com material químico. Em outros países ela tem serviço de ambulância também, ela faz descontaminação do solo. É uma empresa que faz serviços e não são core ninguém, para nenhuma indústria, mas as pessoas precisam. Até porque essa coisa de economia circular é mandatória. Você tem o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, já era para ser mandatório, mas ninguém conseguiu atingir as metas ainda.

Então eu acabo colocando empresas como essas. Eu também tenho bastante empresa de agro, tenho um pouquinho de algumas commodities que não dependem tanto da economia chinesa, algumas coisinhas que estão ligadas a crédito de carbono. Mas a ideia é não estar exposto a quem depende de confiança do empresário, confiança do consumidor para crescer. 

Ano passado, vocês apresentaram uma rentabilidade negativa de – 21.18%. O benchmark de vocês é o Ibovespa, que foi de 4.69%. Eu queria entender o que você atribui a esse resultado.

Heloisa – No ano passado foi isso mesmo, a bolsa subiu [cerca de] 5%, eu caí [cerca de] 21%. No ano anterior, se você pegar o histórico só do fundo, ele subiu 15%, a bolsa caiu 12%. Se você pegar o histórico com o clube, ele subiu 28%. Se você juntar essas duas performances eu tô um pouco melhor do que a bolsa desde o começo do fundo. Mas, obviamente, a performance não está onde eu gostaria de estar: melhor que a bolsa, mas não melhor do que o CDI – e ninguém investe na bolsa para ganhar menos do que a renda fixa.

A curto prazo esse tipo de coisa acontece. A médio e longo prazo, o que acontece também é que a gente está num cenário em que traz muita incerteza. A gente tem um cenário de incertezas jurídica, onde tivemos uma decisão agora no STF que anula decisões anteriores. Fica bem complicado o investimento no Brasil. Isso quer dizer que muita gente olha e fala que não vale o risco de investir em bolsa e muito estrangeiro olha e fala que não vai investir, porque não sabe o que vai acontecer.

Quando você olha o Brasil, renda fixa pagando [cerca de] 14% ao ano, realmente não faz sentido. Mas eu digo que faz. Quando você olha as empresas hoje, você vê que tem muita coisa que está extremamente barata e muita empresa que se você comprar hoje, a rentabilidade vai ser acima de 20% ao ano pelo tempo que você carregar, cinco, seis, sete anos.

Para 2023, quais são suas expectativas?

Heloisa – A minha visão para PIB, é um cenário muito ruim. Eu realmente acho que está muito ruim, que o PIB cai. Antes eu achava que ele ia ser meio zerado, mas pelas coisas é PIB negativo. E por isso que eu acabei buscando uma carteira que, apesar de não parecer, ela é bem defensiva. Ela tem contratos longos. Você tem que olhar para os resultados das empresas que estão operando e eles não estão piorando. Não os das minhas (um outro sim, mas em grande maioria não). As minhas empresas vão sofrer com essa discussão do Banco Central? Não. Os juros altos atrapalham, óbvio, porque elas têm mais dívida, mas apesar dos juros mais altos, elas continuam a crescer. No final das contas, quando você olha o cenário durante o governo Dilma, há várias empresas que cresceram e o que elas tinham em comum? Um mercado mais resiliente e que não tinha expectativa de queda de receita com a queda do PIB.

É um pouco isso, eu dependo do que os outros entendem das minhas empresas. Como um todo, as minhas principais posições soltaram resultados inclusive surpreendentes. Tem uma que eu não falei, mas tenho uma posição importante que é 3tentos (TTEN3). No dia que saiu o resultado do balanço dela, ela subiu 17%. Há várias coisas acontecendo e eu tenho buscado empresas que acabam não dependendo tanto do crescimento do PIB e da expectativa do consumidor ou do empresário para reagirem bem, para terem uma evolução boa de receita.

Só que eu tenho um tempo entre o que o que eu vejo e o que o mercado vê. O mercado precisa concordar comigo. No curto prazo, isso não vai acontecer. Por isso que eu sempre falo, quando você estiver olhando um investimento ao longo do tempo, você vai conseguir ver, de fato, se aquela estratégia funcionou ou não. Como um todo, foi um ano ruim, mas esse ano eu comecei um pouco melhor. Mas eu dependo da bolsa concordar comigo, e a gente não sabe quanto tempo vai acontecer. Só que tem um detalhe no investimento em bolsa que é, se a ação não sobe, os dividendos vem. No patamar atual de preços de ação, quase todas as empresas estão pagando dividendos muito bons. 

Eu não tenho uma expectativa boa para a bolsa em 2023, mas eu tenho uma expectativa boa para a carteira. Eu não acho que a taxa de juros vai cair suficientemente para justificar uma alta na bolsa como um todo, então a minha resposta é que eu não tenho um cenário positivo como um todo (o cenário macro não ajuda), mas olhando o micro de várias empresas, você tem oportunidades muito boas na bolsa.