'William Capita' leva frieza dos gramados aos investimentos

Reconhecido por sua liderança nos tempos de zagueiro, William Machado deixou os gramados em 2010 para montar estratégias de investimentos para clientes

Assim como no futebol, no campo do mercado financeiro as estratégias são fundamentais para o sucesso. O ex-zagueiro do Corinthians, William Machado, prova isso diariamente, como assessor de investimentos e sócio da Messem, escritório credenciado à XP Investimentos. O segredo de Machado no mercado financeiro é ter “frieza e calma” para se sair bem nos momentos de maior pressão. 

“No esporte, muitas pessoas falavam que eu era calmo, que era frio e eu mantinha a serenidade em momentos de pressão. Quando você está preparado – sabendo que você escolheu a carreira de jogador – o que você mais deseja é estar em uma final, com o estádio lotado, em um momento de pressão”, disse Machado. 

“Quem não deseja isso, tem que mudar de sonho, e no mercado financeiro é a mesma coisa”, completou o ex-zagueiro. 

Como jogador, William conquistou títulos importantes, como a Copa do Brasil de 2009, o Campeonato Paulista no mesmo ano, os Gaúchos de 2006 e 2007, além do Campeonato Mineiro em 2005 e a Série B pelo Corinthians em 2008. Como assessor de investimentos, o objetivo do ex-zagueiro é ajudar pessoas, principalmente do meio esportivo, a gerir o patrimônio.

Apesar de ter atuado em uma posição que tem como princípio evitar que o risco chegue à sua área, Machado é mais arrojado nos investimentos (mesmo assim, visa sempre o longo prazo). 

Além da frieza, o ex-zagueiro destaca que aplica a mesma disciplina que tinha nos gramados em seus investimentos. 

“Tem que ter uma disciplina muito grande para ser atleta profissional e também para atuar no mercado financeiro. Além disso, a dedicação”, disse Machado.

Entre marcar um grande atacante em campo e investir em tempos de crise, o ex-jogador não hesitou em dizer que os investimentos em momentos de incertezas são mais “tensos”. 

“O Adriano, Imperador, foi o jogador mais difícil que marquei [risos], mas é mais difícil investir em tempos de crise. Marcar o Adriano você tem mais ajuda ali, tem seus companheiros. Mas em tempos de crise, apesar de termos toda uma estrutura, o mercado tem muito mais variáveis que impactam uma decisão, e gera sempre uma tensão na hora de falar sobre investimentos”, disse Machado, que se interessou pelo mercado ainda jogador, aos 18 anos, quando cursou contabilidade de mercado de capitais na faculdade. 

Confira, na íntegra, a entrevista do BP Money com William Machado, ex-jogador, gerente de futebol e comentarista – atualmente assessor de investimentos:

Como surgiu seu interesse pelo mercado financeiro, William? 

Eu me deparei pela primeira vez com o mercado financeiro estudando contabilidade de mercado de capitais na faculdade, com 19 para 20 anos, enquanto eu jogava futebol. Foi a primeira vez que tive esse contato. Achei muito interessante, mas muito superficial. Depois, quando fui jogar no Corinthians, morando em São Paulo, coração financeiro do País, eu acabei conhecendo muita gente que trabalhava no mercado, além de bancários. 

E tinha necessidade também de fazer uma gestão melhor do meu patrimônio, então acabei estudando mais e me informando mais, pela facilidade que eu tinha em SP. Isso aí foi um ponto que me despertou pela necessidade de fazer a gestão e depois pela possibilidade de estar atuando neste mercado no pós-carreira. 

Ainda no meu último ano como atleta, já montei uma empresa, comecei a de fato trabalhar no mercado financeiro, mas algumas das minhas ideias e ideais eu não consegui implementar em três anos, vi que era muito difícil, e acabei me afastando e dando oportunidades para essas outras atividades que foram surgindo, como ser dirigente esportivo e também a questão de ser comentarista. Foram atividades que eu desempenhei, gostei bastante, aprendi muito também, mas a minha paixão de fato era poder ajudar as pessoas com aquilo que eu vinha aprendendo e que eu queria passar adiante. 

Como você voltou ao mercado após trabalhar como comentarista e gerente de futebol?

Em 2018, eu recebi uma proposta para voltar ao mercado financeiro e aí já fiquei muito alinhado com a ideia que eu tinha lá atrás de educação financeira. Com a XP já mais consolidada no mercado, eu entendi que tinha tudo a ver com o que eu vinha fazendo, então através da Messem eu acabei aceitando o convite e me tornei sócio da Messem. 

Hoje sou sócio e assessor de investimentos, então tenho uma carteira de clientes e ajudo esses meus clientes na parte de assessoria financeira e investimentos.

Recentemente, entrevistamos o Arnaldo Cezar Coelho, que também trabalhou no mercado financeiro. Ele disse que tinha facilidade em angariar clientes, por ter muitos contatos no meio futebolístico. Isso acontece com você? 

Boa parte dos meus clientes são atletas, ex-atletas, agentes de jogadores, pessoas do meio mesmo, até pela facilidade, como disse o Arnaldo, que eu conheço e tenho uma boa relação. Eu não foquei nessa classe, visto que me apareceu outras oportunidades de ter outros profissionais como clientes… advogados, médicos, empresários de outras atividades, como do agronegócio, então acabei não ‘nichando’, porque eu vi que o que eu faço para atletas e pessoas do meio esportivo eu poderia fazer para pessoas de outros meios, mercados e setores. 

Sobre investimentos, qual é a sua filosofia tanto pessoal quanto para clientes. É mais arrojado e mais conservador? 

Eu sou mais moderado/arrojado, digamos assim, até pelo conhecimento que eu tenho, visão de longo prazo, então isso me dá mais tranquilidade. Não que eu não fique incomodado quando o mercado cai, mas quando a gente tem esse conhecimento, você tem um entendimento maior de que isso com certeza acontecerá em alguns momentos da sua vida como investidor. 

Já para os meus clientes, eu não sei se é meu perfil profissional ou se é coincidência, mas  95% dos meus clientes tem o perfil conservador, e eu até prefiro que seja assim, porque ainda que a educação financeira esteja difundida no Brasil, o conhecimento ainda é distante. A maioria não tem esse conhecimento que traria essa tranquilidade de, de repente, aceitar tomada de risco. Quem me procura, geralmente, tem esse perfil, tirando algumas poucas exceções. 

Tem alguma coisa da carreira de atleta que você usa como base na carreira de assessor de investimentos? 

Algumas coisas. A disciplina é uma delas. Tem que ter uma disciplina muito grande para ser atleta profissional e também para atuar no mercado financeiro. Além disso, a dedicação. 

Para ser atleta profissional, para chegar até uma Copa, por exemplo, é uma conquista diária e com vários fatores e desafios e tipos de pressão, como estamos vendo agora com jogadores, comissão técnica, após a copa, então não é uma vida fácil, é uma vida muito diferente e a maioria nem chega onde eles chegaram. 

Então essa dedicação de segunda a segunda também passa pelo mercado financeiro, pelo menos assim eu enxergo, ainda que o mercado não abra de segunda a segunda. 

Dependendo da necessidade do cliente, você precisa atendê-lo aos finais de semana, em horários não comerciais, às vezes tem fuso horário, com clientes que estão lá fora, que te obriga a acordar às 5h da manhã ou falar com o cliente às 22h. 

No futebol, você tem que aperfeiçoar fundamentos, como chutar com a perna não dominante, bater falta, pênalti, e no mercado financeiro é a mesma coisa. 

Fazendo um paralelo com o esporte. Qual foi o atacante mais difícil que você já marcou na carreira? É mais difícil marcar ele ou investir em tempos de crise? 

O Adriano, Imperador, foi o jogador mais difícil que marquei [risos], mas é mais difícil investir em tempos de crise. Marcar o Adriano você tem mais ajuda ali, tem seus companheiros. Mas em tempos de crise, apesar de temos toda uma estrutura, o mercado tem muito mais variáveis que impactam uma decisão, e gera sempre uma tensão na hora de falar sobre investimentos.

A gente vive um momento de incertezas econômicas, globalmente. O Brasil, além do cenário macro desafiador, teve a troca do governo. Como você enxerga esse momento?

Eu vejo que temos que ter muita calma, serenidade. Vamos presenciar uma mudança de governo que, independentemente de quem ganhou ou perdeu, temos que olhar com uma expectativa, cobrando sempre. Tem uma coisa que a eleição deixou de positiva é que as pessoas parecem estar mais politizadas. Quando eu era mais novo, não se falava tanto de política, hoje vejo muito mais gente falando de política e muitas pessoas jovens. Isso é um ponto positivo. 

Agora é cobrar os nossos líderes. Vigiar mais. Acompanhar mais o que eles fazem no Congresso e torcer para que o Brasil caminhe para frente.

Temos uma Selic mais alta, então o momento é de ser ainda mais conservador, mas acredito que o Brasil vai passar por essa.

Qual é o seu setor preferido na bolsa? 

Eu gosto muito do setor elétrico. A gente tem uma dependência cada vez maior da eletricidade, então vejo que é um setor muito resiliente mesmo em tempos de crise e isso me faz ter mais tranquilidade em relação a esse setor. 

Teve influência da família na escolha da faculdade de contabilidade ou foi uma escolha sua? 

No meu caso, não venho de família rica. Meu pai fez a sétima série e minha mãe quinta série. Eles viram a dificuldade que tiveram na vida, por não terem estudado, e por motivos nobres, porque os dois pararam para ajudar meus avós trabalhando, então não foi porque não quiseram, foi porque não puderam. 

Eles cobraram de mim e da minha irmã para que a gente estudasse, ainda que em escola pública, mas a gente se dedicou por conta deles, pelo entendimento deles que isso era, de fato, o que nos faria poder melhorar de vida, ascender socialmente e financeiramente. 

Por isso, desde cedo, coloquei isso na minha cabeça. Mesmo jogando futebol, eu busquei fazer uma faculdade, consegui uma bolsa de estudos, porque não teria condições de passar em uma Federal, por causa do meu nível escolar, e aí sim conciliei com o futebol. Foi difícil, os dois últimos anos eu já fiz a noite para poder treinar de manhã e de tarde, mas se a pessoa tem força de vontade, ela consegue conciliar, ainda mais agora que tem o ensino a distância. 

As faculdades hoje possibilitam esse ensino e, por mais que carreira de atleta seja exigente, tem muito tempo ocioso. O que falta, de fato, é sensibilizar os atletas da importância que é, ainda que seja em 4/5/8 anos para se formar, mas concluir, buscar informação, acima de tudo. 

Grandes atletas quando param de jogar acabam tendo problemas sérios financeiros, porque não têm o mínimo conhecimento, acabam delegando para quem também não tem, geralmente familiares, e muito cedo acabam perdendo a fortuna devido a essa má gestão. 

Você tem algum projeto mais voltado para atletas no ramo de educação financeira? 

Lancei, em 2021, um curso de investimentos para atletas, o CFIA, em parceria com a FK Partners, especializada em certificados financeiros. Na verdade, a ideia não é virar um influencer ou coisa do tipo, mas eu vejo o que eu posso fazer para tentar ajudar a introduzir o tema para esses atletas, tanto jovens quanto familiares deles, é alguma coisa voltada para o mundo moderno, que são esses cursos que você faz ‘on demand’. 

São mais ou menos sete horas de curso e a pessoa consegue ter uma bela visão do mercado financeiro, dos produtos financeiros, sobre o sistema financeiro brasileiro. 

Isso, pra mim, é como se fosse um legado que estou compartilhando. Obviamente, tem que ter o interesse do lado de lá, mas é o que imagino como primeiro passo, já que não consigo falar para todos e estar em todos os lugares palestrando e tentando sensibilizar essas famílias, que têm a possibilidade de ter um bom patrimônio e acabam perdendo, muitas vezes.