Na Equitas, foco está nas empresas com menos hype

Na contramão de empresas favoritas do Ibovespa, Luis Felipe Amaral, gestor e co-fundador, diz que o foco da casa é em empresas não tão visualizadas pelo mercado

Já experiente no mercado, a Equitas nasceu em 2006 e tem como foco o mercado brasileiro. Contudo, na contramão de empresas favoritas do Ibovespa, o principal índice de referência da bolsa do País, a Equitas prefere apostar em empresas não tão visualizadas pelo mercado. O objetivo com isso é poder descobrir empresas com grande potencial de valorização, a partir de uma estratégia de checagem micro das companhias.

Segundo o gestor e co-fundador da Equitas, Luis Felipe Amaral, setores de varejo, consumo e serviços, que não aparecem tanto no Ibovespa, estão entre as alocações da casa. Um dos motivos é que eles não são tão afetados por fatores estrangeiros. Já as commodities, que possuem um grande peso no índice, o efeito é o inverso.

“O Ibovespa tem bastante participação de empresas que são exportadoras de commodities, como por exemplo a Petrobras (PETR4), a Vale (VALE3). Essas empresas têm uma exposição muito grande à flutuação do preço das commodities que elas vendem. Elas não têm influência sobre esses preços, eles são formados no mercado internacional e isso acaba trazendo uma flutuação muito grande de receita para as empresas, o que representa um risco. Então a gente acha que é muito difícil conseguirmos ter uma previsibilidade e um acúmulo de valor ao longo do tempo”, explicou.

Por conta disso, a gestora procura focar em empresas que conseguem ver esse “efeito composto”, onde as companhias crescem com um sinal de preço mais estável e podem ter uma influência maior sobre a receita delas próprias. “Nosso trabalho aqui é de fazer checagem de informações. A gente está o tempo inteiro buscando conhecer o setor, a empresa, quem são os concorrentes, quem são os fornecedores. E com isso a gente consegue ter um diferencial de análise muito mais forte nessas empresas da economia local, do que das empresas que são exportadoras de commodities”, disse.

Com R$ 1,2 bilhão sobre gestão, a casa lançou recentemente, no meio de 2022, um novo fundo onde a proposta é que, a longo prazo, o investidor tenha seu dinheiro multiplicado em até quatro vezes. Além do fundo novo (High Convictions), a casa também trabalha com outros quatro, sendo eles: Equitas Selection; Equitas Selection Institucional; Equitas Previdência e Equitas Selection Mão Amiga. Este último, segundo Amaral, é um fundo idêntico ao Selection, mas que reverte a taxa de administração e performance para um projeto social de educação.

Confira a entrevista exclusiva do BP Money com a gestora Equitas

O Equitas Selection foi lançado em 2010, como você comentou. Esse é o fundo mais antigo da casa. Você pode explicar um pouco mais sobre o fundo, sobre a estratégia e quais são as principais alocações?

Luis Felipe Amaral – É um fundo de ações, voltado à renda variável, onde a gente tem uma estratégia que é a de montar um portfólio de participação em empresas para longo prazo. A gente toma decisões de investimento no horizonte de três a cinco anos, a partir de uma análise fundamentalista. Então, o que a gente tenta fazer é entender os negócios que estão por trás dessas empresas, entender as dinâmicas dos setores onde elas atuam, a concorrência. Entender quais são os diferenciais competitivos das empresas, e a perspectiva que cada uma delas tem de crescer ao longo desse nosso horizonte de investimentos, que gera lucros. É isso que norteia o nosso processo de investimento.

O Selection é um fundo diferente, ele não tem nenhum apego ao Ibovespa. A gente não tem que tentar replicar o Ibovespa ou ter ações similares ao Ibovespa. A gente pode escolher ações completamente diferentes e, historicamente, ele tem essa característica. Ele é formado por empresas onde muitas delas não estão no índice Ibovespa, com bastante ênfase em setores da economia local, como consumo, varejo e serviços, que são menos representados no Ibovespa, do que commodities, por exemplo.

O Selection também tem flexibilidade para, eventualmente, ter posições em derivativos. Se a gente quiser reduzir um pouco o risco do fundo, ou aumentar um pouco exposição, ele tem essa flexibilidade de poder fazer investimentos em ações fora do Brasil. A gente usa isso muito pouco, mas ele tem essa flexibilidade. Essa é a única estratégia que a gente tem. A gente tem alguns outros, que é o Selection Institucional e o Fundo de Previdência, que são basicamente o mesmo portfólio, só que o Institucional não tem esse grau de liberdade de fazer investimentos em ações fora do Brasil e nem tem esse grau de liberdade para fazer essas estratégias com derivativos, mas a carteira é basicamente a mesma. Dá para ver até para ver pela performance histórica, que ela é muito parecida dos dois fundos.

Então o Selection tem esse diferencial de poder estar alocado no estrangeiro. Quais países vocês podem investir?

Luis – Ele pode investir em qualquer lugar fora, mas a gente não faz isso. Ao longo desses últimos 13 anos, a gente fez pouquíssimas posições fora do Brasil. Fizemos em América Latina, uma outra posição, mas ele é 99% do tempo alocado em empresas brasileiras.

Vocês têm algum case brasileiro, já que vocês focam em economia local, de uma alocação que vocês gostam aí na casa?

Luis – Tem uma que eu, inclusive, acabei de voltar da visita da empresa. É uma empresa chamada 3tentos (TTEN3). Ela fez a IPO (oferta pública inicial) em 2021, é pouco conhecida no mercado, mas ela é uma empresa que presta serviço no setor agro e o agro é muito forte aqui no Brasil. Ele é quase imune às várias crises que a gente teve ao longo do tempo. E essa empresa faz um trabalho de fornecer uma solução completa para o médio produtor rural. O serviço é tanto de venda de insumos, sementes, tudo que o produtor precisa para fazer a produção dele, a plantação. Mas ela vai além, ela oferece também o serviço de crédito, de recompra dos grãos que são produzidos pelo produtor, de armazenagem e beneficiamento desses grãos através de produção de farelo, óleo de soja e biodiesel.

É um serviço completo que dá para ela a capacidade de ter primeiro uma conexão muito forte com os clientes dela e uma capacidade de monetizar essa relação. Isso resulta em um crescimento constante ao longo dos anos, acima de 25% ao ano, com uma rentabilidade muito alta. É uma empresa que tem um retorno sobre o capital investido que historicamente foi acima de 30% ao ano. E é uma ação pouco conhecida, negociada a múltiplos muito baixas. Quando a gente olha essa combinação, nos parece uma daquelas oportunidades de investimento raras, da gente ver uma empresa de altíssima qualidade, muito bem gerida, com capacidade de crescimento, alto diferencial competitivo e uma ação muito barata, muito descontada. Esse é um caso que a gente está hoje muito animado aqui.

Você falou sobre vocês estarem totalmente descorrelacionados com Ibovespa em todos os fundos, mas vocês usam ele como benchmark. Eu vi na carta anual de vocês do ano passado que nos últimos três anos, vocês apresentaram uma rentabilidade negativa perante o Ibovespa nos fundos. Você pode comentar o porquê desse resultado?

Luis – Os resultados dos últimos anos foram bem ruins. Mas óbvio que a gente sempre tem um processo de investimento que está buscando melhorar, aprimorar o tempo todo. Então você até pode ter questões que foram erros pontuais nossos, mas tem um ambiente muito desafiador que aconteceu nos últimos três anos, em função da fase pós-pandemia, onde a gente teve, primeiro, um impacto na economia local e depois um aumento de juros muito forte e uma depreciação do câmbio.

Isso foi meio generalizado para a indústria de fundos. O Ibovespa, aquela parte de commodities que a gente não gosta tanto de investir, foi muito boa, porque as empresas se beneficiaram de um momento de preço de commodities em alta e do câmbio desvalorizado. Assim, elas, que são exportadoras, têm receitas em dólar. Isso representa quase 40% do índice Ibovespa. Como a gente tem pouco desse tipo de empresa, a gente não se beneficiou. Daí teve um descompasso muito grande na performance de ações de commodities. Em 2021 e 2022 também, as ações de commodities subiram quase 20% – 30%. Já as empresas da economia local caíram quase 20% – 30% em média. Isso acabou tornando o ambiente bem desafiador nesses últimos dois anos.

Você, reconhecendo que essa parte de commodities tem um grande peso no Ibovespa e elas se saíram bem nos últimos anos em comparação com empresas locais, vocês pretendem para 2023 seguir com essa estratégia ou alterar algo?

Luis – Em termos da maneira como a gente compõe portfólio, a gente não está alterando em função disso. Um erro muito grande é você tomar decisão para frente olhando no retrovisor. Isso é o que aconteceu nos últimos dois, três anos. Eu estou no mercado há mais de 25 anos, já vi várias fases. E isso acontece, as coisas mudam, e é importante ter disciplina e saber o que você está fazendo.

Nosso norte aqui é fazer o que a gente sabe, que é analisar empresas da economia local, e a gente tem pouca dúvida que no longo prazo isso funciona. Quando a gente olha nosso histórico mais longo, a gente bate o Ibovespa em larga margem. Teve um período bem ruim nos últimos três anos, mas não acho que faça sentido mudar o que a gente faz em função dessa do que aconteceu que foi bem atípico.

Mas vocês têm alguma coisa diferente para 2023 que vocês estão planejando?

Luis – Nosso fundo não tem como característica fazer grandes mudanças bruscas de portfólio o tempo todo. Ele vai sendo realocado aos poucos, conforme a gente acompanha a evolução das empresas, as coisas ficam mais ou menos atraente, aí aumenta e diminui as participações. Esse movimento de ajuste levou a um aumento de participação, por exemplo, em 3tentos e Orizon (ORVR3), que é uma outra empresa que também fez IPO no começo de 2021. 

Então não é que eu tenha uma estratégia diferente para 2023, eu olho o portfólio hoje e enxergo ele diversificado em termos de exposição setorial. Tem uma parte importante no agro, tem uma parte importante em Orizon, que é um setor de tratamento de resíduos sólidos, que tem um lado de economia circular, com geração de biocombustíveis a partir disso e é bem desconectado dos nossos ciclos econômicos. A gente tem exposição também em saúde, através do Mater Dei (MATD3). Tem exposição em mídia através de Eletromidia (ELMD3).

O Selection Institucional, pelo o que eu entendi, se assemelha bastante ao portfólio do Selection. A única diferença é que vocês não usam essa estratégia de poder ficar alocado em outro país. Você quer apontar mais alguma coisa de diferente? 

Luis – Para entender exatamente a diferença do portfólio de um e de outro, a gente tem no Selection duas posições que não tem no Institucional que é em Mercado Livre (MELI34), uma Brazilian Depositary Receipt (BDR), e em Vtex (VTEX). O Mercado Livre não é uma empresa brasileira, mas tem 50% dos negócios aqui no Brasil. Já Vtex é uma empresa brasileira, mas as duas são listadas nos EUA. Então essas duas posições não estão no Institucional, o resto todo do portfólio é o mesmo. Inclusive, esses nomes que eu falei antes de 3tentos, Orizon, estão nos dois portfólio da mesma maneira.

Sobre o fundo mais recente da casa, o High Convictions, que está completando seis meses, o que levou vocês a criarem esse fundo? Como que ele funciona?

Luis – Esse é um fundo mais concentrado ainda. Normalmente nos fundos Selection, a gente trabalha com cerca de 15 a 25 posições, para ter um grau de diversificação um pouco maior. Nesse outro, o High Convictions, é um fundo para ter entre cinco e sete participações, ou até menos. Ele também tem um horizonte de investimentos, o resgate dele, não é de 30 dias como os outros fundos, é de seis meses.

O que nos levou a lançar esse fundo, que é a primeira estratégia nova que a gente lança em mais de 10 anos, é porque a gente estava enxergando um momento de oportunidade raro. A combinação de preços de ação muito deprimidos, e um grupo ali de empresas de alta qualidade, com crescimento para frente muito forte, é uma combinação rara. É uma situação que a gente não está buscando retornos típicos de investimento em ação, do tipo 15%, 20% ao ano, a gente está vendo oportunidade, em alguns desses casos, de ter multiplicação de capital da ordem de três, quatro vezes o dinheiro, no horizonte de três, quatro anos. Então a gente decidiu oferecer para o investidor a possibilidade de capturar essa oportunidade, porque, geralmente, esse tipo de retorno você só consegue visualizar em fundos de private equity, que são aqueles fundos fechados, que o investidor tem que ficar com o dinheiro parado entre 7 a 10 anos, onde o gestor vai buscar investir em empresas que não são empresas listadas, ele investem empresas de capital fechado, espera o crescimento delas e, em algum momento, ele consegue vender essa participação ou fazer o IPO da empresa para ele poder sair.

A gente está enxergando o mesmo tipo de retorno, só que com empresas listadas, empresas onde a gente consegue vender as ações, têm informação pública, tem uma situação de risco muito mais controlada do que no ambiente private equity. Isso nos levou a fazer esse fundo novo. Então ele é composto só por empresas listadas na bolsa brasileira, mas tem várias delas que foram listadas nesta janela de IPO que aconteceu de 2019 a 2021. Onde teve várias empresas que vieram ao mercado e logo depois a janela fechou abruptamente no meio de 2021 com a subida de taxa de juros, onde teve uma onda de resgates de fundo de renda variável, com investidor pessoa física, principalmente, saindo de bolsa e voltando para renda fixa, e isso acabou promovendo uma queda muito forte de alguns desses papéis, gerando oportunidade de investimento, de fazer o movimento contrário, de comprar ações muito baratas, a preço muito atraente para empresas de alta qualidade.

Como foram esses primeiros seis meses do fundo novo no sentido de rentabilidade?

Luis – Foi um período bastante volátil. É uma carteira muito mais concentrada mesmo, então vai ser mais volátil. Também foi marcado pelo período de eleições, onde primeiro teve uma grande subida ali no no começo do segundo semestre, depois uma queda muito forte depois da eleição, do mercado como um todo, e uma pequena recuperação agora. Ele está acumulando um retorno bem expressivo, por volta de 25% nesses seis meses. Então apesar do ambiente muito tumultuado, o que a gente vê é que, eu diria, a barra está muito baixa. O valuation, a precificação das ações, está muito deprimida, então mesmo com o ambiente tumultuado, essas ações que a gente escolheu estão se saindo bem.

Como estratégia de proteção de risco, você tinha citado no primeiro fundo justamente poder ter essa opção de investir em bolsas de outros países. Vocês têm mais alguma estratégia? Também em um cenário que você falou, onde vocês apostam bastante em varejo, a gente está vendo o que aconteceu com a Americanas (AMER3), que está puxando um monte de empresas. O que vocês usam para se proteger?

Luis – Não é o tempo todo, né? Porque esses instrumentos de proteção, eles custam. É que nem você comprar um seguro, você paga por ele. E, às vezes, o preço do seguro está alto. Então de tempos em tempos, quando vemos oportunidade de comprar algum seguro barato, a gente compra, através de opções de venda de ações específicas ou de índice. Hoje a gente não tem nada de proteção, o fundo está com essas posições todas livres, mas ele tem essa flexibilidade, de em tempos a gente poder fazer.

Como vocês focam bastante na economia local, como você está visualizando a nova presidência, as falas do Lula sobre a taxa de juros?

Luis – Primeiro com tristeza pela falta de entendimento. É surpreendente ver pessoas, que são representantes do povo e teoricamente experientes, terem uma falta de compreensão tão básica em relação a como funcionam os mecanismos de mercado, como funciona a própria economia. As pessoas investem, compram, quando elas têm segurança. A insegurança, a incerteza é a maior inimiga, tanto da decisão de compra, como da decisão de investimento. Então acho que falta essa compreensão. O presidente não para de colocar, desde que ele se elegeu, elementos que trazem certeza em relação ao rumo da política econômica. Isso tem um custo, já está tendo um custo muito grande. O Banco Central já tinha feito um trabalho de elevar os juros para um patamar bastante alto antes da eleição. E isso tem um efeito de trazer a inflação de volta para a meta, é um trabalho que estava sendo feito, mas agora com essa incerteza toda que está sendo colocada diariamente, de forma constante pelo novo governo, torna essa essa tarefa muito mais difícil.

O que se imaginava que ia acontecer, de começar a cair a taxa de juros já no primeiro semestre desse ano, agora é um cenário bem improvável, porque todo esse falatório desnecessário trouxe uma pressão sobre os preços dos ativos, inclusive do câmbio, que ao invés de ajudar, ele está atrapalhando. A gente vê, por exemplo, o dólar que está se desvalorizando contra todas as moedas do mundo, com o real não, o real que está se desvalorizando. Nós estamos vendo o dólar a R$ 5,30, se não fosse o falatório, provavelmente, a gente já estava quase R$ 4,60, o que ajudaria bastante na queda da inflação. É triste ver essa falta de compreensão.

Esse falatório pode ter um custo muito grande para atividade econômica e é um tiro no pé de quem quer ver a economia crescer e quem quer, em tese, beneficiar as camadas mais necessitadas da população, que é quem mais sofre com inflação. Se tivesse essa compreensão, acho que o pessoal falaria menos, deixaria cada um fazer o seu trabalho. O BC tem uma atuação técnica e não parece razoável essa crítica ferrenha em cima do trabalho que está sendo feito lá.